No que depender do Congresso, temas como financiamento de campanha e fim das coligações tendem a avançar pouco, dizem especialistas consultados pelo Correio. O motivo é prosaico: quem se beneficia do jogo não está disposto a mudar as regras.
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Por que os políticos não querem mudar
O nó que amarra a reforma política no Brasil nunca foi desatado. O motivo é simples. Não há interesse. Historicamente, parlamentares só mudam as regras em benefício próprio. Quem tá dentro do jogo não quer sair. Agora, com o empurrão que veio das ruas, o país se questiona: as mudanças no sistema político e eleitoral serão levadas adiante? Financiamento de campanha, fim das coligações, unificação do calendário eleitoral e ampliação da participação popular são os principais pontos. O Correio ouviu ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cientistas políticos e advogados.
O cientista político da Universidade de São Paulo (USP) Rubens Figueiredo diz que é bastante difícil modificar regras que atrapalhem os políticos. "É muito difícil o meio político gestar uma reforma que seja contra os seus interesses. O que tivemos até aqui foram aperfeiçoamentos a exemplo da Ficha Limpa, fidelidade partidária e proibição de distribuição de brindes", afirma.
O ministro aposentado do STF Carlos Velloso atesta que nunca houve real vontade política do governo em realizar as transformações. "Bastaria que tivesse firme vontade política por parte do líder maior da maioria no Congresso, que é o presidente da República, principalmente num governo, como o atual, que se apoia numa coalizão de partidos", alega.
Na opinião de Carlos Velloso, a pressão popular assume papel determinante. "O Congresso votou, em menos de 60 dias, a Lei Complementar 135, a denominada Lei da Ficha Limpa, que foi de iniciativa popular. A matéria, uma ampla reforma política, nunca foi posta num projeto em que o chefe do Executivo tivesse manifestado vontade política na sua aprovação. Pesquisem os anais do Congresso nos últimos 10 anos", declara.
Para muitos, um dos maiores responsáveis pela deformação é a livre coligação nas eleições proporcionais. O ex-ministro do TSE Torquato Jardim alega que a maneira mais eficaz e prática de melhorar o sistema político brasileiro é impedi-las. "Plebiscito é golpe de estado no melhor estilo Hugo Chávez. As opções são muito técnicas para o povo se posicionar. Escapa ao controle. Basta proibir a coligação proporcional. O resto é consequência", opina.
Um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, o juiz Márlon Reis, diz que, agora, a situação é insustentável. "A reforma política só anda com pressão popular. Há um sentimento claro e generalizado pela sociedade de que o sistema eleitoral brasileiro é uma fábrica de corrupção. Não alterá-lo neste momento corresponderia a uma omissão imperdoável", diz.
De acordo com ele, o Congresso nunca quis uma reforma política de verdade. "Nunca houve interesse real das maiorias parlamentares. Um deputado federal me disse recentemente que não houve impasse sobre a reforma política, mas uma decisão consciente do Congresso de manter as coisas como elas estão."
Senador pelo Rio Grande do Sul, Pedro Simon (PMDB) também critica a classe política. "Não espere reforma política do Congresso, do governo ou do Supremo Tribunal Federal. Ninguém faz. Não há coragem. A verdade é essa", comenta. O parlamentar diz, no entanto, que chegou o momento. "A hora é essa. O Congresso só se movimenta quando o povo empurra. Temos que aproveitar." Ele defende um grande entendimento pluripartidário. "Só vai funcionar se for assim. Itamar Franco, quando assumiu a Presidência da República no lugar de Fernando Collor, chamou todos os partidos para o Palácio do Planalto. Disse que estava ali por uma decisão do Congresso e queria governar com todos. A reforma só vai adiante se houver um entendimento nesse nível", diz.
Limites de gastos
Se todos concordam que o momento da reforma política é este, não existe consenso nem mesmo dentro dos partidos em relação ao conteúdo das transformações. Sobre o sistema eleitoral, há quem defenda modificações na proporcionalidade dos votos. Hoje, para cargos executivos, o sistema é majoritário. Ganha aquele que tiver mais votos. No legislativo, há um sistema proporcional com lista aberta por meio de um quociente eleitoral. Uma das propostas é acabar com esse mecanismo.
Em relação ao financiamento de campanha, existem pelo menos três propostas. Hoje, no Brasil, há o sistema misto. Empresas ou pessoas físicas podem realizar doações para os candidatos. As siglas dos concorrentes também recebem dinheiro público via fundo partidário. Uma das propostas de modificação prevê o financiamento público exclusivo com um teto de gastos. Há a sugestão de que o mecanismo seja atrelado a um fundo nacional. Nesse caso, empresas não poderiam realizar doações diretamente. O dinheiro seria depositado numa conta gerida pelo Tribunal Superior Eleitoral. Alguns segmentos querem que pessoas físicas possam doar desde que se respeite um limite estabelecido.
"Já não há deputado ou senador que não saiba que o sistema se esgotou. Não é possível para o povo ser obrigado a voltar às urnas por uma só vez sob as regras vigentes. O sistema eleitoral brasileiro está morto", ressalta o juiz Márlon Reis.
A legislação eleitoral permite atualmente que os partidos façam coligações nas eleições para deputados e vereadores. Muitos criticam essa fórmula porque estimula o surgimento dos chamados partidos de aluguel. Alguns defendem a proibição das coligações e outros acham que seria possível a coligação desde que seja respeitado um tempo mínimo estabelecido. Outro ponto bastante debatido é o calendário eleitoral. O objetivo é unificar todas as eleições em apenas uma data de quatro em quatro anos. Uma das saídas é ampliar, em 2016, o mandato de prefeitos e vereadores para seis anos. A unificação só ocorreria em 2022.
"A hora é essa. O Congresso só se movimenta quando o povo empurra. Temos que aproveitar o momento"
Pedro Simon, senador da República
"Bastaria que tivesse firme vontade política por parte do líder maior da maioria no Congresso, que é o presidente da República"
Carlos Velloso, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal
"Basta proibir a coligação proporcional. O resto é consequência"
Torquato Jardim, advogado e ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral
"O sistema construiu uma armadilha: uma vez dentro do parlamento, passaram a fazer regras para assegurar sua permanência"
Márlon Reis, juiz, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa
Fonte: Correio Brazilirnse
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