- O Estado de S. Paulo
• Fundamental é não vender a ideia de que reforma trabalhista fará aparecer empregos
Um candidato a ministro do Supremo que, apesar de posições no mínimo polêmicas se mantém na disputa, principalmente por seu endosso total à proposta de reforma trabalhista. Um grupo de procuradores do Ministério Público do Trabalho que se adianta e condena a proposta do governo, por considerá-la “inconstitucional” e com poder de fragilizar o mercado de trabalho. Nem bem começou a tramitar a reforma trabalhista de Temer e já está claro o quanto ela é valorizada pelo empresariado e o quanto ela vai enfrentar resistências.
As mudanças no trabalho estão, para o governo Temer, como a reforma da Previdência. Por mais que sejam aparadas e “flexibilizadas”, têm de dar alguns passos antes que o calendário eleitoral inviabilize qualquer debate mais “incômodo”. Claro que não há ilusões de que sua simples aprovação será suficiente, a curto prazo, para garantir a criação de novos empregos, como alguns de seus defensores mais aguerridos querem fazer acreditar: segundo projeções do Broadcast, o contingente de desempregados deve ter aumentado em 3,5 milhões de pessoas, em 2016, e a taxa de desemprego deve ter encerrado o último trimestre bem perto de 12% da população economicamente ativa. Mas, para os empresários, a reforma representa o atendimento a uma das suas principais reivindicações, nos bons e nos maus tempos: a redução do custo do trabalho, que, segundo eles, é essencial para melhorar a competitividade da economia.
Para começar a conversa, vamos tomar como premissa básica que a velha senhora CLT caducou e não combina mais com o mundo do trabalho. Um mundo muito mais fluido e com uma multiplicidade de relações de trabalho, que, na prática, já escapa às amarras da CLT. Dá para enfrentar, por exemplo, a onda da “uberização” apenas brandindo as regras da CLT? A saída, portanto, seria render-se às evidências e deixar a cargo do mercado o estabelecimento de regras, por meio de contratos entre as partes.
A questão, porém, é bem mais complexa do que parece. Trata-se de evitar que a modernização das relações de trabalho se transforme pura e simplesmente em precarização. Ainda mais em momentos sensíveis como o atual, em que empregos são mercadoria em falta, principalmente os chamados empregos “de qualidade”. A proposta do governo prevê, entre outras coisas, a livre negociação de jornada de trabalho entre patrões e empregados, desde que seja respeitado o limite máximo de 12 horas por dia e 220 horas mensais, banco de horas, parcelamento das férias, trabalho remoto, participação nos lucros e resultados e outros itens – sempre com o objetivo de priorizar o entendimento em lugar da legislação. A terceirização, outro ponto importante nesse universo, corre por fora, num projeto já aprovado na Câmara.
Alguns especialistas já fazem ressalvas à nova proposta, mesmo reconhecendo a necessidade – e a inevitabilidade – de uma reforma trabalhista. E o motivo é basicamente o mesmo: o desbalanceamento de forças entre os dois lados da mesa de negociação. Eles chamam a atenção para a fraqueza da estrutura sindical brasileira. São quase 11 mil sindicatos espalhados pelo País, quase 75% deles da área urbana e, ainda assim, com uma minúscula participação no mercado. Muitos de fachada, criados apenas para se habilitar ao benefício do imposto sindical. Mesmo os mais representativos perderam expressão nos últimos anos, e raros são os que atualizaram sua pauta. Para esses especialistas, livre negociação para valer exigiria também uma reforma sindical, que reduza essa pulverização, via, por exemplo, o fim da exigência de uma base territorial exclusiva. Além disso, há o entrave da representação dos trabalhadores dentro das empresas – que, embora prevista na Constituição, não é regulamentada pela CLT e, do jeito que está na nova proposta (só em empresas acima de 200 empregados), continuará pouco efetiva.
O fundamental, contudo, é não vender a ideia de que a reforma trabalhista, como num passe de mágica, fará aparecer os empregos e desaparecer os processos trabalhistas. Nem uma coisa nem outra está no horizonte. Empregos só aparecerão com investimentos. E processos trabalhistas – hoje na casa de 8 milhões – só sumirão com a garantia de segurança jurídica em acordos bem costurados e negociados.
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