- Folha de S. Paulo
De cabeça raspada e usando o uniforme verde de presidiário em Bangu, o ex-governador Sérgio Cabral deve estar arrependido de não ter disputado a cadeira de senador nas eleições realizadas em 2014.
O peemedebista tinha força para ser eleito. Sob a proteção do foro privilegiado no STF (Supremo Tribunal Federal), provavelmente estaria, como parlamentar, usufruindo de luxo, conforto e riqueza no Rio e em Paris.
Pela Constituição, um congressista só pode ter a prisão decretada se for pego em flagrante de crime inafiançável — como foi o caso do então senador Delcídio do Amaral, detido por obstrução da Justiça há um ano.
Cabral não foi preso em flagrante. Foi alvo de prisão preventiva autorizada por dois juízes, Sergio Moro, em Curitiba, e Marcelo Bretas, no Rio.
Moro, em sua decisão, argumentou que o peemedebista deveria ir para a cadeia, entre outros motivos, por causa da "notória situação de ruína das contas públicas" do Estado.
"Constituiria afronta permitir que os investigados continuassem fruindo em liberdade do produto milionário de seus crimes", afirmou o juiz.
As investigações apontam que a propina desviada de obras públicas do Rio bancou Cabral e sua família, incluindo vestido de festa, conta de gás e até cachorro-quente para a festa de aniversário do filho.
Enquanto o ex-governador se acostuma com a nova casa em Bangu, mais de 60 inquéritos que investigam congressistas na mesma Lava Jato tramitam lentamente no STF. Há na lista vários políticos do PMDB de Sérgio Cabral, entre eles o presidente do Senado, Renan Calheiros.
Uma série de reportagens na Folha tem mostrado o efeito da letargia dos casos no Supremo. Um terço das ações concluídas nos últimos dez anos foi arquivado em razão da prescrição dos crimes. Em apenas 3,5% dos processos houve condenação.
A prisão de Cabral e a de Eduardo Cunha após perder o mandato na Câmara provam a urgência de rediscutir o sistema de foro no Brasil.
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