A política é a arte de administrar o tempo. O senador Aécio Neves começa a conversa com esta frase. Aos 53 anos, o ex-presidente da Câmara dos Deputados e ex-governador de Minas Gerais por dois mandatos, torna-se amanhã o presidente nacional do PSDB, antessala de sua candidatura à Presidência da República.
Aos 53 anos, Aécio tem administrado seu tempo de olho no relógio do PSDB paulista. Depois de três disputas presidenciais consecutivas perdidas pelos paulistas do partido, o senador mineiro assume a missão de acertar os ponteiros tucanos pelas mesmas badaladas.
Em 2010, depois dos dois principais nomes do PSDB paulista, Geraldo Alckmin e José Serra, terem tido, cada um, sua chance, Aécio chegou a se insinuar. Recuou face à decisão de Serra de se recandidatar e, por fim, resistiu aos apelos para que se tomasse vice em sua chapa.
Orgulha-se de levar um PSDB unido à convenção, ainda que a concessão de cargos na máquina do partido aos paulistas seja apenas um dos muitos capítulos de disputa interna que ainda terá que aplacar.
Aécio diz que a agenda do partido em 2014 terá como pontos de partida aqueles lançados pelo governo Fernando Henrique Cardoso: estabilidade da moeda, câmbio flutuante, internacionalização da economia e transferência de renda.
O governo do ex-presidente, ao contrário do que aconteceu nas últimas campanhas, será resgatado. E que não tentem fazer caso da divergência de ambos em relação ao instituto da reeleição. "Continuo achando que seria melhor para o Brasil a lista fechada, o fim das coligações proporcionais e o mandato de cinco anos sem reeleição. O fato de Fernando Henrique ser contra não desmerece a proposta".
Uma demonstração de que o ex-presidente é parceiro de primeira hora da candidatura é a gestação de dois documentos internos, gerados sob seus auspícios por ex-colaboradores de seu governo, que já antecipam o debate do programa de governo (leia textos em www.valor.com.br).
O primeiro, assinado por Xico Graziano, que foi ex-chefe de gabinete da Presidência, pontua a disposição do PSDB de reivindicar a primazia na formatação de programas de transferência de renda. É o prenúncio do que pode vir a ser uma "Carta ao eleitor brasileiro".
O outro é coordenado por Nassim Gabriel Mehedff, ex-secretário nacional de políticas públicas de trabalho e renda e atual diretor da seção fluminense do Instituto Teotonio Vilela. Esse documento chega a questionar, sem ignorar a contenda eleitoral do debate, se o aumento dos recursos para a educação terá alguma serventia se as políticas do setor não forem direcionadas para a necessidade do país de aumentar sua produtividade.
O tema, que levou o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), a antecipar lei estadual que estabelece 100% dos royalties para a educação, é um dos carros-chefes da campanha da presidente Dilma Rousseff à reeleição, também terá a colher do PSDB. O senador tucano se compromete não apenas em destinar a totalidade dos royalties para a educação como também com os 10% do PIB para o setor.
Aécio reconhece o avanço do PT no que chama de "adensamento de programas sociais", mas apresenta-se disposto a disputar a bandeira. Chega até mesmo a dizer que a política de valorização do salário mínimo é conquista social a ser mantida. É uma notícia a alegrar a base sindical que pretende montar para sua candidatura, mas deve preocupar os economistas próximos do partido, que não veem como as contas fiscais do governo podem fechar enquanto a política estiver em vigor.
Aécio diz que o PSDB não tem nenhum economista que fale em nome do partido. Não quer se comprometer com alternativas de políticas econômica e monetária —"Esse ônus deixo para o governo" —, mas deixa claro que se "um período transitório de juros mais altos for necessário, será apenas para preservar o poder de compra dos menos favorecidos".
Recusa contenda com Serra no ringue da inflação. No palanque do 1º de Maio da Força Sindical, Aécio usou "leniência", "grave momento" e "perspectivas sombrias" para definir a atual política anti-inflacionária. Dias depois, Serra, em palestra na USP, disse que "de jeito nenhum" via explosão inflacionária no país.
O senador afirma concordar com Serra, mas logo emenda nova crítica ao governo Dilma Rousseff. Diz que o maior atestado de fracasso petista foi escolher os dez anos de governo para comemorar, e não os dois anos de gestão Dilma. "Sabe por quê? Porque ela só tem duas marcas: crescimento pífio e inflação".
Aécio tem na ponta da língua toda a numeralha de candidato de oposição: 63% dos brasileiros estão endividados e um quarto deles com prestações em atraso, a refinaria que deveria custar R$ 4 bi vai sair por R$ 40 bi, o país virou exportador de commodities com 0,9% do comércio mundial e a União reduziu a participação no financiamento da saúde de 45% para 36%.
Se Dilma pretende usar a conquista da OMC para lustrar o patriotismo dos anos lulistas, Aécio vai rebatê-la dizendo que o país perdeu a credibilidade internacional, "deixou de ser a bola da vez" para os investimentos internacionais. O argumento será o de que faz um "governo em zigue-zague" ao estabelecer regras excessivamente rígidas para investimentos e depois volta atrás oferecendo taxas de retomo mais elevadas.
O futuro presidente do PSDB diz que o debate apenas começou e não vê como o partido possa ter um programa antes do início de 2014.
Discorda dos rumos tomados pelo partido na sucessão de 2010, quando o PSDB surfou numa campanha obscurantista de aborto e kit gay. "É fácil falar depois do leite derramado, mas discordo do encaminhamento. Não vamos admitir que nos joguem no gueto conservador. Não é nele que está refletida a história de nossas maiores lideranças."
A boa notícia para o eleitor é que, da principal força de oposição, se anuncia, depois de alguns anos, um bom combate.
Fonte: Valor Econômico
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