- O Estado de S. Paulo
Essa história de que o ato oficial da passagem do presidente da Câmara para a oposição é uma “posição pessoal” do deputado Eduardo Cunha serve como versão para esfriar temperaturas, mas não é um fato. O fato político importante está retratado numa imagem registrada na antevéspera: os presidentes da Câmara e do Senado ao lado do vice-presidente da República comunicando à Nação que o PMDB terá candidato ao Planalto na próxima eleição presidencial.
Isso é uma coisa, outra diferente é a suspeita que pesa sobre o presidente da Câmara e o risco de que ele venha a ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República por envolvimento no esquema de corrupção na Petrobrás. Trata-se, pois, de um caso de polícia.
Na maneira como formalizou seu rompimento com o governo, fez gestos imediatos de retaliação usando prerrogativas do cargo e apontou a existência de uma conspiração entre a PGR e o Planalto para prejudicá-lo, o deputado misturou as estações. Atropelou o roteiro do rompimento preparado pelo PMDB e tentou arrastar a Câmara e o partido para sua defesa. Neste aspecto pode colher mais distanciamento que solidariedade.
Nele reside, e se resume a ele, o significado da expressão “posição pessoal”. Não se estende ao sentimento oposicionista dentro do PMDB como se viu pela cena da cúpula anunciando seus planos para a próxima eleição.
Nada demais se a última não tivesse ocorrido há menos de um ano, quando o mesmo PMDB ajudou a reeleger Dilma Rousseff. A falta de cerimônia com que o partido debate a sucessão da presidente expõe o mais absoluto desdém – para não dizer desrespeito – em relação ao mandato em curso. O gesto equivale a dizer que para os pemedebistas o governo Dilma, na prática, já terminou.
Seria o mesmo que Marco Maciel saísse falando, nove meses depois da reeleição de Fernando Henrique Cardoso, que o PFL teria candidato a presidente em 2002. Ou que José Alencar anunciasse, a menos de sete meses do início do segundo mandato de Lula, a intenção de seu partido disputar o poder com o PT em 2010.
Sob qualquer ângulo que se olhe essa atitude não pode ser vista como coisa de quem está perfeitamente integrado à base aliada, conforme afirma a nota oficial de sexta-feira, redigida para dar a impressão de que Eduardo Cunha fala sozinho. O texto não esclarece evidentemente, mas a referência subliminar é ao caso de polícia, não à questão política. Quanto a esta, tanto não falou só que dois dias antes o presidente do PMDB anunciava que o partido vai disputar a Presidência.
E se vai disputar não será apenas contra adversários hoje na oposição, mas também contra o grupo político que detém o poder maior. Ou seja, está se colocando desde já na condição de oponente do governo. Isso tem nome: é oposição.
Eduardo Cunha só fez pronunciar a palavra em público e, assim, antecipou em dois meses o início do desembarque do PMDB já devidamente marcado para o congresso que o partido vai realizar em setembro próximo, onde será aprovada a candidatura própria para 2018. A partir daí começaria o ritual, cujo ápice _ a saída dos pemedebistas dos ministérios _ estava em princípio previsto para logo depois das eleições municipais.
Agora, no entanto, o cenário ficou mais imprevisível porque a ideia inicial seria romper sem brigar, de preferência devagar de modo a que da campanha eleitoral do ano que vem o partido ainda estivesse no comando dos ministérios que ocupa.
Que o PMDB é oposição não se discute. A dúvida é como o partido vai se equilibrar entre a sustentação ao presidente da Câmara e a necessidade de manter distância regulamentar de escândalos em nome do projeto de disputar a Presidência em 2018.
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