Assinaturas na Câmara e no Senado já são suficientes para criar comissão que investigará ligações políticas de Cachoeira
Desde sexta-feira, o Palácio do Planalto negocia com os líderes dos partidos aliados os nomes que vão compor a CPI mista destinada a apurar as relações criminosas do bicheiro Carlinhos Cachoeira com políticos e empresas. O maior receio é não ter "soldados" para defendê-lo durante os trabalhos da comissão e, com isso, tornar-se refém de exigências da base aliada. "Estamos com dificuldades para escalar nossa tropa de choque", admite um interlocutor do governo. Na avaliação de aliados, o Planalto demorou demais para perceber a gravidade da CPI. Na noite de ontem, o documento para abertura da comissão tinha o apoio de 340 deputados e 54 senadores - bem acima do mínimo necessário, que é de 171 adesões na Câmara e 27 no Senado.
Planalto procura os "soldados" da CPI
Com o pedido de abertura da investigação dos negócios de Carlinhos Cachoeira apresentado ontem no Congresso, governo busca nomes de confiança para atuar na comissão
Paulo de Tarso Lyra, Karla Correia, Erich Decat e Gabriel Mascarenhas
O Palácio do Planalto está preocupado com as dificuldades em escolher os "soldados" que defenderão o governo durante a CPI mista que investigará os negócios do bicheiro Carlinhos Cachoeira com agentes públicos e privados. Sem ter avançado na nomeação dos cargos e com as emendas parlamentares liberadas em um ritmo ainda aquém do esperado, o governo sabe que pode se tornar refém das exigências da base aliada. "Estamos com dificuldades para escalar nossa tropa de choque", reconheceu ao Correio um interlocutor do governo.
O pedido de CPI foi protocolado ontem na secretaria-geral da Mesa do Senado, com o apoio de 340 deputados e 54 senadores. No Senado, esse número poderá chegar a 67, com a inclusão do bloco comandado pelo PTB. O documento foi recebido pela secretária-geral da Mesa, Cláudia Lira. Como o presidente do Congresso, José Sarney (PMDB-AP), está de licença médica por 15 dias, caberá à vice-presidente do Congresso, Rose de Freitas (PMDB-ES), a missão de ler o requerimento de instalação da CPI em plenário, o que deve ocorrer até amanhã.
Desde a última sexta-feira, a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, assumiu a tarefa de chamar os líderes dos partidos aliados, principalmente PT e PMDB, para negociar quais nomes serão escolhidos. Ideli foi repreendida pela presidente Dilma Rousseff, que reclamou ter tido poucas informações sobre o avanço das negociações no Congresso para a instalação da CPI, especialmente durante o período em que esteve nos Estados Unidos. "É natural que Ideli estivesse mais preocupada em se defender das acusações de comprar lanchas para financiar sua campanha. Mas ela terá que voltar a trabalhar direito agora", alfinetou um interlocutor da presidente.
Ideli entendeu o recado e ontem, às 8h30, estava na liderança do governo no Congresso reunida com os aliados para definir uma pauta mínima de votações na Casa. Entre elas, estão a Lei Geral da Copa, a cobrança de ICMS no comércio eletrônico e a isenção fiscal concedida por estados portuários. "O governo vai continuar trabalhando mesmo com CPI. Estamos focados para que as matérias mais importantes sejam votadas", disse a ministra.
O receio do governo é concreto. Na última grande CPI que abalou o Executivo — dos Correios, em 2005 —, o Planalto tinha uma tropa de choque fiel. Além da própria Ideli, contava com a proteção do atual ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e de nomes como Jorge Bittar (atual secretário de Habitação da Prefeitura do Rio) e de soldados obedientes como Sibá Machado. "Com quem contaremos? Os petistas do Senado são estrelas isoladas e o PMDB está doido para dar o troco no Planalto", reconheceu um aliado da presidente, numa alusão à iniciativa dos senadores petistas em criar a CPI e aos peemedebistas que lavaram as mãos para ela.
Sugestões
A crise está, por exemplo, na escolha de quem será o relator da CPI. Os nomes mais cotados são os deputados Odair Cunha (MG), Paulo Teixeira (SP) e Cândido Vaccarezza (SP). O líder, Jilmar Tatto (SP), no entanto, despista. "Tenho recebido várias sugestões, mas no momento adequado nós apresentaremos os nomes. Temos 85 nomes prontos para trabalhar para pôr a limpo essa grande maracutaia que teve como centro o Carlinhos Cachoeira. Doa a quem doer", ressaltou Jilmar Tatto, que coletou 78 assinaturas em sua bancada. Pelo Twitter, o deputado Romário (PSB-RJ) alerta sobre os riscos da investigação: "Essa CPI do Cachoeira vai dar m... Acabou tomando uma proporção que nem o governo esperava".
O Planalto já emitiu sinais de que não simpatiza com Vaccarezza, por ele ter proposto, durante a tramitação da emenda para buscar novas fontes de financiamento para a saúde, a legalização dos bingos. O ex-líder do governo nega qualquer envolvimento com empresários do setor e disse que, caso seja convidado por Tatto, aceitará a missão.
A partir de hoje, o requerimento de instalação da CPI será devolvido para cada uma das Casas para que as assinaturas sejam checadas. Líderes da oposição, entretanto, não veem motivo para que a checagem passe desta semana. "Como posso especular prazos, se eles, a princípio, iriam entregar o documento na quinta e o fizeram hoje?", irritou-se o líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA). Ao longo do dia de ontem, chegou a ser firmado um acordo para que as assinaturas só fossem entregues na quinta-feira de manhã.
O líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA), concorda com seu colega baiano. "A experiência das outras CPIs mostra que isso pode ser feito em questão de horas, não precisa nem um dia inteiro", ressaltou. "Do ponto de vista formal não há por que não formalizar essa comissão até quinta-feira", emendou o líder do PSDB na Câmara, Bruno Araújo. Os dois partidos reuniram o apoio de 77 deputados.
"Amigo pessoal"
Entre os deputados tucanos que colocaram o nome na lista está Carlos Alberto Leréia (GO), citado nas investigações da Polícia Federal. "Como meu nome está citado em várias reportagens, sou amigo pessoal do senhor Carlos Cachoeira, gostaria de comunicar a esta Casa que eu assinei a CPI para que possamos apurar esses fatos aqui no Congresso", ressaltou. Outro que também é mencionado nas investigações e que apoiou a CPI foi o líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO). "Fui lá assinar porque se não poderia parecer estranho, né?", disse.
A avaliação de governistas experientes é de que o Planalto demorou demais a perceber a gravidade da situação. "Dilma deve ter recebido sinais externos — possivelmente emitidos pelo ex-presidente Lula — de que a CPI não atrapalharia o governo. Quando acordou, era tarde demais", disse um petista experiente. Segundo ele, o Planalto acordou quando as denúncias engolfaram o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, e o subchefe de Assuntos Federativos, Olavo Noleto.
"Essa CPI do Cachoeira vai dar m... Acabou tomando uma proporção que nem o governo esperava"
Romário (PSB-RJ), deputado, pelo Twitter
ASSINATURAS
340 deputados. Total de parlamentares que assinaram a favor da CPI do Cachoeira na Câmara
54senadores. Quantidade de congressistas que referendaram no Senado a abertura da investigação
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE
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