quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Eliane Cantanhêde: Estocando vento

- O Estado de S. Paulo

O grande risco do tal “novo PAC” é virar mais uma peça de marketing, dessas que fazem muito barulho ao serem lançadas para serem esquecidas logo depois, ao longo do ano e do mandato, como ocorreu com a nova reforma administrativa que não deu em nada. Ou o pacote pode virar um novo vídeo hilário do YouTube, uma farinha de mandioca, um vento não estocado ou, simplesmente, pura espuma para inglês, empresário, trabalhador e Câmara (que vota o impeachment) verem.

Segundo o Estado de ontem, Dilma planeja com o ministro da economia, Nelson Barbosa, e com o ministro da política, Jaques Wagner, um pacote superambicioso para recuperar a economia, mas... sem abandonar o ajuste fiscal. Taí, essa é intrigante. O governo vai investir para tirar a indústria do buraco, mas vai investir o quê? De onde vem o dinheiro? Dos Estados, que estão no osso? Só se for das reservas internacionais, o último reduto a resistir bravamente aos tempos Dilma. Ainda...

A ideia de Barbosa para a economia é aquecer a produção industrial, que esfria mês a mês, dramaticamente, jogando emprego e renda na geladeira e congelando qualquer expectativa de recuperação da economia. E a de Wagner para a política, na mesma linha, é usar o pacote para tentar atrair o apoio de “cima”, dos empresários, e de “baixo”, dos trabalhadores. As duas pontas estão umas onças com Dilma, umas araras com PT, Lula e umas feras com todos eles juntos.

Tudo preparado, Dilma presidirá antes do carnaval uma reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico, que tenta pôr na mesma mesa ministros, empresários, representantes de entidades e da sociedade, mas só quando convém ao governo. Lula e Dilma estão em alta? Esqueça-se o Conselhão. Estão em baixa? Convoque-se o Conselhão. Anunciado o pacote, estaria pronto o discurso da “união nacional”, arma que o governo engatilha contra o processo de impeachment que corre na Câmara.

O script parece caprichado, mas nem os antecedentes nem as condições ajudam a convencer de que dará certo. Dilma se lambuzou de petróleo com Lula ao prometer fazer da Petrobrás um paraíso. 

Virou um inferno. Dilma fez pronunciamento na TV alardeando queda histórica da conta de luz. A conta disparou. Dilma fez outro pronunciamento comemorando a redução dos juros na marra. Eis que os juros estão na estratosfera (e devem subir mais...).

Já no segundo mandato, a presidente anunciou corte de oito ministérios e de 3.000 cargos comissionados. O gato comeu. E lá foi ela comemorando o Pronatec

Aprendiz, mas, escaldada, não se comprometeu: “Não vamos colocar meta. Vamos deixar a meta aberta, mas, quando atingirmos a meta, vamos dobrar a meta”.

Quanto à boa ideia de priorizar a construção civil, setor que é altamente empregador de mão de obra: há condições para isso? Está tudo parado, ninguém quer comprar, ninguém quer construir. Parou por quê? Por que parou? Porque o emprego está em risco, a renda caiu e o setor produtivo só investe se tem motivação, segurança e juros acessíveis. Convenhamos, não é o caso. Não é solenidade no Planalto, um rol de intenções e um discurso politiqueiro que vão reverter isso.

Então, o pacote precisa ser bem pensado, amarrado e confiável, sem dobrar meta que não existe, sem obrigação de “estocar vento” e sem prometer transformar espuma em esperança e reuniões palacianas em garantia de emprego.

Além do risco de ser vento, meta sem meta e pura espuma, há um outro bastante forte: Dilma jogar fora o ajuste de Joaquim Levy, que nunca chegou ao destino, por um desajuste de Nelson Barbosa, que, por enquanto, é só uma ameaça no ar. Como diagnostica o deputado oposicionista José Carlos Aleluia, “estão trocando o ajuste pelo desajuste”. Tomara que não...

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