Cristian Klein
SÃO PAULO - O clima de beligerância entre o PT e o PMDB - que levou a derrotas do governo federal na Câmara na semana passada - tem como principal explicação as alianças eleitorais deste ano, em que ambos se acusam de cederem pouco nos apoios a seus candidatos a governador. Levantamento feito pelo Valor, com as coligações estaduais firmadas desde 1998 entre as duas legendas, e também com a terceira maior sigla, o PSDB, mostra o quão generosa tem sido a política de alianças dos três maiores partidos brasileiros.
O PT em 2010 foi o partido que mais concedeu apoio - a sete candidatos a governador do PMDB - no histórico de alianças realizadas entre as três agremiações, no período.
Em seguida, vem o apoio do PSDB ao PMDB, em 2002, quando os tucanos aderiram à candidatura majoritária do aliado em seis Estados.
Em comum nas duas eleições está a presença do PMDB como vice na chapa presidencial. Ou seja, o preço do apoio pemedebista - e portanto de seus minutos do horário eleitoral gratuito - ao projeto nacional de tucanos e petistas tem sido a maior satisfação das pretensões de seus caciques regionais.
É exatamente o que está por trás das cobranças e da tensão que tomaram conta da relação entre PT e PMDB.
Se o PT é o que mais ofereceu apoio nas coligações estaduais entre os três partidos - o que, na prática, significa quem deu ou recebeu mais apoio ao PMDB, pois só ocorreram duas alianças entre petistas e tucanos no período, ambas em 1998 - os pemedebistas foram os que menos cederam desde então.
O apetite do PMDB no plano regional - principal base de seu poder político - pode ser medido tanto na relação com o PT quanto na com o PSDB.
Em contraste com os petistas, que os apoiaram em sete candidaturas a governador (RJ, MA, MT, MG, GO, PB e TO), os pemedebistas em 2010 retribuíram em apenas duas unidades da Federação (DF e SE). Em termos proporcionais, enquanto o PMDB foi apoiado pelo PT em 54% de suas 13 candidaturas, o aliado cedeu a 20% dos dez petistas que concorriam aos governos estaduais.
No período que cobre quatro eleições, a média de apoio do PMDB ao PT é a mais baixa - à exceção das taxas quase nulas entre petistas e tucanos. Foram cinco em 68 candidaturas petistas (7,3%).
Uma das razões está na própria política de alianças do PT, que era distante do PMDB até o partido alcançar a Presidência da República, em 2003. E, em parte, é resultado da verticalização vigente em 2002 e 2006. Nestas eleições, partidos aliados na chapa presidencial foram proibidos de se coligar, nos Estados, com legendas adversárias no plano nacional.
Em 2002, o PMDB estava como vice na chapa tucana ao Planalto e não podia apoiar candidatos a governador do PT. Mas em 2006, quando já integrava o ministério do ex-presidente Lula, a legenda ficou solta e apoiou apenas três (16,7%) das 18 candidaturas petistas.
Em 2010, com Michel Temer na chapa presidencial de Dilma Rousseff, o PMDB aumentou numericamente o apoio para 20%, mas não qualitativamente. O percentual reflete o baixo lançamento de candidatos petistas a governador - apenas dez, o menor feito desde 1998 pelos três grandes partidos - e se deu em unidades da Federação de peso eleitoral menor (DF e SE). Quatro anos antes, o PMDB havia apoiado o PT no segundo (Minas Gerais) e no quarto (Bahia) maiores colégios eleitorais.
Isso mostra que a adesão dos pemedebistas aos petistas nas eleições estaduais ocorre em baixo patamar e é declinante. Um dos argumentos do presidente nacional do PT, Rui Falcão, para rebater as pressões por apoio a candidatos a governador do PMDB, neste ano, é que a sigla até agora dá pouca contrapartida e só se dispõe a se coligar com petistas no Distrito Federal e, provavelmente, em Minas Gerais - numericamente o mesmo que na última eleição.
O PT, por outro lado, não deve repetir o recorde de adesões de 2010 e, por enquanto, declarou apoio a candidatos do PMDB em apenas quatro Estados (SE, AL, PA, AM) que reúnem apenas 7% do eleitorado nacional. As sete unidades da Federação onde os petistas apoiaram o PMDB, há quatro anos, representavam quase 30% dos eleitores do país - isto é, mais de quatro vezes.
