• Por 6 votos a 3, Supremo mantém Renan à frente do Senado; Temer, FH e Sarney articularam solução
Apesar de ter sido desafiado por Renan Calheiros, o STF decidiu mantê-lo no cargo de presidente do Senado, mesmo sendo réu, impedindo apenas que assuma eventualmente a Presidência da República. O julgamento ocorreu 24 horas após a inédita decisão do Senado de desobedecer à liminar do ministro Marco Aurélio Mello que ordenava o afastamento imediato de Renan do posto. A crise deflagrou operação em que o presidente Temer e os ex-presidentes FH e José Sarney se empenharam em convencer ministros do STF a apoiar a solução que acabou vencedora. O Planalto comemorou, certo de que agora conseguirá aprovar emenda que limita gastos públicos.
Solução negociada
• Com articulação de Temer, FH e Sarney, STF mantém Renan na presidência do Senado
Renata Mariz, Evandro Éboli, Simone Iglesias, Cristiane Jungblut, Eduardo Barreto e Manoel Ventura - O Globo
BRASÍLIA - Após uma mobilização política dos principais partidos que apoiam o governo, com envolvimento direto do presidente Michel Temer e dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e José Sarney, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu manter o réu Renan Calheiros (PMDBAL) na presidência do Senado. A alternativa construída, e aprovada por seis dos nove ministros presentes à sessão de ontem do STF, foi apenas proibir Renan de assumir interinamente a Presidência da República. O presidente do Senado está na linha sucessória, mas a substituição é vedada a quem responde a processo penal, como é o caso do senador alagoano.
Por seis votos a três, o Supremo derrubou a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, que, em caráter liminar, determinara o afastamento de Renan da presidência do Senado. Os votos nesse sentido foram puxados por Celso de Mello, que costuma votar no final, antes do presidente da Corte, pela condição de mais antigo do tribunal. Na sessão de ontem, porém, ele pediu para ser o primeiro a se manifestar, após Marco Aurélio. Celso de Mello anunciou uma mudança no voto que havia dado no julgamento de ação que discute se réus podem ocupar cargos na linha sucessória do presidente e que ensejou a liminar contra Renan.
CELSO DE MELLO RETIFICA VOTO
Em 3 de novembro, Celso de Mello havia votado “integralmente” com Marco Aurélio, para proibir réus em cargos que estão na linha sucessória, embora tenha feito ressalvas na argumentação. A ação chegou a uma maioria no plenário, com placar de seis a zero, antes de ser retirada da pauta por um pedido de vista de Dias Toffoli. No julgamento de ontem, Celso de Mello disse que releu o voto e pediu a retificação para ficar registrado que, embora réus sejam proibidos de ocupar a Presidência, não devem sofrer perda imediata do cargo. O ministro negou que tenha havido acordo para salvar Renan e argumentou que fez um voto técnico:
— Um absurdo (existência de acordo), de modo algum. Os fundamentos dos votos dos ministros foram muito claros, estritamente técnicos e institucionais.
Seguiram a linha de Celso de Mello os ministros Teori Zavascki, Luiz Fux, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, presidente do Supremo. Em defesa da saída automática de Renan, votaram Edson Fachin e Rosa Weber, além de Marco Aurélio.
— O perigo de dano e resultado do processo não se faz presente, porque o STF, por 6 votos a 0, já afastou a possibilidade de o presidente do Senado assumir a Presidência da República — ressaltou Fux.
Lewandowski salientou que a possibilidade de Renan assumir é remota:
— Não há nenhuma indicação de que o presidente do Senado tenha de substituir o presidente da República num futuro próximo.
Já Fachin defendeu a saída de Renan:
— O presidente do Senado não pode ser presidente do Senado e não deter a prerrogativa de substituir o presidente da República. Referendo o afastamento tal como concedido pela liminar.
Apesar das adesões, Marco Aurélio saiu derrotado e não poupou os colegas. Ao apresentar seu voto, afirmou que manter Renan no cargo, mas proibindo-o de assumir a Presidência, seria um “jeitinho” da Corte, lembrando que Eduardo Cunha foi afastado por decisão unânime, o que representaria tratar o caso com “dois pesos, duas medidas”.
— A qualquer momento, ausente o presidente da República ou da Câmara dos Deputados, tomará assento como chefe de governo, de Estado, num verdadeiro deboche institucional, o senador Renan Calheiros — afirmou.
Marco Aurélio também criticou o “poder” creditado a Renan, apontado pela defesa no Senado como peça fundamental para garantir a aprovação do pacote econômico pendente no Congresso. Dirigindo-se à presidente do Supremo, Cármen Lúcia, Marco Aurélio disse:
— Se diz que, sem ele, e a essa altura está sendo tomado como um salvador da pátria amada, não teremos a aprovação de medidas emergenciais visando combater um mal maior, que é a crise econômica e financeira.
O Palácio do Planalto comemorou a decisão do STF. Preocupado com a paralisia da votação de matérias do ajuste fiscal, como a PEC do teto de gastos públicos, o presidente Michel Temer se mobilizou para tentar uma solução alternativa à liminar de Marco Aurélio, que retirava Renan do poder.
Temer chamou Renan ao Planalto na terça-feira à tarde. Começou, então, a ser discutida alternativa para não afastar Renan do cargo, sem desrespeitar o preceito de que réu não pode estar na linha sucessória da Presidência da República.
Cúpulas do Senado, do PMDB e do PSDB, ex-ministros do STF, e os ex-presidente da República José Sarney e Fernando Henrique passaram a atuar junto a ministros do STF, em apelo para que não se ampliasse o clima de instabilidade política no país, com o afastamento de Renan. O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, foi ao STF e se reuniu com o decano Celso de Mello.
Anteontem quando viajou para um evento em São Paulo, Temer levou no voo o presidente do PSDB, Aécio Neves; os ministros tucanos José Serra (Relações Exteriores), Bruno Araújo (Cidades) e Alexandre de Moraes, além de parlamentares. Na viagem, discutiu-se uma saída que não representasse uma derrota de Marco Aurélio. Em São Paulo, as articulações continuaram, e, quando o grupo retornou a Brasília, a solução intermediária, de manter Renan no comando do Senado e fora da linha de sucessão, estava sacramentada.
GOVERNO DESTACA PAPEL DE VIANA
Desde o início, a preocupação foi não desmoralizar o ministro Marco Aurélio, mas deixar claro que uma decisão monocrática, em caráter provisório, abriria um precedente perigoso, de acordo com interlocutores do presidente. Na avaliação do governo, o fato de Celso de Mello ter pedido para fazer o primeiro voto, apresentando a solução intermediária que acabou prevalecendo, foi uma forma de mostrar que a saída tinha a concordância da Suprema Corte.
O governo também considerou que o gesto do petista Jorge Viana, que foi ao STF conversar sobre uma solução ao afastamento de Renan, mesmo sendo o principal beneficiário da medida, colaborou para o ambiente de entendimento.
Renan acompanhou o julgamento em seu gabinete, rodeado de parlamentares. Ele estava tão confiante que nem esperou o fim da sessão para aparecer no Senado. “É com humildade que o Senado Federal recebe e aplaude a patriótica decisão do Supremo Tribunal Federal. A confiança na Justiça brasileira e na separação dos Poderes continua inabalada. O que passou não volta mais. Ultrapassamos, todos nós, Legislativo, Executivo e Judiciário, outra etapa da democracia com equilíbrio, responsabilidade e determinação para conquista de melhores dias para sociedade brasileira”, disse Renan, em nota.
Após o fim da sessão do STF, Temer conversou com Renan por telefone, e sacramentaram a votação da PEC do teto para a próxima terça-feira.
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