• O maior impacto veio do ramo de veículos, que recuou 36,3% em um ano
• Desempenho industrial brasileiro teve retração de 6,9% em relação a junho de 2013, informa o IBGE. Na área de bens de capital, importante indicador de investimentos no país, o tombo foi de 21,1%
Indústria em marcha a ré
• No quarto mês de recuo, produção cai 6,9% em junho, a maior queda desde 2009
Lucianne Carneiro – O Globo
-RIO E SÃO PAULO- Os sinais de fraqueza da indústria brasileira se mostram cada vez mais nítidos. A produção registrou em junho o quarto mês seguido de retração e caiu 6,9% frente a junho de 2013, no ritmo mais intenso desde o recuo de 7,4% em setembro de 2009. Dos 26 ramos pesquisados pelo IBGE, 21 reduziram sua produção. Frente a maio, o indicador caiu 1,4%. Quase 70% dos produtos encolheram o nível de produção. Nos primeiros seis meses do ano, a produção despencou 2,6% frente ao primeiro semestre de 2013.
Mais que o perfil disseminado de taxas negativas, no entanto, há preocupação com os investimentos: a produção de bens de capital teve perda de 9,7% frente a maio e 21,1% na comparação com junho de 2013, esta última a mais intensa desde agosto de 2009 (-22,4%). No segundo trimestre, a queda foi de 15%, frente a igual período do ano passado. A produção de bens duráveis também se destacou e registrou o maior tombo da série histórica, de 24,9% frente a maio.
Em relação a junho de 2013, o recuo foi de 34,3%, o mais intenso desde dezembro de 2008, em plena crise mundial.
— O investimento deve ser a principal contribuição negativa no Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre pelo lado da demanda. A produção de bens de capital e de insumos para construção civil veio ruim, o que é sinal de investimento muito fraco no segundo trimestre — afirma o economista Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria.
CONFIANÇA EM BAIXA
O Bradesco projeta recuo dos investimentos no segundo trimestre nos dados do PIB, frente a igual período do ano passado, em algo entre 5% e 6%.
— O calcanhar de Aquiles é a categoria de bens de capital, que depois de cair 3,8% em maio, recuou 9,7% em junho. É um resultado ruim para a economia e desanimador em termos de investimento — aponta o economista-chefe do ABC Brasil, Luis Otavio de Souza Leal.
O cenário delicado para os investimentos é influenciado pelos baixos níveis de confiança da indústria: a sondagem da Fundação Getulio Vargas (FGV) registrou em julho a décima queda seguida e atingiu o menor nível desde abril de 2009.
A confiança em baixa também influencia a indústria como um todo, somada a fatores como nível de estoques acima do usual, evolução menor da demanda doméstica, cenário adverso no exterior, entrada de produtos importados e maior restrição na concessão de crédito, segundo o gerente da Coordenação de Indústria do IBGE, André Macedo. Em junho, a atividade foi atingida ainda por um fator extra: a Copa, que levou a feriados e reduções de jornada de trabalho.
— São quatro meses de resultado negativo, mas é claro que a magnitude da queda (-1,4%) tem relação com a Copa do Mundo. Há influência de todos aqueles fatores que vem pontuando a indústria.
— O desempenho seria ruim de qualquer forma. Mas a intensidade tem um pouco de efeito calendário, sim — diz o economista Aloísio Campelo, coordenador de sondagens conjunturais do Ibre/FGV.
Quando se olha para as atividades, a maior influência para o desempenho negativo da indústria vem do segmento de veículos automotores, que caiu 12,1% frente a maio e 36,3% na comparação com junho de 2013. As quedas foram as mais intensas desde dezembro de 2013 e dezembro de 2008, respectivamente.
O resultado negativo é reflexo de recuos na produção de caminhões (45,4%) e de automóveis (35,1%), mas Macedo destaca que este não é um movimento isolado: cerca de 80% dos produtos deste segmento tiveram taxas negativas.
Analistas esperam alguma reação na produção nos próximos meses, mas isso não deve ser suficiente para evitar um recuo em 2014. Tendências, LCA Consultores e ABC Brasil são algumas das instituições que preveem queda. Pelo Boletim Focus, que reúne cem projeções de analistas de mercado, a estimativa é de retração de 1,15% da indústria este ano.
— Esperamos uma melhora entre agosto e dezembro e estimamos uma queda de 2% em 2014, mas pode ser maior. O quadro geral não é bom, não dá para apostar em melhora contundente da produção — diz Bacciotti.
EMPRESAS CORTAM INVESTIMENTOS
A Associação Brasileira de Máquinas (Abimaq) associa a reversão da queda na curva de produção a “ajustes profundos” que deverão ser feitos pelo próximo governo, para que os investimentos voltem a crescer.
— O ajuste no câmbio, para dar competitividade, e o reajuste nos preços administrados, por exemplo, serão inevitáveis, seja qual for o governo — disse Mário Bernardini, assessor econômico da Abimaq.
A perspectiva é ainda mais pessimista no setor de vestuário (que teve recuo de
10% em junho, de acordo com o IBGE). De acordo com Roberto Chadad, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Vestuário (Abravest), a falta de política industrial de longo prazo está acabando com o segmento de confecção no país:
— Está cada vez mais vantajoso fabricar na Ásia. Um dia, não muito longe, não teremos mais produção de vestuários no Brasil. Tudo virá do Oriente.
A Gerdau, maior produtora de aços longos das Américas, anunciou na quarta-feira corte de R$ 500 milhões, de R$ 2,9 bilhões para R$ 2,4 bilhões, em seus investimentos deste ano. Em nota, citou “o cenário de volatilidade de resultados vivenciado pela indústria do aço” para explicar a redução. No primeiro trimestre, a AmBev também revisou sua estimativa de investimentos este ano, que ficarão abaixo
dos R$ 2,8 bilhões de 2013. l
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