Por Raymundo Costa | Valor Econômico
BRASÍLIA - No térreo, o Palácio do Planalto está cercado por soldados da Polícia do Exército. No terceiro andar, onde fica o gabinete do presidente da República, a maior preocupação de Michel Temer é com o cerco dos aliados, especialmente do PSDB. Cauteloso, o presidente, sitiado entre manifestantes e aliados, prefere não tocar publicamente do assunto. Mas Moreira Franco, ministro da Secretaria Geral da Presidência e um de seus mais próximos conselheiros abre o jogo: o lançamento de candidatos à sucessão de Temer é uma "precipitação", até porque a renúncia não é "fato consumado".
Moreira é um dos raros conselheiros do presidente conversar sobre a hipótese da renúncia, assunto que é tratado no palácio como corda em casa de enforcado. "Magalhães Pinto [dono do antigo Banco Nacional, ex-governador de Minas, ex-senador, um dos ícones da política nacional] há muitos anos atrás dizia que o fato político é como nuvem, adquire ao longo da trajetória configuração até estética diferente", diz. "O que vai acontecer, não sei. Hoje não existe [a hipótese da renúncia de Temer]. Em não existindo é uma precipitação, é um açodamento já ficar estimulando candidaturas, nomes de possíveis candidatos".
Aberto sobre a mesa de Moreira Franco está um exemplar da edição de ontem do jornal Valor, na qual se destaca a manchete "FHC, Jobim e Jereissati no páreo para suceder Temer". O secretário-geral da Presidência diz que não quer responder à reportagem ou suas fontes, mas expor o ponto de vista do Palácio do Planalto sobre as origens e previsíveis consequências da discussão sucessória para a economia e a votação das reformas.
"A hipótese da renúncia pressupõe uma eleição indireta", diz, enquanto olha a edição do jornal. "Vocês [o Valor ] hoje dão três nomes ilustríssimos. O próprio Fernando Henrique Cardoso, o Tasso [Jereissati], o Nelson Jobim. Isso pra eles mesmos não é uma boa porque - foi o que eu disse para o Fernando Henrique -, se for eleição indireta, que pode acontecer ou não, eu não vejo como o Congresso eleger alguém que não seja do Congresso".
Sábado e domingo Moreira conversou longamente ao telefone com Fernando Henrique Cardoso sobre "esse problema que estamos vivendo". O ministro conhece o ex-presidente desde o fim da década de 60, quando FHC era uma das estrelas e ele estagiário do Centro Brasileiro de Análise de Planejamento (Cebrap). Também trabalhou na assessoria especial do Palácio do Planalto, nos governos do tucano. Fernando Henrique estava preocupado com os desdobramentos da crise, que ganhara um novo impulso depois do vazamento da delação da J&F.
Moreira Franco fez um relato a FHC do esforço do governo no sentido de criar as condições para que as votações das reformas econômicas continuem tanto na Câmara, onde está pronta para ser votada a reforma da Previdência, quanto no Senado, onde as mudanças na legislação trabalhista aguardam apenas pelo endosso dos senadores. "Isso não é para garantir o governo, é para garantir as mudanças para o Brasil", relata o ministro. Mas nas conversas do fim de semana "eu já disse a ele o que eu vou repetir aqui: Acho uma precipitação, primeiro, já criar um ambiente de fato consumado de renúncia. Isso não existe. Por que não existe? Porque as condições políticas caracterizam evidentemente isso como uma precipitação. Então não existe".
Na ótica de um dos principais conselheiros do presidente Temer esta é uma "crise política que atrapalha barbaramente todo o esforço que está se fazendo para colocar o Brasil nos trilhos". Moreira entende que o país "estava começando" a sair da mais grave crise econômica de sua história, os indicadores já permitiam afirmar que a recessão havia acabado. Tudo graças a um esforço que se mostrou compatível com as investigações da Operação Lava-Jato. O país não parou: o Executivo governou, o Legislativo fez as leis, o Judiciário julgou e o Ministério Público Federal e a Polícia Federal investigaram o que precisava ser investigado.
