- O Globo
Bem que o vice-presidente Michel Temer avisou que "não devemos discutir esse tema", referindo-se aos ataques mútuos de golpismo entre a presidente Dilma e o presidente do PSDB, senador Aécio Neves. Temer justificou a cautela com uma explicação, digamos assim, patriótica: "Nós temos que pensar no Brasil, fazer uma grande unidade nacional".
Mas Dilma, mesmo de longe, lá da Rússia, não resistiu a bater boca com o líder da oposição e seu mais direto adversário no momento atual, a quem derrotou na eleição presidencial de 2014. Dizia-se de Sarney, quando ia para o exterior, que "a crise viajou". Ou que, com Fernando Henrique, a crise chegava grande e saía pequena do Palácio do Planalto. Já Dilma não dá trégua à crise, faz questão de alimentá-la mesmo no exterior.
O fato de Aécio ter considerado "arrogante" sua reação à hipótese de ter seu impeachment decretado, em decorrência de decisões do TCU ou do TSE, significa para ela que o líder tucano está "prejulgando" a decisão dos tribunais, considerando como certo que eles a condenarão. "É estranho que prejulguem. Estranho que se trate como se tivesse havido uma decisão, quando não houve decisão alguma", disse Dilma.
Embora tivesse afirmado que não ficaria "discutindo quem é e quem não é golpista", não resistiu e mordeu a isca: "Quem é golpista mostra na prática as suas tentativas, que começam por prejulgar uma instituição".
A presidente Dilma, mais uma vez, trouxe para si a questão do impeachment, o que muito deve ter alegrado os oposicionistas, que tiveram, assim, palco para suas críticas. No plenário do Senado, onde tem sido muito atacado por aliados do governo depois que em um ato falho disse ter sido reeleito "presidente da República", e não do PSDB, Aécio repetiu várias vezes que Dilma "está fora de si" e desafiou a presidente a demonstrar que ele havia incentivado qualquer tipo de golpe.
O fato político do dia passou a ser o bate-boca internacional entre uma presidente que deveria estar cuidando dos Brics, para mostrar que está em plena capacidade de governar, e o senador que preside o principal partido de oposição, candidato a sucedê-la.
A tarimba de Michel Temer neste momento deveria servir de para-raios para a presidente, e só não serve porque ela se recusa a seguir seus conselhos. Ao mesmo tempo, a velha raposa peemedebista incluiu em sua frase, como presidente em exercício, um chamamento à unidade de todos os partidos, o que só se conseguirá com um governo de conciliação nacional. Que, em teoria, ele teria condições de comandar caso o TCU enviasse para o Congresso um sinal de que as contas do último ano do primeiro governo de Dilma são impossíveis de aprovar.
No momento, há uma tentativa de levar a questão das "pedaladas" e outras irregularidades cometidas para o Congresso, sem que o TCU se pronuncie drasticamente contra, ou pelo menos sem rejeitar as contas formalmente.
Políticos ainda ligados ao governo negociam para que o governo faça um mea-culpa, comprometendo-se a não se utilizar mais de tais recursos, que o TCU considera ilegais. Se o clima político em agosto, porém, estiver em ebulição, com a economia se deteriorando, o desemprego aumentando, e os efeitos sendo sentidos pela população cada vez mais, as manifestações contra o governo Dilma podem ganhar uma dimensão política que pressione tanto o TCU quanto o Congresso.
A questão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é mais complexa, pois existem já irregularidades constatadas, como gráficas fantasmas e outras firmas que teriam ajudado na campanha eleitoral sem condições de provar os gastos que tiveram.
Além disso, o relatório que a Polícia Federal elaborou sobre doações de campanhas de alguns senadores da base governista mostra que "existem elementos iniciais suficientes que indicam a tipicidade da doação eleitoral como forma de corrupção".
O Supremo Tribunal Federal (STF) já foi avisado dessas "suspeitas contundentes" com base em comprovantes de movimentação bancária, e-mails e registros de entrada na sede da Petrobras.
Também o empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, foi autorizado pelo STF a depor no processo do TSE sobre doações com dinheiro desviado da Petrobras para a campanha de Dilma em 2014, como se fossem legais.
Não estou prejulgando ninguém, não me entendam mal. Mas a situação da presidente Dilma está complicada no TSE. Como ela diz que "é moleza" sair dessa, vamos aguardar, sabendo que cassar o mandato de um presidente da República não é uma banalidade, exige provas robustas e clima político propício.
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