Quando discursar amanhã na convenção de seu partido, assumindo o comando político do PSDB, o senador Aécio Neves terá a missão de transmitir um apetite maior para ser candidato a presidente da República
O Brasil vive atualmente um processo inverso ao que se verificava em outros tempos. Agora, é o governo quem começa sua campanha mais cedo. A presidente Dilma Rousseff, popular candidata à reeleição, está nas ruas, nos encontros partidários, como o de Porto Alegre, onde circulou essa semana acompanhada do ex-presidente Lula. Enquanto isso, a oposição, pequena e muitas vezes desarticulada, parece com o motor engasgado. Amanhã, depois de meses de idas e vindas, será a convenção em que o principal partido desse campo político, o PSDB, pretende finalmente tentar ao menos tirar um pouco da diferença que o separa hoje da presidente Dilma, encostando as pré-campanhas.
A tarefa dos oposicionistas, entretanto, não será fácil. Logo pela manhã, enquanto os tucanos estiverem abrindo a sua convenção, a atenção da maioria dos brasileiros na seara política estará novamente voltada à presidente Dilma Rousseff. Ela participará da festa de inauguração do Estádio Nacional Mané Garrincha, ao lado do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, do PT. Levará alguns ministros, como o do Esporte, Aldo Rebelo. O estádio fica a menos de um quilômetro do local que o PSDB escolheu para a sua convenção, o centro Brasil XXI.
Há quem diga que esses dois eventos no mesmo dia são resultado de mera coincidência. Os políticos, entretanto, tendem a acreditar que não há coincidência nessa atividade. Num sábado qualquer, sem uma inauguração que chamasse a atenção de Brasília, os holofotes estariam todos voltados para a convenção do principal partido de oposição. Diante disso, essa “coincidência” ajuda a simbolizar as dificuldades externas e internas do PSDB, que não são poucas.
Quando discursar amanhã na convenção de seu partido, assumindo o comando político do PSDB, o senador Aécio Neves terá a missão de transmitir um apetite maior para ser candidato. Embora ele tenha dito com todas as letras que está à disposição do PSDB para ser candidato, todos os dias surge um político no Congresso dizendo que duvida dessa vontade. E isso dos mais variados partidos. (Com o ex-presidente Lula ocorre o inverso. Ele diz que não é candidato, mas muitos acreditam que daqui a seis meses ele pode mudar de ideia).
Tirar essa impressão de que pode não concorrer é o primeiro passo na missão de empolgar o PSDB, mostrar a que veio e tratar de buscar aliados, delegando a terceiros a parte administrativa e burocrática. Nesse sentido, nem os gestos de apreço a José Serra podem ficar esquecidos. E a escolha de aliados dele para cargos importantes no PSDB tem um motivo: tentar evitar que Serra termine deixando o PSDB . Hoje, as apostas dos principais serristas são as de que o ex-candidato a presidente por duas vezes , e ex-governador de São Paulo tende a ficar no ninho tucano. Afinal, se saísse não levaria muita gente com ele. Um de seus maiores aliados, o deputado Jutahy Júnior, da Bahia, sempre rechaçou a ideia de deixar a sigla. Para completar, o futuro ao lado do MD de Roberto Freire hoje é tão incerto quanto era a MP dos Portos ontem no início da tarde.
Por falar em MP dos Portos...
O tema fez com que a mesma Dilma Rousseff, que demonizava o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), erguesse um altar para enaltecer a figura do presidente do Senado, Renan Calheiros, do PMDB de Alagoas. A contar pela pressa com que Renan agiu para garantir a votação do marco regulatório dos portos ontem, ele terá tudo o que quiser da presidente da República. O mesmo, entretanto, não ocorrerá com ele em relação ao conjunto de senadores, constrangidos com a pressão feita pelo presidente da Casa. Um senador da base governista comentava ontem, no início da noite, que se sentia bem menor do que há dois dias, quando a Casa parecia mais disposta a demonstrar altivez e debater os temas. Sentia-se rebaixado a mero apertador de botão.
O sentimento dos parlamentares era o de que o único a ganhar com a pressa e a votação foi mesmo Renan Calheiros. E, numa casa colegiada, quando um se torna muito superior a seus pares, deixando neles o sentimento de inutilidade, o feitiço de hoje pode virar contra o feiticeiro amanhã. Afinal, para quem prometeu enaltecer o Senado como uma Casa de deveres para com o país e debatedora de todos os temas, Renan pareceu disposto a transformá-la em mera batedora de carimbo do que vem da Câmara. O tempo dirá se essa redução da autoestima dos senadores pelo seu próprio presidente trará algum desgaste maior a Renan. Aí, será outra história.
Fonte: Correio Braziliense
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