O ministro diz que não tem informações e costuma ser "muito cauteloso" na análise do fato político e sociológico, mas associa os bons indicadores econômicos que começavam a aparecer à tentativa de se criar um ambiente de crise política de grandes dimensões. "E aí eu vejo que nós temos que ter muita cautela, nós não podemos nos precipitar, porque se nós não resolvermos a situação econômica, nós não vamos conseguir uma solução política adequada do ponto de vista de médio e longo prazo".
Na defesa do mandato de Temer - e da necessidade de o grupo atualmente no governo concluir as reformas -, Moreira insiste que o país precisa de desenvolvimento sustentável. "Desde a década de 50, a cada dez anos, temos uma crise política, as vezes até institucional, por força da não sustentabilidade do nosso crescimento econômico. O PIB cai, gera problema de desemprego, perda de conquistas, queda da renda, de crise financeira e evidentemente pressiona o sistema político".
"Nós temos que entender que a sociedade brasileira não pode mais sobreviver do sobressalto decenal que decorre do desenvolvimento econômico não sustentável". Segundo Moreira, o programa em curso é o que o PMDB apresentou no documento "Ponte para o Futuro" - pejorativamente chamado de pinguela por FHC -, divulgado no fim de 2015, oficialmente um manifesto partidário, na prática os compromissos dos pemedebistas para o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
Na conversa com os políticos aliados e empresários, na tentativa de manter unida a base de sustentação de Temer, o ministro insiste que "a mãe das reformas é a econômica, não a política - não adianta se achar que vai se ter solução política adequada, de organização do sistema político, partidário e eleitoral, se nós não tivermos uma situação econômica confortável, porque a pressão econômica é infinitamente superior à pressão política, partidária e eleitoral". A crise econômica - diz - cria um ambiente ruim para o "debate e a busca de boas soluções institucionais e legais".
O país, afirma o ministro, não pode perder o rumo justamente agora, "o que não significa dizer que tenha que se interromper qualquer processo de apuração e investigação em curso". Mas a crise, ele acredita, "não está "seguindo essa lógica, porque há uma forçação para que ela se transforme numa crise essencialmente política".
A colocação de candidaturas "sem que a hipótese da renúncia tenha sido posta" seria uma prova disso. "É uma precipitação que eu fico até surpreso ao ver que pessoas experientes, vividas, com responsabilidade históricas alimentem tão antecipadamente essa história". A descrição não carece de identificação do personagem - é uma fotografia digital, não precisa de revelação.
"A hipótese de qualquer um de fora do Congresso está afastada", diz Moreira. Ponto dois: eleição é maioria. A maioria é da Câmara". Moreira é sogro de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados e aliado de Temer na crise. O ministro acha difícil a eleição de alguém do Senado. Mas não faz referência ao nome de Tasso, novo presidente nacional do PSDB, que está no páreo.
"É um momento em que você não tem no Senado um varão de Plutarco, uma referência que esteja acima de tudo e de todos, sobretudo do ponto de vista intelectual. Nós não temos, é uma pena. No passado tivemos. Objetivamente eu gosto de todos eles (senadores), admiro muitos deles, mas nós não temos uma figura intelectualmente, sobretudo no campo jurídico - o que seria o caso, normalmente é por ai que essas coisas andam - que cumpra esse papel".
Para os mais afoitos em relação à renúncia de Temer, hipótese de insiste ser falsa, o ministro Moreira Franco faz uma advertência. "A hipótese da renúncia pressupõe uma eleição indireta". Neste caso, o secretário-geral de Temer não vê hipótese de "o Congresso brasileiro eleger alguém que não seja do Congresso. Não existe isso. A hipótese de qualquer um fora do Congresso está afastada". Para Moreira, "eleição é maioria" e a maioria no Colégio Eleitoral de 594 integrantes é da Câmara com os seus 513 deputados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário