• Até agora, Aécio manteve-se a salvo dos duros golpes de Dilma. Restam ainda nove dias de campanha eleitoral, nos quais a pancadaria pode se tornar ainda mais intensa.
Correio Braziliense
A luta (Companhia das Letras), de Norman Mailer, com 232 páginas, é um daqueles pequenos livros de tirar o fôlego. Uma obra-prima do jornalismo e, ao mesmo tempo, um belo exemplar da literatura norte-americana. É também um case de gerenciamento de crise e uma lição de marketing político. A edição brasileira é uma tradução de ninguém menos do que Cláudio Abramo. Trata-se, na verdade, de uma grande reportagem sobre aquela que foi chamada a luta do século passado, pois essa história se passou há 40 anos. É a seguinte:
Muhammad Ali era o campeão mundial dos pesos-pesados, mas perdeu o título porque se recusou a lutar no Vietnã. Em 1974, o empresário Don King, que era o mandachuva do boxe norte-americano, ofereceu-lhe uma chance de recuperar o título, que então pertencia a George Foreman. Seria numa luta monumental, que aconteceria em Kinshasa, a capital do Zaire. Mailer foi cobrir essa luta. Acompanhou os treinamentos e narrou com brilhantismo seus detalhes.
A ferocidade de Foreman, a resistência de Ali, o furor da mídia, a confusão política que o Zaire evocava, a rivalidade entre os dois lutadores e o ânimo do chamado córner de cada lutador — tudo foi descrito, inclusive a disputa política subjacente entre Ali, que era um contestador, e Foreman, o representante do establishment norte-americano. Na terceira pessoa, o narrador coloca-se como personagem, um torcedor a favor de Ali, mas que não acreditava na sua vitória contra Foreman.
Quem quiser assistir à luta pode recorrer ao YouTube, onde há um excelente documentário, mas o que interessa aqui é a estratégia adotada por Ali. Foreman era um lutador fabuloso, no auge de sua forma e prestígio, a lógica era ser o vencedor. Ao contrário de todas as lutas anteriores, nas quais procurara nocautear os adversários nos primeiros assaltos, Ali preparou-se para uma luta longa, na qual precisaria resistir aos potentes socos do adversário. Passou oito assaltos junto às cordas, protegendo-se com esquivas, clinchs e a guarda muito fechada. Quando Foreman cansou de tanto bater, no oitavo assalto, Ali provocou o adversário enraivecido e depois reagiu de forma fulminante: meia dúzia de golpes levaram o dono do título à lona (https://www.youtube.com/watch?v=XGukWJPtA_c).
O embate eleitoral
O segundo turno das eleições presidenciais lembra a luta no Zaire. Não só por causa do debate de terça-feira na TV Bandeirantes, verdadeiro pugilato, mas em razão também do contexto eleitoral, que inclui os programas de tevê e rádio dos candidatos, suas entrevistas e a participação enlouquecida das respectivas torcidas nas redes sociais. Aécio Neves (PSDB) conseguiu chegar ao segundo turno e lidera a disputa, com a presidente Dilma Rousseff (PT) em empate técnico. Na pesquisa Datafolha divulgada ontem, o tucano tinha 51%, contra 49% da petista, considerando apenas os votos válidos. A pesquisa foi feita na terça-feira e ontem.
Considerando-se os votos nulos e brancos, porém, ambos perderam um ponto. Aécio tem 45%; Dilma, 43%. Na pesquisa anterior, ambos tinham um ponto a mais. Os votos nulos e brancos oscilaram de 4% para 6%. Os indecisos continuam sendo 6% dos eleitores. Tanto o tucano quanto a petista têm 42% de votos consolidados; os demais ainda podem mudar. A queda de um ponto percentual está dentro da margem de erro, mas pode ser um indicador de que a pancadaria entre os candidatos no horário eleitoral e nos debates está surtindo o efeito de desgastar a ambos. Parece um jogo de perde-perde.
Não é bem isso, porém, o que está na cabeça do marqueteiro de Dilma, João Santana, que optou por uma linha focada na imagem do candidato Aécio, contra o qual a petista desfere ataques pessoais com propósitos demolidores. Repete-se a estratégia adotada contra Marina Silva, cuja candidatura era a favorita em todas as pesquisas de segundo turno e chegou a liderar o primeiro, mas foi esvaziada na semana de campanha antes do primeiro turno. A ordem é golpear Aécio até o tucano desabar, atacando sobretudo a gestão dele em Minas Gerais, cujo governo deixou com 92% de aprovação. Mas isso foi há mais de quatro anos…
Até agora, Aécio manteve-se a salvo dos duros golpes de Dilma, mesmo quando é levado às cordas, graças à guarda fechada e a boas esquivas. Restam ainda nove dias de campanha eleitoral, nos quais a pancadaria pode se tornar ainda mais intensa. O candidato tucano apresenta-se mais preparado para esse tipo de confronto do que Marina estava no primeiro turno, mas vai depender de muita musculatura para resistir aos novos ataques nos próximos dias. E precisará reunir forças para desferir meia dúzia de golpes certeiros contra Dilma se quiser chegar ao dia da eleição como favorito.
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