– O Estado de S. Paulo
A briga pela apropriação das fatias do bolo produtivo é normal em toda sociedade. Mas, neste momento vivido pelo Brasil, ela se acirra e tende a empurrar o governo para práticas pouco racionais.
Quando a economia cresce e, com ela, quando cresce a renda, a distribuição do bolo fica mais fácil, mesmo quando alguns poucos se apropriam de fatias maiores do que as dos outros. Mas quando a economia encolhe e o bolo encolhe junto com ela, a distribuição fica bem mais complicada. As pessoas não entendem por que recebem menos ou, então, por que o salário acaba antes do fim do mês e a briga fica mais feroz.
A greve dos caminhoneiros é um desses conflitos distributivos carregados de irracionalidade. Até agora não ficou claro o que pretendem eles. Claro, querem fretes mais altos, pedágios mais baixos, diesel mais barato, juros mais camaradas nos financiamentos para compra de caminhões… e por aí vai. Só que o frete tem de ser negociado caso a caso com o dono da mercadoria carregada. O governo não tem como meter sua colher nesse trato que não lhe cabe.
Talvez se possa conseguir um pedágio mais baixo, como no caso dos caminhões vazios ou dos eixos não utilizados na rodagem, mas não é corte de custos que refresque a vida do caminhoneiro. Dos combustíveis, sim, poderia ser exigida uma derrubada de preços de pelo menos 40%, porque a cotação do petróleo permite isso.
No entanto, depois das lambanças feitas na Petrobrás, o governo está concentrado agora na recuperação do caixa da empresa. Porém, os negociadores dos caminhoneiros (que aparentemente não têm liderança) aceitaram a promessa feita pela Petrobrás de que o diesel não será reajustado para cima nos próximos seis meses, como se essa fosse uma solução.
A impaciência a cada parada de trem ou de metrô em São Paulo, as manifestações gratuitas quase sempre sem proposta, os quebra-quebras que acontecem do nada – tudo isso irradia insatisfação com a vida cada vez mais dura, com o dinheiro curto e as promessas não cumpridas pelo governo.
Ao longo dos últimos anos, o consumidor foi empurrado para o endividamento, para a compra de casa própria, do carro e de aparelhos domésticos tudo com redução de impostos. Agora, enfrenta três comedores de salário. O primeiro deles é a inflação que corrói o poder aquisitivo; o segundo é o juro escorchante; e o terceiro é o início do aperto da oferta de emprego e, com ele, a necessidade de aceitar um salário mais baixo. Numa economia com alta rotatividade da mão de obra, esse último fator tem relevância e vai pesar cada vez mais.
O governo Dilma parece ter assumido a necessidade de virar esse jogo. Durante a campanha eleitoral, prometeu festa e vida boa. Está acontecendo o contrário. A frustração é a consequência natural dessas falsas promessas.
Agora é hora de reconhecer que é preciso apertar os cintos e aguentar mais sacrifícios. E, principalmente, de acenar com novo horizonte que justifique a temporada de privações.
Falta saber se, entalada em suas ambiguidades, a presidente Dilma conseguirá liderar a travessia do Brasil nesta temporada de crise.
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