sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Merval Pereira - Ministério de segunda

- O Globo

O Ministério que a presidente Dilma está montando tem membros de 1ª e 2ª categorias. No grupo de elite, aqueles que vão lidar com as questões econômicas e os que comporão a assessoria direta no Palácio do Planalto, houve critério definido pelo menos em parte pela capacitação profissional e a confiança pessoal.

Para os demais ministérios, prevaleceu a influência partidária sobre a meritocracia, estabelecendo-se uma distribuição de cargos a medíocres e, sobretudo, uma repetida baixa transação que gerou escândalos como o mensalão e o petrolão, e um governo sem alma e sem rumo. O 1º movimento teve o objetivo de recuperar a confiança das forças do mercado, e o anúncio de Joaquim Levy para a Fazenda atingiu o objetivo. O retorno de Nelson Barbosa, agora como chefe do Planejamento , e a manutenção de Alexandre Tombini no Banco Central não tiraram o brilho da equipe econômica, mas deixaram a sensação de que a qualquer momento Dilma pode querer recuperar o controle da área. Dilma se cercou dos seus de maneira que não fez no 1º mandato.

Mercadante, confirmado como o capitão do time, mais forte do que nunca no Gabinete Civil, e Miguel Rosseto, no lugar de Gilberto Carvalho na Secretaria-Geral da Presidência, fortalecem a retaguarda de Dilma, mesmo contra o gosto de Lula. Nos demais cargos, pode ser que a lealdade política e a experiência administrativa tenham sido os critérios que prevaleceram, pois Cid Gomes, Jaques Wagner , Eduardo Braga e Gilberto Kassab já governaram estados e cidades importantes , mas nem sempre com sucesso. Mas é inegável que Dilma se esmerou em colocar as pessoas erradas em lugares-chave, como Cid Gomes (PROS) na Educação, contra sua vontade, elogiando-lhe o bom senso.

Até hoje, a única coisa que se sabe sobre sua expertise na área foi a frase em que, criticando professores em greve, disse que deveriam dar aula por amor , e não por dinheiro, e os que quisessem ganhar melhor que fossem para as escolas privadas. Jaques Wagner na Defesa é dar mais valor a sua fama de bonachão bom de conversa do que a seus dotes políticos, já que é uma área pacificada. Gilberto Kassab (PSD) nas Cidades é um prêmio ao fiel parceiro que criou dois partidos para minar a oposição, mas não uma solução se levarmos em conta o desempenho na prefeitura de São Paulo.

Para ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação, a escolha de Aldo Rebelo, que apresentou projeto de lei para proibir a "adoção, pelos órgãos públicos, de inovação tecnológica poupadora de mão de obra", mostra aonde chegaremos em termos de inovação tecnológica. O ministério que deveria ser responsável por políticas de ponta na pesquisa e de inovação nas universidades e na indústria vai ser ocupado por um comunista que se vangloria de sua "devoção ao materialismo dialético como ciência da natureza" que, por isso , considera que as denúncias de aumento da temperatura global são produto de um "cientificismo " que pretende "controlar os padrões de consumo dos países pobres".

É esse o homem que vai comandar as informações ao IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), órgão da ONU que controla as medidas para enfrentar o problema. Há prêmios para derrotados na eleição de outubro (o filho de Jader Barbalho vai para a Pesca, Armando Monteiro, para o Desenvolvimento), há o aumento da influência do PMDB, que passou de cinco para seis ministérios e trocas inusitadas. No Esporte, o PCdoB que já fazia história na área, ocupando-a há 12 anos , perdeu o lugar para o PRB às vésperas das Olimpíadas de 2016 no Rio. Se fosse para dar lugar a um especialista na área ou pelo menos a um representante do Rio, ainda haveria uma explicação.

Mas quem vai para a vaga é o radialista, apresentador de TV e teólogo George Hilton, de Minas, aliado de Marcelo Crivella e nulo na área que comandará. A mudança do ministro das Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, para as Comunicações ainda não está confirmada, mas é vista pelo PT como a reafirmação de que o que chamam de "democratização da mídia" será uma prioridade no segundo mandato de Dilma. Por enquanto , ainda se trata apenas de uma pressão de alas radicais petistas para amenizar o caráter claramente de centro-direita do Ministério e poder dizer que, como o ex-presidente Lula sugeriu, as negociações do novo governo terão que ser "pela esquerda ".

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