terça-feira, 18 de março de 2014

Merval Pereira: Alianças pragmáticas

A crise entre o PT e o PMDB está servindo de mote para o presidenciável Eduardo Campos assumir cada vez mais a postura de candidato de oposição, e não apenas ele. A sua provável vice, ex-senadora Marina Silva, segue na mesma batida, ela que, na eleição de 2010, não assumiu a condição de oposicionista nem no primeiro turno e talvez por isso não tenha ido mais longe do que foi. No segundo, recusou-se a apoiar qualquer dos candidatos, iniciando a pregação contra PT e PSDB, colocando-os no mesmo nível.

Eduardo Campos, para dar a ideia de como vê o governo de coalizão de que participou até recentemente, diz que a presidente Dilma distribui cargos e ministérios como quem distribui bananas e laranjas. Já Marina diz que a crise é exemplar da disfuncionabilidade do sistema.

Os dois têm razão: no Brasil, uma interpretação distorcida do que seja o papel dos partidos políticos no apoio a um governo levou a que a corrupção e o fisiologismo se tornassem elementos fundamentais da chamada “governabilidade”.

O problema será como a dupla PSB/Rede vai lidar com essa distorção que já está introjetada na vida pública brasileira. Agora mesmo estamos vendo as dificuldades enfrentadas pelos dois para definir os palanques estaduais. Os critérios de Campos são bem mais elásticos do que os da Rede de Marina, e ajustar esses pontos de vista para tirar da união o melhor efeito eleitoral é tarefa delicada.

Há na Rede a ideia de que é preciso dar limites a Campos, acostumado que estaria às práticas antigas da política. Já no PSB há a certeza de que é preciso adequar os anseios da Rede às realidades regionais para viabilizar eleitoralmente a chapa.

O caso de São Paulo é emblemático de como transformar limão em limonada. O veto de Marina ao apoio ao governador tucano Geraldo Alckmin a princípio trouxe problemas para Campos, pois a maioria esmagadora do PSB paulista queria apoiar o PSDB.

Estabelecida a impossibilidade, o PSB passou a dizer que Marina estava na verdade ajudando Campos a se livrar de uma coligação problemática, sem criar crise com o governo tucano, que estaria enfraquecido popularmente. O PSB poderá apresentar um candidato próprio e manter sua pregação de que representa o novo na política.

A rejeição a parceiros políticos impostos pelo pragmatismo eleitoral é comum nesse nosso presidencialismo de coalizão. A falecida Ruth Cardoso disse a famosa frase “o meu PFL não é o PFL do Antonio Carlos Magalhães”, que deixou o então presidente Fernando Henrique Cardoso em maus lençóis. Antes dele, Tancredo Neves já havia dito que o seu MDB não era o de Miguel Arraes.

As trapaças da sorte levaram a que Eduardo Campos, neto de Arraes, e Aécio Neves, neto de Tancredo, estejam unidos nesta campanha presidencial, armando pactos de não agressão e acordos regionais que prenunciam apoio de um ao outro no segundo turno da eleição presidencial.

O senador Aécio Neves, certo de que a estrutura do partido que preside o levará ao segundo turno, não se incomoda de dizer que apoiará Campos caso ele chegue ao segundo turno. O ex-presidente Fernando Henrique já chegou a dizer que qualquer dos dois seria bom, o mais importante seria derrotar o PT.

Já Campos não aceita nunca explicitar o apoio a Aécio no segundo turno, com receio de admitir que pode não chegar lá. Mas o caminho que está tomando, de duras críticas à presidente Dilma, dificulta a possibilidade de apoiá-la num segundo turno. Mesmo que fique em cima do muro, a exemplo do que fez Marina em 2010, a maioria dos seus eleitores irá naturalmente para a oposição, como aconteceu na última eleição.

Em caso contrário, a quase totalidade dos eleitores do tucano apoiará Eduardo Campos no segundo turno, e por isso já está sendo utilizada a lógica do “voto útil” pelos estrategistas do PSB/Rede. Por esse raciocínio, será mais fácil unir as oposições caso Campos passe para o segundo turno do que em favor de Aécio Neves.

A presidente Dilma já deu mostras de que, se pudesse, se livraria da aliança com o PMDB, mas por enquanto a abrangência da rede eleitoral que o PMDB montou pelo país ainda é atraente para uma eleição que promete ser disputada. Acima disso, porém, estão os quatro minutos de televisão que o partido detém por ter a segunda maior bancada de deputados federais eleita em 2010.

Fonte: O Globo

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