• Há um limite para a deterioração econômica, política, social e institucional?
- O Estado de S. Paulo
A situação do País é de extrema gravidade e, no entanto, a maior parte dos atores políticos age como se nossos problemas fossem menores e facilmente equacionáveis. A política termina se reduzindo a uma equação medíocre dos maiores e menores benefícios que certos políticos e partidos possam obter, como se o Brasil pudesse suportar infinitamente a duração dessas contendas. Acontece que quanto mais decisões forem postergadas, maiores serão seus efeitos perversos no futuro. Há limites que não deveriam ser ultrapassados, mas o jogo político é feito como se tudo fosse possível e permitido.
Parece tornar-se um consenso que o País não pode suportar mais três anos do atual governo, incapaz de reconhecer os seus erros e persistente no desconhecimento das causas que nos levaram a esse buraco. Ou seja, o País não aguenta esperar até o final de 2018, sob pena de que, nesse longínquo futuro, os problemas a serem enfrentados se tenham tornado ainda mais graves. Decisões corretas hoje tomadas certamente abreviarão o sofrimento futuro; decisões não tomadas ou equivocadas só aprofundarão a quebra de expectativas, a frustração e, mesmo, o enfraquecimento institucional do Brasil. Crises sociais têm repercussões políticas e institucionais.
Contudo, paradoxalmente, os atores políticos agem como se o fundo do poço ainda não tivesse sido atingido. É como se dissessem: “O País ainda pode aguentar mais!”. A resposta sensata seria: até quando? Ou: qual é o limite? Ou ainda: será que há um limite para a deterioração econômica e política, a desagregação social e o enfraquecimento institucional?
Infelizmente, nossos vizinhos, nossos “hermanos” ou nossos “companheiros”, na linguagem petista e na de nossa diplomacia terceiro-mundista, mostram que a decadência pode não ter limite. O lixo ideológico acompanha essa mentalidade atrasada.
A Argentina pode ser o símbolo do Brasil amanhã. Economia totalmente desarrumada, indicadores econômicos falsificados, crise social, miséria, desrespeito ao Estado Democrático de Direito, censura, falta de liberdade de imprensa e dos meios de comunicação em geral e um populismo esquerdista desenfreado. De próspero país no passado, tornou-se uma paródia de si mesmo. E isso com a total conivência dos governos petistas que não cessaram de apoiar os Kirchners e, em particular, a atual presidente. Nossa presidente gosta de aparecer publicamente com Cristina Kirchner, mostrando uma afinidade para lá de eloquente.
A Venezuela, ícone de nosso esquerdismo decadente, é mais um símbolo da deterioração da esquerda e do populismo. Rica em petróleo, tornou-se um país de inflação descontrolada, desabastecimento e queda de renda da população em geral. O Estado apropriou-se do mercado e da sociedade. Mais especificamente, numa política de fazer inveja ao Lenin e ao Stalin de antanho, seu governo, “socialista”, se caracteriza por perseguir a oposição, usar milícias para aterrorizar a população e todos os que dele ousam demarcar-se. A violência e a mentira tornaram-se meros instrumentos da “arte de governar”, como se assim a “promessa bolivariana” pudesse ser implementada.
Seu fracasso salta aos olhos. A democracia está lá em frangalhos, dando lugar, cada vez mais explicitamente, à ditadura. E o atual governo brasileiro é conivente com as flagrantes violações dos direitos humanos e dos processos democráticos! O ex-presidente Lula chegou a dizer, em seu apoio ao finado presidente Hugo Chávez, que havia “democracia demais” naquele país. Retrospectivamente, faz todo o sentido!
Torna-se evidente que a atual mandatária já não governa, tendo abdicado de equacionar os problemas nacionais. O ajuste fiscal nada avançou, o PIB só afunda, o desemprego desponta, a inflação aproxima de dois dígitos... e o governo permanece no total imobilismo! O discurso da ilusão, amplamente utilizado no marketing eleitoral do ano passado, não funciona mais. A presidente já deu suficientes mostras de que não consegue liderar o País e levá-lo a porto seguro. Está perdida nos problemas comezinhos da política atual, incapaz de fazer um gesto que possa fazer o Brasil sair de sua difícil situação.
Uma vez que é incapaz de fazer esse gesto, seja mediante nova política de unidade nacional, seja por meio de sua própria renúncia, apresenta-se como uma saída deste impasse que se inicie o processo de impeachment. A sua irresponsabilidade administrativa e fiscal é patente, além de sua omissão diante de todos os desmandos na Petrobrás e de seu aparelhamento partidário. Tal processo sinalizaria que o País não suporta mais permanecer num poço sem fundo e que poderia vislumbrar outro futuro.
Acontece, porém, que a atual governante, seu criador e o seu partido se aferram a seus privilégios e interesses mais imediatos, como se os “trabalhadores” e os brasileiros em geral fossem sem nenhuma importância. São meros instrumentos de uma narrativa ideológica, como se apenas isso fosse uma garantia de alguma competitividade eleitoral para 2018. O País também não suporta mais tal narrativa.
O início do processo de impeachment está nas mãos do presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, que, por sua vez, tudo faz apenas para sobreviver, tentando conservar seu mandato. Todos os seus passos são calculados em função dessa única finalidade. O País, também para ele, parece não ser o objetivo maior. As provas materiais de seu envolvimento com a corrupção parecem ser robustas e as chances de preservação de sua atual posição se esvaem conforme transcorre o tempo. Queira ou não, termina, apesar de si, fazendo o jogo da presidente e do PT. O impasse continua, as posições ficam congeladas e o País continua refém desse jogo.
Urge sair de tal impasse e que, num gesto de grandeza, o deputado se ponha em sintonia com a imensa maioria da população brasileira. Sairia por cima, como se diz em linguagem popular. Tiraria o foco de si mesmo e obrigaria o País a fazer um novo jogo, o de assegurar o seu futuro.
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*Professor de Filosofia na UFRGS;
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