• Em e-mail, operador do grupo indica contas do partido a empreiteira
Delatora da Carioca Engenharia também relatou pagamentos em espécie a assessor do ex-governador que está preso; repasses ilegais aos acusados que seriam chefiados por Cabral somam R$ 28 milhões
E-mail apreendido pela Operação Calicute, que prendeu Sérgio Cabral, mostra que Carlos Miranda, operador do ex-governador, indicou contas do PMDB para que a Carioca Engenharia depositasse propina em forma de doação eleitoral em 2010. Dias depois, foram transferidos R$ 300 mil ao partido. Em delação, uma executiva da empreiteira contou que entregava dinheiro em espécie a Miranda. Delatores relataram repasses de R$ 28 milhões ao grupo político.
Propina em forma de doação
• E-mail mostra que operador de Cabral indicou a empreiteira conta do PMDB para depósito
Dimitrius Dantas, Gustavo Schmitt e Juliana Castro - O Globo
RIO E SÃO PAULO - E-mail anexado ao processo da Operação Calicute, que levou o ex-governador do Rio Sérgio Cabral à prisão, revela que Carlos Emanuel de Carvalho Miranda, o Carlinhos, apontado como operador de Cabral, indicou contas do comitê financeiro do PMDB para que a Carioca Engenharia fizesse repasses ao partido camuflados na forma de doações eleitorais. A história foi revelada à Lava-Jato pela executiva da Carioca, Tânia Maria Silva Fontenelle, em delação premiada. O e-mail foi apresentado como prova pela própria executiva, quando a empreiteira fechou acordo de leniência.
Tânia foi responsável pelo setor financeiro da empresa e, segundo os procuradores do Ministério Público Federal, era responsável pelos repasses de propina da empresa. Ela já havia dito que entregava desde 2008, mensalmente, R$ 200 mil a Carlinhos. Afirmou ainda que no segundo mandato do peemedebista a mesada passou para R$ 500 mil.
No e-mail enviado dia 13 de setembro de 2010, Carlinhos repassa os números das contas em que Tânia deveria depositar valores para o comitê financeiro do PMDB do Rio. Nove dias depois, em 22 de setembro, a Carioca fez uma doação de R$ 100 mil na conta do comitê do PMDB. No dia seguinte, a empresa repassou mais R$ 200 mil ao partido. A empresa já havia feito um repasse de R$ 130 mil à legenda em 20 de agosto de 2010.
Segundo os investigadores, os repasse denotam “vantagens indevidas”. Executivos da Carioca revelaram à força-tarefa da Lava-Jato o pagamento de cerca de R$ 28 milhões de propina ao grupo político de Cabral ao longo dos últimos anos.
No documento em que pediu a prisão preventiva dos acusados, o MPF afirmou que, após a quebra de sigilo dos e-mails de Carlinhos, não encontrou mensagens de Tânia ou da Carioca Engenharia. “A demonstrar que o representado (Carlos Miranda) apagou as mensagens, possivelmente com intuito de destruir provas”, afirmaram os procuradores.
No e-mail apresentado pela própria executiva da Carioca Engenharia, Carlinhos pede a Tânia permissão para passar seu contato a três outras pessoas. Posteriormente, envia outra mensagem em que avisa da mudança da conta do partido: “Tânia, recebi nesse instante a informação que a conta do partido que deve ser creditada mudou. Desculpe a confusão. Você pode corrigir a informação e me confirmar se será feito até segunda?”.
Os procuradores também encontraram trocas de e-mails e ligações entre Carlos Miranda e familiares de Cabral, inclusive seus filhos. Não há relatos, entretanto, de ligações entre ambos. De acordo com os procuradores, foram encontradas no e-mail de Miranda mensagens que indicam que o homem de confiança de Cabral utilizava aplicativos de comunicação criptografadas, que impedem a leitura de pessoas não autorizadas.
O PMDB fluminense se pronunciou por meio de nota do presidente estadual, Jorge Picciani. Ele informou que, à época, não presidia a legenda nem era responsável pelo comitê financeiro, “por isso não tem como se pronunciar sobre esta questão”. A nota não responde as acusações feitas pelo MPF sobre a colaboração da então executiva da Carioca e de suas denúncias de possível pagamento de propina ao comitê financeiro do PMDB do Rio.
Em seu depoimento, Tânia também disse aos procuradores que a empreiteira comprou vacas superfaturadas da empresa de agropecuária Agrobilara. Os donos da empresa são o presidente da Alerj e seus filhos, o ministro do Esporte, Leonardo Picciani, e o deputado estadual Felipe Picciani. O objetivo das compras, segundo a delatora, era “gerar dinheiro em espécie" para o caixa 2 da empreiteira.
No acordo de leniência celebrado com o MPF, executivos da Carioca revelaram que Cabral e Wilson Carlos, seu ex-secretário de governo, recebiam propina em troca de contratos firmados com o estado. O funcionamento de esquema semelhante também foi relatado à Lava-Jato por executivos da Andrade Gutierrez.
Tânia afirmou que, a pedido de acionistas e diretores da Carioca, realizou operações financeiras para gerar dinheiro em espécie e fazer pagamentos de propina. Segundo o depoimento da então diretora da empresa, o dinheiro vivo era obtido por meio do superfaturamento de contratos de empresas prestadoras de serviços e pela celebração de contratos fictícios, de modo que os serviços não eram prestados.
Nas investigações contra Cabral que correm no Rio, o Ministério Público Federal indicou um pagamento de propina ao diretório nacional do PMDB, em forma de doação oficial. O repasse foi feito não pela Carioca, mas pela Andrade Gutierrez, segundo a Lava-Jato. Ex-executivos da empresa detalharam em delação premiada as cobranças de propina, quase sempre de 5% do valor das obras, feitas pelo ex-governador.
“Como demonstração do efetivo pagamento da propina exigida, o MPF junta em seu requerimento imagem do Recibo Eleitoral / Eleições 2010 - que materializou o pagamento de 2 milhões de reais em favor do PMDB - Diretório Nacional, pela construtora ANDRADE GUTIERREZ, pagamento este que, como afirmam os colaboradores, foi objeto de negociação criminosa entre a empresa e a Organização Criminosa ora investigada, capitaneada pelo então Governador de Estado Sérgio Cabral”, diz o MPF em documento em que pediu a prisão do ex-governador.
As delações dos ex-executivos da Andrade Gutierrez e as colaborações feitas por meio do acordo de leniência da Carioca estão entre os elementos usados pelos procuradores da força-tarefa da Lava-Jato para pedir a prisão do ex-governador. No acordo de leniência, a Carioca falou sobre fatos ilícitos envolvendo o PAC das Favelas e Arco Metropolitano. Além de Tânia, outros funcionários que aderiram ao acordo contaram que entregavam o dinheiro a Carlos Miranda e Carlos Bezerra. Eles disseram saber que os dois eram homens de confiança de Cabral.
De acordo com as investigações, Miranda e Bezerra faziam depósitos e pagavam despesas para parentes do ex-governador.
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