• País perde se Planalto desistir de medidas estruturais
- Valor Econômico
Preparando terreno para iniciar 2016 com maior capacidade de reação, a presidente Dilma Rousseff encerrou o ano passado mudando a equipe econômica, numa tentativa de estancar as crises que minaram o primeiro ano de seu segundo mandato. Enquanto Congresso e Judiciário permanecem em recesso, deixando a retomada das discussões sobre o processo de impeachment para fevereiro, agentes do mercado e líderes de partidos aliados acompanham com atenção a execução do plano e seus potenciais efeitos de médio e longo prazos.
Dilma acolheu uma das principais demandas do PT e assinou a exoneração do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, na expectativa de obter um maior apoio nas ruas contra o impeachment. A frente popular liderada pelos movimentos que integram a base social petista já vinha protestando contra o afastamento da presidente, mas tinha também como palavras de ordem o "Fora, Levy" e o fim do ajuste fiscal.
A mudança de Nelson Barbosa do Ministério do Planejamento para a Fazenda também deve reaproximar Dilma dos segmentos da iniciativa privada que esperam do Estado incentivos e uma nova onda de políticas anticíclicas, reencontro que terá dia e hora marcados quando o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social for reinstalado no Palácio do Planalto. O evento, previsto para o fim do mês, deve servir de palco para o governo anunciar medidas voltadas à recuperação econômica.
A edição da medida provisória que regulamenta acordos de leniência entre o setor público e empresas que praticam atos de corrupção também atendeu a pedidos das centrais sindicais e empresários. A iniciativa beneficiará as empreiteiras atingidas pela Operação Lava-Jato, cujas investigações, segundo as contas do governo, tiveram impacto negativo relevante sobre o Produto Interno Bruto (PIB) e o emprego. Em paralelo, o Executivo anunciou o reajuste do salário mínimo, do Bolsa Família e tenta retomar um contato mais estreito com governadores.
A presidente sabe que precisará do apoio dos movimentos sociais, quando o impeachment voltar a ser discutido no Supremo Tribunal Federal (STF) e avançar no Parlamento. O plano inicial dos articuladores do Planalto era "enterrar" o processo o mais rápido possível, com a eleição de uma maioria confortável na comissão que analisará preliminarmente o pedido de afastamento da presidente e rápida mobilização da base aliada para evitar surpresas no plenário da Câmara.
Mas, como sempre, o governo não conseguiu ser ágil o suficiente para evitar o prolongamento de uma crise. Após ser surpreendido na eleição da comissão especial da Câmara, viu-se obrigado a recorrer ao Supremo. Obteve decisões favoráveis no julgamento que definiu o rito do processo, mas a disputa judicial acabou adiando o desfecho do caso.
A oposição, por sua vez, decidiu correr o risco e apostar num recrudescimento da crise enfrentada pelo governo, caso o processo de impeachment chegue a um momento crucial num período do ano em que a economia e o mercado de trabalho apresentem ainda maiores retrações. Espera com isso, numa espécie de reedição da estratégia adotada durante o escândalo do mensalão de "deixar o governo sangrar", uma maior pressão popular em favor do fim do mandato de Dilma.
Na época do mensalão a economia estava num momento muito mais favorável do que o observado hoje, mas vale lembrar que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se recuperou, reelegeu-se e emplacou a sucessora. A oposição pode sofrer o mesmo revés agora. No fim do ano, pesquisa Datafolha registrou uma leve recuperação da avaliação do governo. Após atingir 71% em agosto, a reprovação da administração Dilma diminui por duas sondagens seguidas e retornou ao patamar de 65%.
De qualquer forma, a conta já começa a chegar para o Planalto. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) reforçou sua posição contra a redução de benefícios sociais. Os movimentos sociais do campo também criticam a redução da estrutura do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na reforma administrativa anunciada pelo governo. A frente promete retomar as manifestações favoráveis a Dilma em março, mesmo mês em que o PMDB realizará o encontro em que discutirá o desembarque da coalizão governista.
Ao mercado, porém, o que o Palácio do Planalto parece disposto a oferecer limita-se a um discurso mais homogêneo na área econômica. Se isso não deixa os investidores plenamente satisfeitos, ponderam autoridades do Executivo, pelo menos a nova formação do governo pode dar maior previsibilidade em relação às políticas a serem adotadas daqui em diante.
Tão logo assumiu o Ministério da Fazenda, Barbosa apressou-se a fazer pronunciamentos buscando reduzir as desconfianças do mercado em relação aos rumos da política econômica. Reafirmou o compromisso com o equilíbrio fiscal e assegurou a disposição do governo de enviar ao Congresso reformas estruturantes, como mudanças na Previdência Social. A ideia foi defendida na sequência pelos ministros do Planejamento, Valdir Simão, da Casa Civil, Jaques Wagner, e do Trabalho e Previdência, Miguel Rossetto. A própria Dilma respaldou em público tal intenção, complementando que a reforma ajudaria o país a garantir a sustentabilidade da economia.
A medida não agrada os movimentos sociais tradicionalmente ligados ao PT, mas seria bem recebida pelos mercados. Os papéis se invertem quando a pauta é a retomada da expansão da oferta do crédito, algo frequentemente defendido pelo ex-presidente Lula. O desafio do governo é demonstrar aos investidores e partidos aliados que de fato busca a retomada do crescimento e a recuperação da economia a longo prazo, e não apenas melhorar a percepção da população em relação à conjuntura a fim de aumentar sua sustentação política no Congresso e criar as condições necessárias à vitória do candidato do PT na eleição presidencial de 2018.
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