• Qual o modelo para avançar na inclusão social e crescer a produtividade ao mesmo tempo?
- O Globo
Um espectro ronda o Brasil, o espectro do enigma. Decifra-me ou te devoro, diz, como a Esfinge de Tebas. As recentes eleições tentaram acertar as contas entre o passado e o presente, mas deixaram a visão do futuro em aberto. Eleições muito estranhas, em que vitoriosos estão na defensiva política e derrotados sentem-se empoderados com a conquista de quase 50% dos votos. Muitos veem um pais dividido.
Na minha opinião, em relação aos grandes temas da campanha, ocorreu o contrário. A sociedade e a cidadania deixaram claro o recado sobre o passado e o presente: a estabilidade macroeconômica e das regras acordadas é exigência, quem miná-las será eleitoralmente punido. A contínua inclusão social é uma exigência em uma sociedade desigual como a nossa, quem não priorizá-la será eleitoralmente punido.
Restam grandes questões, também do passado e do presente: como acelerar o fim da iniquidade social (educação, saneamento básico, desigualdade absurda de renda)? Como elevar a poupança e o investimento? Qual o modelo para avançar na inclusão social e crescer a produtividade concomitantemente? Questões difíceis e aqui há muita divisão, diferenças, mas, se estamos de acordo sobre as perguntas, a história saberá construir seus caminhos.
Mas, e o novo? O século XXI? Minha impressão sobre as ultimas eleições é que nesse caso houve grande desequilíbrio entre oferta e procura. A maioria dos eleitores mais contundentes nessa demanda naturalmente optou pelo candidato da oposição, outra parcela deles ainda manifestou esperança de que a “mudança” venha pelo campo há quase 12 anos no poder.
Mas qual mudança, que transformação? E por que sentimos que a procura por ela é tão intensa, profunda e permanente? O que gritavam as manifestações de 2013? O que são os “20 centavos”? O que é o desejo majoritário por “mudança” expresso em todas as pesquisas feitas no período eleitoral?
Santo Agostinho, muitos séculos antes da teoria da relatividade, teve um insight genial sobre a existência de diversos tempos, sobre sua não linearidade: “Existe o tempo presente das coisas presentes, o tempo presente das coisas passadas e o tempo presente das coisas futuras.”
O desejo de mudança, de transformação, que a sociedade brasileira insiste vigorosamente em pôr na agenda, é diferente da obrigação de avançar nas tantas e importantíssimas questões não resolvidas do passado ou nos desafios do presente.
O desejo de transformação diz respeito ao tempo presente das coisas futuras. Há um enigma no ar, uma demanda pela transformação da própria essência da civilização brasileira, e quem achar que é possível descartá-lo olhando pelo retrovisor será devorado. Se eu sei a resposta? Não. Tenho lido boas sugestões na imprensa, tenho uns palpites e, principalmente, o Roberto DaMatta andou dizendo umas coisas aqui ao lado, neste espaço que muito me honra voltar a frequentar.
Sérgio Besserman Vianna é economista
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