O senador Aécio Neves (PSDB-MG) comentava ontem com muita propriedade um velho ensinamento de que política é feita mais de gestos do que de palavras. E quem tem se dedicado a observar como se comportam os jogadores dessa quadra verá que os últimos dias foram fartos nesse aspecto. Nada mais emblemático do que a vibração do vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR), o líder da bancada petista, José Guimarães (CE), e do deputado José Genoino (PT-SP) quando o plenário da Casa aprovou a urgência para o projeto que tira de novos partidos tempo de tevê e fundo partidário.
O entusiasmo, só comparado ao dos torcedores de grandes times de futebol vencedores de campeonatos importantes, é sinal de que nem tudo está bem na base governista. Sendo assim, o PT precisa, e muito, segurar todos os parlamentares onde estão de forma a não abrir mais o leque a outros projetos — leia-se Marina Silva e a Rede; Paulo Pereira da Silva, com o Solidariedade; e o Mobilização Democrática (MD), resultante da fusão PPS-PMN, que deve ter seu estatuto aprovado logo, em tempo de se livrar desse cerco.
Marina Silva é outra história. Detentora de 18% dos votos na eleição passada, fundamentais para que o pleito fosse decidido em segundo turno entre José Serra e Dilma Rousseff, Marina corre contra o tempo para formar a sua Rede até setembro, de forma a ter ainda um período até a primeira semana de outubro para as filiações partidárias. Afinal quem deseja participar de eleição deve se filiar a um partido um ano antes. Esse é seu maior desafio. Se conseguir — e tiver tempo de tevê —, pode atrapalhar o governo. Como o governo, aparentemente, não tem como furar a rede nos tribunais eleitorais, trabalha para evitar que a Rede tenha tempo de tevê e acesso ao fundo partidário.
A comemoração de Guimarães, Vargas e Genoino não seria tão grande se esses projetos alternativos em gestação não fossem prejudiciais ao Partido dos Trabalhadores. Se tudo estivesse maravilhoso para o PT na política, como está a popularidade de Dilma nas pesquisas, o entusiasmo com essa proposta de tirar tempo de tevê dos novos partidos não seria tão genuíno.
Os petistas já perceberam que a base não é mais tão dócil quanto em tempos passados. E as conversas de bastidor no plenário falam por si. Ontem, por exemplo, o deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE) procurou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). Estava interessado em ir a Pernambuco, conversar com o governador Eduardo Campos, pré-candidato a presidente da República pelo PSB. Minutos antes, o senador Aécio Neves, o nome do PSDB para concorrer contra Dilma, havia cruzado os salões da Câmara. Entre uma entrevista e outra, foi abordado por vários deputados governistas interessados em um tête-à-tête com ele, caso, por exemplo, do mineiro Leonardo Quintão, também do PMDB.
Ok, alguns podem apenas se mover no sentido de ver se recebem algum carinho do Planalto. Mas, se gostarem da conversa dos pré-candidatos que despontam por aí, acabam ficando na margem oposta do rio. E, a um ano e meio da eleição, diante das incertezas econômicas, esses gestos de criar pontes para todos os lados é natural. Afinal, conforme alguns economistas têm dito a políticos que os procuram, o Brasil deixou de ser a bola da vez dos investidores, até porque as idas e vindas dos marcos regulatórios de diversos setores os espantam, e essa turma prefere trabalhar com regras claras e sólidas.
Para completar, têm a subida dos juros em 0,25 ponto percentual, que ajuda a segurar a inflação — o mais perverso dos males para as classes mais carentes —, mas frustra aqueles que estão endividados, leia-se a nova classe média. O cenário se completa com o gasto público nas alturas, a criação de estatais em série e a presidente dizendo que não irá fazer sacrifícios em detrimento da população. Isso funciona até um certo tempo, mas não para sempre. Daqui a pouco, caso o dinheiro não dê para cobrir todas as ações governamentais — e não está cobrindo há tempos —, as contas vão estourar e as cobranças recairão sobre Dilma, que por mais seriedade que demonstre em suas ações, não consegue fazer mágica.
Nem fazer vibrar a política.
Enquanto isso, na fonte da saudade...
Com as nuvens carregadas sobre a economia, existe, dentro e fora do Poder Executivo, quem esteja com um certo ar nostálgico ao citar o ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci. Há quem diga que, nos tempos dele como comandante da política econômica, havia no ar a sensação de maior controle. Agora, os comentários são de que, embora o governo esteja empenhado nesse controle, os gestos dos ministros e a ampliação do gasto público não deixam isso muito claro.
Fonte: Correio Braziliense
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