O Globo
Mesmo que, como tudo indica, resolva- se burocraticamente a polêmica do decreto assinado pela presidente Dilma transferindo para o Ministério da Defesa poderes dos comandantes militares, restará uma questão política delicada: por que a secretária- geral do ministério, a petista de raiz Eva Maria Chiavon, decidiu dar vida ao decreto quando o ministro Jaques Wagner estava em viagem à China, e sem consultar o ministro interino, o comandante da Marinha, almirante Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que aparece no Diário Oficial como tendo assinado o decreto, mas garante que nunca o fez?
Acontece que Eva Maria Chiavon é casada com Francisco Dalchiavon, o principal executivo do MST, número 2 de João Pedro Stédile, encarregado de negociar a produção das cooperativas, e essa ligação está fazendo com que parte dos militares desconfie que o objetivo do decreto não era transferir tarefas burocráticas para o Ministério da Defesa, mas, sim, interferir na formação dos oficiais das três Armas.
Isso porque o art. 4 º do texto revoga o decreto n º 62.104, de 11 de janeiro de 1968, que delegava “competência aos ministros de Estado da Marinha, do Exército e da Aeronáutica para aprovar, em caráter final, os regulamentos das escolas e centros de formação e aperfeiçoamento respectivamente da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica militar”.
Ao revogar o decreto de 1968, essa função passaria automaticamente para o Ministério da Defesa. O decreto polêmico atual provocou muita discussão interna nas Forças Armadas, e mesmo a solução que parece mais viável, a de o ministro da Defesa Jaques Wagner delegar aos comandantes das Armas as tarefas que eles já executavam, provoca perguntas inevitáveis: se era apenas uma questão burocrática, por que juntamente com o decreto não foi divulgada também a delegação de funções?
Os burocratas envolvidos na questão assinalam que está definido no decreto que ele somente entrará em vigor 14 dias depois da publicação, tempo suficiente para fazer as delegações de funções. Antes da criação do Ministério da Defesa, havia os ministérios militares e um decreto que delegava competência aos ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica para funções que até então eram do presidente da República.
Com o Ministério da Defesa, os comandantes de Força continuaram fazendo as mesmas coisas, já que eram delegações típicas de tarefas do dia a dia de cada Força. Esse novo decreto de agora faz com que o que estava sendo exercido pelos comandantes seja transferido para o ministro da Defesa, o que é um equívoco brutal, porque são matérias burocráticas, na avaliação dos militares.
Mas nem tanto, pois entre esses poderes estão promoção aos postos de oficiais superiores; designação e dispensa de militares para missão de caráter eventual ou transitória no exterior; nomeação e exoneração de militares, exceto oficiaisgenerais, para cargos e comissões no exterior criados por ato do presidente da República; poder de transferir para reserva remunerada oficiais superiores, intermediários e subalternos, bem como a reforma de oficiais da ativa e da reserva e de oficial- general da ativa, após sua exoneração ou dispensa de cargo ou comissão pelo presidente da República.
O poder político que o ministro da Defesa acumularia seria enorme, pois hoje cada comandante de Força atua em seu determinado campo. Quando o decreto começou a circular nos meios militares, atribuiu- se a essa concentração de poderes a sua intenção, mas, ao identificar que o ensino e a formação dos militares poderiam ser enfeixados nas mãos do ministro da Defesa, começou a paranoia de que a esquerda petista estaria tentando avançar sobre a formação de oficiais.
Os militares receberam a informação “com surpresa” e estão buscando uma forma de reverter o decreto. Pode ter sido apenas mais uma trapalhada do governo, sem maiores objetivos escondidos. Mas pode também ser uma tentativa de aparelhamento do ensino nas escolas e centros de formação militares.
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