Está aí a origem da gritaria dos pemedebistas. O PT resiste em reeditar a coligação em três Estados que contam com quase metade (14,5%) do eleitorado abrangido pelos apoios que deu ao parceiro em 2010: Rio de Janeiro, Maranhão e Goiás. E prefere ajudar o governador do Ceará Cid Gomes (Pros) a eleger seu sucessor, em vez de embarcar na candidatura do senador Eunício Oliveira, a maior aposta dos pemedebistas e que lidera as pesquisas eleitorais.
Menos generoso em 2014, o PT assusta o PMDB porque avança como nunca sobre o plano regional. Os Estados são o território político por excelência dos pemedebistas, nem tanto pelo número de governadores ou proporção do eleitorado - bem menores que do PSDB - mas pela possibilidade de manter e ampliar suas bancadas de deputados e senadores no Congresso Nacional.
Os petistas, que sempre deixaram em segundo plano a eleição para governador, mudaram a estratégia. Terão entre 11 e 14 candidatos, número maior que em 2010 - quando precisou ceder mais aos aliados para eleger Dilma, então desconhecida nacionalmente - e, principalmente, o grupo mais competitivo já lançado pelo partido e voltado para a conquista dos maiores colégios eleitorais, sem descuidar dos menores. O PT terá candidatos nos seis maiores Estados, que representam 60% dos eleitores do país, e, em pelo menos mais cinco, com 7%, o que abrange dois terços do eleitorado nacional.
Como o PMDB resiste em ter um papel subalterno no plano regional - sob o risco de repetir a trajetória de desidratação do DEM (ex-PFL) ao tornar-se um satélite do PSDB - o conflito de interesses com o PT é inevitável. Os petistas querem avançar, mas precisam, ao mesmo tempo, ceder a outros aliados de porte médio (para, em troca, ter seu tempo no horário eleitoral) e encontram resistência de penetrar em territórios estratégicos dominados pelos tucanos, como os dois maiores Estados: São Paulo e Minas. No que resta, acabam trombando com os caciques regionais do PMDB.
E a disposição dos pemedebistas em ceder é a menor entre os três grandes partidos. Desconsiderando a relação quase inexistente entre PT-PSDB e os anos de 1998 (em virtude do distanciamento ideológico/estratégico) e 2002 (verticalização) nas alianças com o PT, o PMDB tem as mais baixas taxas de apoio. Aderiu em média a 18% das candidaturas do PT (em 2006 e 2010) e em 20,7% às do PSDB (nas quatro eleições).
Em contraste, os pemedebistas foram mais apoiados por petistas e tucanos. O PT aderiu a 31% dos candidatos lançados pelo PMDB, em 2006 e 2010 (mesmo considerando 1998 e 2002, quando não houve relação entre ambos, a taxa é de 14%, pouco abaixo dos 18% do PMDB quando levado em conta somente as disputas em que houve alianças).
Já o PSDB apoiou 26,6% das candidaturas pemedebistas (17 em 64) nas quatro eleições. O que chama a atenção na relação entre os dois partidos é a maior generosidade dos tucanos nos Estados com maior peso eleitoral. Em 2002, por exemplo, dos seis Estados em que o PSDB aderiu ao PMDB, um (BA) tem grande eleitorado e três (RS, PE e SC) são de densidade média. E entre os dois menores, um (DF) se destaca pela visibilidade e importância estratégica de ser a capital federal.
A ampla maioria das adesões do PMDB aos tucanos, por sua vez, ocorreu em Estados com pequeno eleitorado. Dos 12 apoios, dez foram nas menores unidades da Federação. E nos outros dois um foi em 2010, em São Paulo, onde os tucanos têm hegemonia, e outro foi em 1998, no Rio, para uma candidatura de terceira via tucana pouco competitiva, a de Luiz Paulo Corrêa da Rocha, que ficou em terceiro lugar com 15,5%.
O histórico de alianças também mostra a crescente dependência do PMDB em relação aos apoios dos partidos que polarizam a eleição nacional. Enquanto o PT registrou, em 2002, nenhuma adesão seja de pemedebistas ou tucanos a seus candidatos a governador, o PMDB, em 2010, elevou essa taxa ao recorde do período: 77% do total de suas candidaturas (54% do PT mais 23% do PSDB).
Fonte: Valor Econômico
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