Pela primeira vez nos últimos 20 anos, um diretor do Banco Central vem a público para avisar que as cotações do dólar têm de subir. Mais ainda, têm de subir porque o desempenho da indústria não foi satisfatório dois meses antes. Foi o que declarou nesta terça-feira o diretor de Política Monetária, Aldo Luiz Mendes.
Mesmo depois de 1999, quando foi definida a livre flutuação do câmbio no Brasil, ninguém no governo federal definiu que essa flutuação se faria de modo absoluto, no sentido de que a cotação da moeda estrangeira seria aquela que fosse determinada pela oferta e procura sem interferência das autoridades.
Sempre se soube que o câmbio no Brasil – como, de resto, em todo o mundo – opera no regime de "flutuação suja". A diferença é que, em 2004, o próprio Banco Central definiu que essa intervenção se faria em duas condições: quando fosse preciso neutralizar a excessiva volatilidade das cotações – caso de uma forte entrada ou saída de dólares: ou houvesse necessidade de formar reservas.
A partir do governo Dilma, sem declaração prévia, essa regra foi alterada. O próprio Banco Central tratou de puxar as cotações para cima para conter a excessiva valorização cambial (baixa do dólar).
Com isso, as cotações saltaram para acima dos R$ 2 por dólar, chegando ao máximo de R$ 2,0830 no dia 28 de junho. Nesta semana, o próprio Banco Central voltou a vender moeda estrangeira aparentemente porque entendeu que a desvalorização fora longe demais. As cotações voltaram a cair para abaixo dos R$ 2 por dólar, o que parece ter incomodado em especial o diretor de Política Monetária, que nesta terça-feira passou o recado de que o Banco Central terá de voltar a comprar moeda estrangeira, agora no mercado de derivativos.
A condução da política de câmbio pelo Banco Central está pouco clara. Tanto não lhe interessam cotações acima de R$ 2,10 por dólar como não lhe interessam cotações abaixo de R$ 2 por dólar, o que, por si só, caracterizaria um limite estreito de variação.
Porém, mais esquisita é a afirmação de um diretor do Banco Central, cuja única função é cuidar da saúde da moeda, de que, no momento, é o desempenho da indústria que tem de determinar a política cambial, não importando muito as causas do seu baixo resultado nem o comportamento do resto da economia.
Nesta terça-feira, o IBGE divulgou os resultados de sua pesquisa sobre a produção industrial e o que se viu é decepcionante: queda de 0,9% em maio em relação a abril; queda de 4,3% em relação a maio do ano passado; e de 3,4% nos primeiros cinco meses do ano em relação a igual período do ano passado.
Tanto a presidente Dilma como o ministro Guido Mantega vêm afirmando que o avanço insatisfatório do sistema produtivo (e não só o da indústria) é consequência da crise internacional – fator que não explica tudo. Em nenhum momento foi adiantado que esse fiasco tem a ver com a excessiva valorização do real nem que a desvalorização induzida até aqui teria de ser acentuada para salvar a produção.
É incompreensível que uma autoridade da área monetária declare que é preciso empurrar o câmbio, qualquer que seja a direção. Mesmo que decididas equivocadamente, essas coisas não se anunciam; simplesmente se fazem.
Confira
Apesar dos sucessivos pacotes de estímulo, a indústria continua andando para trás. Os números da produção física divulgados nesta terça-feira pelo IBGE apontam queda de 4,3% em maio de 2012 em relação a maio de 2011; e de 1,8% em 12 meses.
O consumo cresce. Esses maus resultados acontecem ao mesmo tempo que o consumo cresce entre 5,0% e 6,0% ao ano. Ou seja, a indústria não consegue dar conta da demanda. Ela própria prefere recorrer às importações para suprir-se de insumos, peças, componentes, conjuntos e parte da produção. A indústria vai perdendo competitividade a olhos vistos e isso não tem a ver com o câmbio.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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