O sistema financeiro brasileiro é sólido, mas muitos fatos têm acontecido e a conjuntura não é tão favorável quanto antes. Ao todo, R$ 9 bilhões foram usados pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC) para cobrir rombos e fraudes em cinco bancos: PanAmericano, Morada, Schahin, Matone e Cruzeiro do Sul. A conta do Cruzeiro do Sul está em aberto porque o banco tem R$ 1,5 bi de dinheiro de fundos de pensão e pode não ter como honrar.
Foram acontecimentos demais. O Morada foi liquidado com um buraco de R$ 100 milhões. O PanAmericano recebeu R$ 4,3 bilhões de empréstimos para cobrir as fraudes. O rombo no Cruzeiro do Sul está até agora em R$ 1,3 bilhão. O banco Schahin foi absorvido pelo BMG, mas com a ajuda de um empréstimo de R$ 1,5 bilhão do FGC. O Banco Original, do grupo JBS, absorveu o Matone com um crédito de R$ 1,8 bi.
Pouco antes da quebra, a Caixa havia investido quase R$ 800 milhões na compra de 49% do capital votante do PanAmericano. Agora ela está capitalizando o banco. Portanto, o custo real de todos esses abalos não se sabe ainda. Mas é maior do que os R$ 9 bilhões acima. Os empréstimos são todos facilitados, o que significa que se pagará apenas uma parte pequena do que foi emprestado aos compradores.
É preciso atenção redobrada porque muita coisa mudou recentemente na economia: o crescimento minguou, os juros caíram, a inadimplência subiu, as famílias se endividaram, as empresas reduziram investimentos, o real se desvalorizou, e os episódios citados acima estão dificultando o acesso dos bancos médios ao interbancário.
Os bancos estão sendo afetados de diversas maneiras pela virada na economia brasileira e a piora da crise na Europa. As ações do setor financeiro têm o terceiro pior resultado da bolsa, no ano, com queda de 3,2%. Mas, de março pra cá a queda é maior. O Banco do Brasil perdeu 34% do seu valor em bolsa nesse período; o Itaú, 21%; e o Bradesco, 8,6%, só para ficar entre os maiores bancos. A queda reflete a expectativa dos investidores de rentabilidade e lucro menores pela frente.
Incapaz de executar investimentos federais previstos no Orçamento, o governo estimula o crescimento via consumo. Ontem, incentivou os estados a investir, via endividamento de R$ 20 bilhões. No caso do consumo, depois de mais de três anos de expansão forte do crédito, que acelerou a partir de 2009, a tendência dos bancos privados é ser mais rigoroso na concessão e garantir liquidez.
O crédito como proporção do PIB saltou de 40,5% para 49,6% de janeiro de 2009 a abril de 2012. O saldo de recursos emprestados cresceu a uma velocidade que oscilou de 15% a 21% de 2010 para cá. O crédito direcionado chegou a crescer 30% num período de 12 meses.
O estoque de crédito inadimplente subiu 35% nos 12 meses até abril. A provisão que os bancos têm que fazer para o crédito podre, que está inadimplente há mais de 180 dias, disparou 24% no período. O comprometimento mensal da renda das famílias chegou a 22%, isso sem contar financiamentos feitos via crediários em lojas, que não são contabilizados pelo Banco Central. A inadimplência das pessoas físicas chegou a 7,6% em abril. Ontem, a Serasa Experien mostrou mais uma elevação.
O analista da Austin Rating Luis Miguel Santacreu, que acompanha atentamente o que acontece com os bancos, é enfático em dizer que não há problemas no sistema financeiro brasileiro, mas admite que a conjuntura mudou, o humor piorou na Europa e no resto do mundo.
- O cenário não é mais o céu de brigadeiro. Temos a Europa com problemas, grandes empresas no Brasil adiando investimentos, o governo não consegue investir, a inadimplência da pessoa física subiu, o endividamento das famílias está elevado - disse.
Ele diz que o consignado tem sido um problema para bancos pequenos e médios.
- Embora a inadimplência seja baixa, o retorno sobre o capital é menor e de longo prazo. É preciso captação constante por parte dos bancos para girar essas carteiras. A crise na Europa diminuiu a liquidez; as fraudes em carteiras de consignado elevaram a desconfiança - explicou Santacreu.
O problema com o PanAmericano, no final de 2010, colocou na berlinda o Banco Central. Ele se viu obrigado a dar uma resposta sobre fiscalização e vigilância no sistema financeiro. Isso é bom porque há mais rigor sobre a situação dos bancos, mas os bancos, ao fazerem mais provisão, estão com menor capacidade de emprestar.
A situação no financiamento de veículos é um sinal de alerta. A inadimplência cresce há 16 meses. Saiu de 2,5% do total de operações para 5,9% dos empréstimos concedidos. A redução do imposto derrubou o preço dos carros novos. Com isso caiu também o do carro usado. Quando o banco tenta recuperar o ativo inadimplente ele recebe menos do que havia previsto.
As crises nos Estados Unidos e na Europa são lições suficientes para se ter cautela quando o assunto é crédito. O sistema financeiro brasileiro é muito concentrado, os seis maiores bancos detêm 91% de todos os ativos financeiros. Os bancos médios são necessários. Seria ruim se continuasse aumentando a concentração.
FONTE: O GLOBO
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