Caio Junqueira
BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff aproveitou a dispendiosa tramitação da Medida Provisória (MP) dos Portos no Congresso Nacional para fazer com que, ao menos nesse tema, o governador de Pernambuco e presidenciável Eduardo Campos (PSB) dependa de decisões do Palácio do Planalto para conseguir o que deseja.
Desde o início, Campos mobilizou seus contatos em Brasília para que a redação final da MP estabelecesse que os Estados compartilhassem com a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) o poder de realizar as licitações dos contratos de concessão de portos organizados e arrendamentos de instalações portuárias. Tratava-se de uma alternativa muito mais flexível, do que a MP original, que conferia à Antaq a exclusividade das licitações.
Ocorre que o governo se mobilizou para derrubar nesta semana todas as emendas que contivesse esse teor. Mesmo aquelas votadas após o governo ter aceitado levar esse ponto à mesa de negociação com o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), que a incluiu em sua famosa emenda aglutinativa. Mas como o pemedebista manteve nela outros pontos de que o governo divergia, a chance de Campos obter o que queria caiu junto com a divergência Cunha-governo. Acabou prevalecendo a versão que havia saído da comissão especial: a de que os Estados até podem realizar as licitações, desde que a Antaq -no caso, Dilma - concorde.
Assim, Campos terá de se submeter à boa vontade presidencial se quiser mexer naquela que é a sua maior vitrine, em termos de desenvolvimento econômico, em Pernambuco: o porto de Suape. Dependência relevante, ao se considerar que um porto público organizado tem capacidade para cativar, muito mais que o eleitorado brasileiro, o empresariado nacional e financiadores em potencial de sua eventual campanha.
É equivocada, contudo, a avaliação de que, por isso, Campos foi derrotado na MP dos Portos e que a relação PT-PSB sai prejudicada desse processo. Primeiro, porque da mesma forma que Dilma não acatou sua sugestão, ela também fez questão de garantir que não vetará o texto da forma como saiu do Congresso - uma espécie de meio termo entre a extrema centralização de decisões em Brasília que a MP original propunha e a facilitação demasiada que, na avaliação do Palácio do Planalto, seria feita ao eventual adversário de 2014. Segundo, porque o estresse gerado nesse processo na relação do PT com o maior aliado, o PMDB, só beneficiou Eduardo Campos. Tanto que seus correligionários souberam aproveitar bem isso.
Eram quase 5h de ontem quando isso ficou bem evidente. Os petistas começaram a atacar o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), por sua interpretação do regimento que impedia a sessão de ser derrubada e, assim, a votação da MP na Câmara ser concluída logo.
Do microfone, o líder do PT, José Guimarães (CE), acusou Alves: "O encerramento da sessão é uma interpretação do regimento, como interpretou o deputado Arlindo Chinaglia [PT-SP], quando foi presidente [da Câmara], e também o fizeram os presidentes João Paulo Cunha [PT-SP] e Michel Temer [PMDB-SP]. O presidente [Henrique Alves] deu uma interpretação [diferente]. E a base se sentiu insegura, porque a interpretação favoreceu a oposição."
Nervoso, Alves o contestou: "Não favoreci a oposição coisa nenhuma. Eu cumpri o regimento. E não me afasto um milímetro do cumprimento desse regimento, em momento algum! O caminho que Vossa Excelência está percorrendo é muito perigoso. Esse tipo de interpretação não posso aceitar. Em momento algum, tive sequer a intenção [de favorecer a oposição]". Seguiram-se palmas, que despertaram os parlamentares que cochilavam em suas cadeiras.
Eduardo Cunha, então, fez a defesa de Alves: "Há seis anos que eu não assisto a uma interpretação diferente da que foi adotada pelo presidente Henrique Alves." Prosseguiu: "Se estamos passando algo aqui é por problemas que estão existindo dentro da própria base do governo. Há problemas de articulação política, sim. Não adianta querer inventar solução se não se sabe como enfrentar a política." E concluiu: "Está na hora de olhar aquilo que tem que ser feito para melhorar [a relação entre governo e base], se não vamos, na medida em que se aproxima o processo eleitoral, tendo matérias mais polêmicas, mais politizadas, mais combativas, mais dignas de obstrução."
O primeiro a tomar posição no plenário diante do embate foi o líder do PSB, Beto Albuquerque (RS). Ficou com Alves: "Vossa Excelência tem sido magistrado. Isso é o que importa. O regimento não foi feito para pender para um ou para outro, mas para servir à Casa e ao seu funcionamento. Vossa Excelência. conduziu o processo adequadamente."
Fonte: Valor Econômico
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