- O Estado de S. Paulo
Está prevista para esta terça-feira a retirada do selo de “sigiloso” que limita a divulgação de informações nos contratos de financiamento pelo BNDES a exportações brasileiras de engenharia para Cuba e Angola. Na mesma ocasião em que o ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, anunciará a desclassificação dos documentos, colocados sob sigilo pelo então ministro Fernando Pimentel, sob a alegação de se tratar de exigência dos países financiados, será comunicado que o BNDES está tornando disponível, em seu site na internet, informações antes restritas de todos os contratos de financiamento celebrados pela instituição, exceto os chamados repasses automáticos, operados por bancos privados.
Também está prevista para a tarde de hoje a divulgação pelo banco do primeiro Relatório de Efetividade de suas operações. Com dados de 2007 a 2014, o relatório trará informações novas, ao lado de outras já conhecidas, mas agora atualizadas, sobre os impactos sociais e econômicos do seu apoio financeiro a empresas, nas diversas modalidades em que opera. “Embora já divulgue um vasto conjunto de informações sobre suas operações, e agora passe a reforçar as avaliações dos seus impactos, o BNDES passará a fornecer, em formato mais amigável para consulta, o valor de cada contrato, sua duração, a taxa de juros cobrada e as garantias envolvidas”, antecipou à coluna o diretor de Planejamento do banco, João Carlos Ferraz.
A abertura de informações agora empreendida vem na esteira de uma série de embates do governo com a oposição no Congresso e também com órgãos de fiscalização, em torno da transparência dos negócios do BNDES. Recentemente, a presidente Dilma vetou artigo de lei aprovada no Legislativo que determinava a divulgação irrestrita de condições de seus contratos de financiamento, com o argumento de que haveria quebra constitucional de sigilo bancário e empresarial.
Com o mesmo raciocínio, o próprio BNDES, temeroso, segundo diretores, de descumprir normais legais, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para não enviar ao Tribunal de Contas da União (TCU) informações sobre contratos específicos. Em resposta, o STF determinou a abertura das informações.
Situado entre os maiores bancos de desenvolvimento do mundo, o BNDES tem uma singular posição no conjunto de seus pares. Sua carteira de financiamentos é menor, em relação ao PIB, do que, por exemplo, a de grandes congêneres, como o chinês CDB e o alemão KfW. Mas, quando a comparação é com o volume de crédito disponível na economia, o BNDES aparece disparado como o campeão. Ele responde por 21% do total, ao passo que o banco japonês JFC não vai além de 1,7%, o chinês se limita a 7,7% e o alemão fica em 12,7%. Essa peculiaridade tem a ver com o menor volume de crédito em relação ao PIB que o sistema financeiro brasileiro consegue oferecer e isso fica ainda mais gritante quando se verifica que o BNDES é o responsável por dois terços dos financiamentos concedidos no Brasil com prazo acima de 5 anos.
Acusado de não desenvolver por conta própria mecanismos de concessão de crédito de longo prazo, o setor privado rebate, acusando o BNDES de competir com ele, ao oferecer condições excepcionais e subsidiadas de crédito, inclusive a empresas que, em teoria, poderiam se financiar no mercado. “Ao emprestar a empresas que não precisam de seus recursos, o BNDES não tem cumprido o seu papel, que é o de apoiar setores e empresas de fato necessitados”, disse o economista Sergio Lazzarini, professor do Insper e estudioso do BNDES.
É preciso observar, na prática, se o esforço de “disclosure” será suficiente para dissolver as acusações de que o banco se tornou uma “caixa-preta” de negócios e de interesses não declaráveis. A dúvida procede porque parte da pressão pela transparência e das críticas à ação do BNDES reflete uma velhíssima disputa política entre correntes econômicas sobre o papel que deve ser desempenhado por um banco de investimento estatal.
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