terça-feira, 7 de agosto de 2012

O desenho do PT no pós-mensalão - Raymundo Costa

Numa primeira abordagem sobre a repercussão do julgamento do mensalão, presume-se que o PT que sofrerá algum prejuízo na eleição municipal de outubro, mas entrará com força no jogo principal, em 2014. Seja com a candidatura à reeleição de Dilma Rousseff, seja com a volta de Luiz Inácio Lula da Silva, na hipótese de agravamento da crise internacional e seus efeitos no país forem calamitosas.

Não é por outro motivo de a presidente guardou uma prudente distância do processo em julgamento no Supremo Tribunal Federal e colocou o governo inteiro para trabalhar no pacote de medidas que pretende anunciar aos poucos, até que o mensalão saia de cena. Nas reuniões para acertar projetos de concessão no setor de infraestrutura, diminuição no preço da tarifa de energia elétrica, entre outros, uma palavra permeia todos os debates: emprego. A reeleição da presidente está mais na manutenção da sensação de bem estar da população que nas discussões, indigestas mas necessárias, do julgamento do mensalão.

Mas no Supremo Tribunal Federal (STF) também joga-se a sorte do PT e de líderes que fizeram do partido o gigante que é hoje. O PT olha de viés para o julgamento, porque considera que pagou a conta eleitoral do mensalão em 2006. Hoje o assunto teria muito menos impacto na opinião pública ou "publicada", como preferem distinguir líderes do partido. Pode ser. Os números indicam isso.

Partido acha que pagou conta do mensalão em 2006

Entre a primeira eleição de Lula, em 2002, e a reeleição, em 2006, o partido perdeu 2,1 milhões de votos. Quatro anos mais tarde, na eleição de Dilma Rousseff, candidata que nunca antes havia disputado ao menos uma eleição de vereador, o PT praticamente dizimou a oposição.

Mas eleições costumam surpreender. Em 2006, o fato de ter deixado a prefeitura, após ter prometido que não largaria o cargo para o qual fora eleito dois anos antes, não atrapalhou tanto José Serra na eleição para o governo estadual como viria atrapalhar na eleição presidencial de 2010, quando perdeu para Dilma. Serra teve de se explicar, na disputa com Dilma, mais do que na campanha anterior.

A eleição de 2006 foi disputada menos de um ano após as CPIs do Congresso que botaram o PT no banco dos réus. Ainda assim, Lula estava cotado para vencer no primeiro turno. Um fato teria contribuído para levar o presidente ao segundo turno Geraldo Alckmin, o candidato do PSDB: o escândalo dos aloprados, às vésperas da eleição - um grupo de petistas flagrado quando tentava comprar um suposto dossiê com denúncias contra o PSDB.

Em meio a tudo isso ainda houve o caso de um assessor de deputado petista detido num aeroporto tentando embarcar com maços de dólares escondidos na cueca. De fato, o noticiário não era nada favorável ao PT, como não é agora, mas o partido ganhou as eleições. A um custo bastante alto, somente recuperado em 2010.

Em 2006, a votação do PT nas eleições para a Câmara dos Deputados caiu 13% em relação à onda vermelha de 2002. Já em 2010, cresceu 14,8 na comparação com 2006, e voltou a eleger o maior número de deputados para a Câmara. O partido teve 16 milhões de votos, enquanto o PMDB, que esperava ficar em primeiro lugar, somou 12,5 milhões de eleitores.

Na ementa, o PT arquivou o mensalão como assunto eleitoralmente resolvido em 2006, 2008 e 2010. Avalia hoje que em um mês, depois da sobrevida que o assunto ganhou com o julgamento, ninguém mais lembrará da crise. E em dezembro a imprensa já estará ocupada com a reeleição e com quem será o candidato a vice na chapa de Dilma. O efeito eleitoral esperado é para agora, nas eleições municipais, inclusive em São Paulo.

Seja qual for o resultado das eleições municipais em São Paulo, é certo que o PT paulista não será mais o mesmo de antes do mensalão. Para ser mais preciso, o PT já não é o mesmo. As tendências que antes de 2002 faziam do PT um partido vivo, atualmente estão diluídas. O que existe hoje, no entendimento de quem vive o dia a dia partidário, é o peso das personalidades avulsas. Entre elas, José Dirceu. Se for absolvido, ainda será um nome forte no aparelho partidário, em geral, e na corrente majoritária Construindo um Novo Brasil (CNB), em particular. Mas já não será onipresente como antes.

É improvável que Dirceu tenha condições de se recolocar no jogo presidencial como esteve quando Lula assumiu o governo em janeiro de 2003. Até por uma questão de precedência: mesmo se for redimido no julgamento, antes tem a reeleição de Dilma e, depois, a volta de Lula, no caso de os petistas considerarem que "o projeto" está ameaçado. Depois de Lula e Dilma, o PT é uma terra de ninguém.

O governador da Bahia, Jaques Wagner, já esteve melhor cotado no mercado interno. No momento, duvida-se de sua capacidade para ajudar a eleger o candidato do PT a prefeito de Salvador (BA). A violência e uma greve de professores desgastaram a gestão de Wagner. Mesmo que consiga dar a volta por cima, Wagner é visto como uma liderança de âmbito regional.

Se Patrus Ananias eventualmente ganhar a eleição de Belo Horizonte, o ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) também se "redime" do ensaio herético de uma composição tucano-petista para o pós Lula, feita em 2010 a quatro mãos com Aécio Neves, o eventual nome do PSDB contra Dilma, em 2014. E o crédito não será dele, mas de Dilma.

Marcelo Déda tem prestígio entre os petistas e é compadre de Lula, mas governa um Estado pequeno e de pouca força eleitoral. O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, dirigiu dois ministérios e liderou uma corrente para a "refundação" do PT após o escândalo do mensalão. É um dos principais obstáculos a voos mais altos de José Dirceu.

Ele mesmo tem ambições que ultrapassam as divisas do Rio Grande do Sul, já manifestadas antes, nos momentos em que Lula parecia hesitar em concorrer novamente à Presidência. Aí Dirceu é quem será o obstáculo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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