Presidente encerra rodada de conversas com partidos sem conseguir formação de governo
ROMA - O desentendimento entre as maiores tendências políticas na Itália, aliado ao “semestre branco” - aquele em que o presidente não pode dissolver o Parlamento - estreita as possibilidades do presidente italiano, Giorgio Napolitano. O chefe do Executivo italiano cogitaria recorrer a uma administração não política. Entre os melhores nomes considerados para encabeçar este governo tecnocrata estão Fabrizio Saccomanni, diretor-geral do Banco da Itália, e o chefe da Corte Constitucional, Franco Gallo. Nesta sexta-feira, Napolitano fracassou em uma nova rodada de negociações com os principais partidos políticos do país, em busca de uma solução para o vácuo de poder instaurado desde as últimas eleições. Para realizar uma nova eleição, ele precisaria dissolver o Parlamento, algo que o chefe do Executivo não pode fazer nos últimos seis meses do mandato, que será encerrado no dia 15 de maio. Diante da falta de definições, o presidente anunciou que refletirá por algum tempo antes de tomar uma decisão.
A solução ganha força porque promoveria reformas e medidas econômicas urgentes, como uma nova lei eleitoral, mas depende do aval de ao menos dois dos três principais blocos do Parlamento, o que hoje parece improvável. Analistas políticos acreditam que a atual legislação levaria a um impasse semelhante no próximo pleito, caso ele fosse realizado nos próximos meses. A centro-direita, porém, avalia que a atual crise aumentou seu poder e, por isso, seria a mais motivada a voltar às urnas. No entanto, se o comediante Beppe Grillo, do Movimento 5 Estrelas (M5S), mudasse seu discurso e aceitasse uma aliança com Bersani, o movimento seria o oposto. O ex-premier Silvio Berlusconi, de acordo com analistas, já estaria “cavando a sua própria tumba”, sem qualquer chance de retornar ao cenário político.
Há cerca de um mês, quando os resultados do último pleito foram divulgados, alianças entre os líderes mais bem colocados nas urnas foram propostas e rechaçadas. Durante a última semana, o líder da centro-esquerda, Pier Luigi Bersani, rejeitou a aliança com Berlusconi, que comanda a centro-direita. Os blocos liderados por Bersani e Berlusconi foram, respectivamente, primeiro e segundo colocados nas eleições, por uma pequena margem de votos. Na Câmara, os partidários de Bersani conseguiram 29,5% dos votos, contra 29,1% do ex-primeiro-ministro. No Senado, a disputa também foi apertada. A centro-esquerda obteve o apoio de 31,1% dos eleitores; e Berlusconi, 30,6%.
Para Berlusconi, que já foi primeiro-ministro em três ocasiões, o único modo de Bersani chegar ao poder seria aceitar um acordo com ele.
- Não mudamos nossa posição, e expressamos isso com absoluta clareza para o presidente - reiterou ontem o ex-premier, após encontrar-se com Napolitano.
O Povo da Liberdade (PDL), partido de Berlusconi, já manifestou seu interesse em articular com o Partido Democrático (PD), de Bersani, quem deveria substituir Napolitano. Segundo o ex-premier, “parece lógico que, formando um governo de coalizão, deve-se discutir o melhor presidente da República”.
Ao mesmo tempo em que flerta com a centro-esquerda, Berlusconi rejeita a possibilidade de apoiar um governo tecnocrata, como o conduzido pelo seu sucessor e atual primeiro-ministro demissionário, Mario Monti, o que define como uma “experiência trágica” e responsável por ter levado a Itália à recessão.
- Fomos contra o governo de Monti e, se a solução for ter outro governo deste tipo, é mil vezes melhor fazer novas eleições — assegurou Roberto Maroni, líder da Liga Norte, principal aliada de Berlusconi.
O novo aceno do ex-premier ao PD, porém, foi prontamente vetado. O líder da legenda, Luigi Zanda, considerou “muito difícil” vê-la integrada à centro-direita. Nesta sexta-feira, ao sair do encontro com Napolitano, representantes da centro-esquerda descartaram novamente qualquer aliança com Berlusconi.
- As fortes diferenças entre as tendências políticas fazem com que um governo de unidade nacional com as forças políticas tradicionais não seja ideal - ponderou o vice-secretário do partido, Enrico Letta.
O PD, segundo Letta, deve apoiar a “solução de governabilidade” que será proposta por Napolitano, após o fracasso de sua série de reuniões.
O fiel da balança poderia ser o Movimento 5 Estrelas (M5S), articulado pelo comediante Beppe Grillo, que surpreendeu a Itália ao obter 25,5% dos votos na Câmara e 23,7% no Senado. A nova força política, cuja bandeira é a indignação com os partidos tradicionais, poderia encerrar o impasse caso decidisse por um dos lados. Bersani chegou a comprometer-se com reformas urgentes, que estancariam a crise institucional italiana. Mas o apoio a qualquer tendência foi novamente repelida ontem por Grillo, em uma transmissão por vídeo em seu blog.
- Dar a elas (as principais legendas políticas) um voto de confiança? Isso é um palavrão na boca dessas pessoas - vociferou. - Elas deveriam ir para a cadeia.
Nem os jornalistas escapam do discurso de Grillo, avesso a dar entrevistas. Segundo ele, toda a imprensa, assim como a classe política, “precisa de um psiquiatra”.
O M5S considera Bersani, Berlusconi e Monti os responsáveis pela crise socioeconômica que acomete a Itália. Em seu novo pronunciamento, também rejeitou uma administração “pseudotecnocrata”. Grillo não participou da delegação de seu movimento que encontrou-se ontem com Napolitano, mas falou com ele por telefone. O humorista criticou o presidente durante a campanha, mas agora, segundo a imprensa italiana, assume uma postura mais respeitosa com o chefe do Executivo.
Segundo a deputada Roberta Lombardi e o senador Vitor Crimi, do M5S, a força política está disposta a formar o seu próprio governo.
- Lançamos novamente, diante de Napolitano, a proposta de um governo que colocaria imediatamente em marcha algumas iniciativas no Legislativo. Queremos discutir cada lei no Parlamento - afirmou Roberta. - Há vinte anos escuto as mesmas palavras e nada é feito.
Nova eleição pode manter indefinição
O impasse político leva a crescentes preocupações relacionadas à habilidade da Itália para confrontar a atual crise econômica. O país passa, há mais de um ano, por uma profunda recessão. Sua dívida pública já ultrapassou 2 trilhões de euros e o desemprego atinge índices recordes, especialmente entre os jovens.
Fonte: O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário