Apesar de o governo esperar a recuperação da economia em "questão de meses", os dados negativos não param de chegar. Na divulgação da queda de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre, a indústria de transformação e o investimento registraram encolhimento pelo oitavo trimestre consecutivo. O próprio PIB diminui há cinco trimestres seguidos. Os números mais recentes indicam que o terceiro trimestre não está melhor. A produção industrial de julho voltou ao patamar de seis anos atrás. A fabricação de veículos teve em agosto o pior resultado em uma década.
O agravante da situação atual é a veloz deterioração do mercado de trabalho, que desencadeia a redução do consumo e abate a produção. O consumo das famílias completou quatro trimestres seguidos de queda no fim do primeiro semestre, pela primeira vez em 11 anos. O impacto foi bastante visível nos resultados da indústria em julho, quando a produção tanto de alimentos quanto de bebidas caiu 6,2%. As vendas de produtos de primeira necessidade só declinam em situações de mercado de trabalho deteriorado. Se a tendência se aprofundar pode prejudicar inclusive o setor agropecuário, que vem revelando melhor desempenho.
A produção da indústria como um todo recuou 1,5% em julho sobre junho, quase três vezes mais do que a previsão mais pessimista, acumulando queda de 8,9% sobre julho de 2014 e de 5,3% em 12 meses. No setor de bens de capital, que sinaliza as perspectivas de investimento, a queda foi de 1,9% da no mês e de nada menos do que de 27,8% na comparação com julho de 2014. Só houve aumento da produção de bens de consumo duráveis, de 9,6%, insuficiente para compensar o tombo de 13,7% de junho.
Estoques elevados, demanda interna fraca, perda do poder de compra das famílias e a crise política, que passa pelas investigações da Operação Lava-Jato, são os fatores que afetam a economia. Nem a apreciação cambial garante algum fôlego dada a perda de espaço da indústria brasileira em um mercado internacional cada vez mais competitivo. O maior impacto positivo do câmbio se dá pelo encarecimento do produto importado, que abre espaço ao similar nacional.
Outros dados reforçam o enfraquecimento da indústria. A utilização da capacidade instalada chegou a 78,6% na virada do primeiro para o segundo semestre, o pior nível da série histórica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), iniciada em janeiro de 2003. A produção industrial de agosto medida pela Markit caiu 3% sobre julho. As consultas ao BNDES, sinalizador de investimento, diminuíram 47% no primeiro semestre em comparação com o mesmo período de 2014. Esses dados embalam constantes revisões para baixo do PIB deste ano. O boletim Focus, do Banco Central, divulgado ontem, registra o oitavo corte consecutivo, que leva a 2,44% a contração esperada para este ano. Essa é a mediana das projeções e há estimativas bem piores na praça.
As previsões mais dolorosas são referentes ao mercado de trabalho. Dados do Caged, do Ministério do Trabalho, mostram que foram cortados 547,4 mil postos formais de janeiro a julho, o pior resultado desde o início da série histórica em 1992, e a previsão é de que o número chegue a 1 milhão no fim do ano. A Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios Contínua (Pnad), que abrange quase 3,5 mil municípios, registrou desemprego de 8,3% no segundo trimestre; já na Pesquisa Mensal do Emprego (PME), também do IBGE mas referente a seis regiões metropolitanas, a taxa chegou a 7,5% em julho.
Nas residências, o consumo de energia teve a maior queda em julho dos últimos dez anos. Em agosto, diminuiu a intenção de compras das famílias medida pela Fecomercio-SP, pelo décimo mês consecutivo; a atividade do varejo medida pela Serasa diminuiu 1,1%; e os indicadores de confiança do comércio e dos serviços apurados pela FGV, que também servem para monitorar o humor das famílias, caíram 4,1% e 4,7%, respectivamente.
A previsão é que as famílias continuarão reduzindo o consumo nos próximos meses diante da expectativa de aumento do desemprego e dos efeitos defasados da desaceleração sobre o mercado de trabalho. Até agora não há sinal seguro de reversão das expectativas negativas, exceto no setor exportador. Há uma crise de confiança que só será debelada com ações claras de política econômica, que estão em falta.
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