Relatório de Bonifácio de Andrada pede rejeição de denúncia contra Temer
Tucano criticou atuação do Ministério Público, da Polícia Federal e do Judiciário e apontou 'desequilíbrio' entre Poderes
Igor Gadelha, Daiene Cardoso e Tânia Monteiro, Daiene Cardoso | O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) apresentou nesta terça-feira, 10, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, parecer pela rejeição da denúncia contra o presidente Michel Temer. Até o momento, porém, o Palácio do Planalto ainda não comentou o relatório favorável ao governo.
Temer e os ministros foram denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por organização criminosa. Segundo o Ministério Público, eles teriam recebido pelo menos R$ 587 milhões de propina dos últimos anos, oriundos de órgãos como Petrobras, Caixa Econômica Federal e Furnas.
O presidente da República também foi denunciado, sozinho, por obstrução de Justiça. Temer teria cometido o crime ao, segundo a PGR, ter dado aval à compra do silêncio do ex-presidente da Câmara e hoje deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e ao corretor Lúcio Funaro, ambos presos.
Em seu parecer, Bonifácio afirmou que ficou claro para ele que a tentativa da PGR de envolver o presidente da República e ministros em crimes de organização criminosa "não encontra respaldo" na denúncia nem tampouco na Constituição. "Dessa forma, não se pode aceitar como criminosos fatos imputados ao presidente da República", disse.
Bonifácio também recomendou rejeição da denúncia contra Temer por obstrução de Justiça. Isso porque, segundo o relator, a gravação da conversa entre Temer e o empresário Joesley Batista,da JBS, que baseiam essa parte da peça, foram realizadas de forma "criminosa", tanto que são alvo de CPI Mista do Congresso.
"Não há nenhuma prova real ou concreta que o presidente tenha tomado providência ou atitude para dificultar investigações", declarou. "Conclui-se pela impossibilidade da denúncia contra o presidente Michel Temer", concluiu.
CRÍTICAS. Em seu voto, o relator disparou duras críticas ao que chamou de "abusos" do Ministério Público. Segundo ele, o MP e o Judiciário se fortaleceram após a promulgação da Constituição Federal de 1988, em detrimento do "nítido enfraquecimento do Poder Legislativo.
Para ele, o Legislativo perdeu, na prática, sua imunidade parlamentar. Ele criticou o fato de os processos contra parlamentares serem hoje analisados pelo Supremo Tribunal Federal, cujas decisões são "impossível politicamente" de serem revistas, por provocarem protestos da mídia e repercussão negativa na opinião pública.
Além dessa "distorção", Bonifácio afirmou que o Congresso Nacional perdeu sua eficiência institucional, o que, na avaliação dele, submete parlamentares às pressões judiciais e o Legislativo a um processo de descaracterização.
"De tal maneira que o Ministério Público hoje, órgão poderoso do nosso sistema, que domina a Polícia Federal, mancomunado com o Judiciário, trouxe para o País desequilíbrio na relação entre os poderes da República", declarou o tucano.
Para Bonifácio, o Ministério Público toma hoje decisões "sérias", que, em razão da repercussão, o dá força muitas vezes até maior do que o do próprio juiz. Nesse cenário, ele avaliou que, não só o Legislativo, mas o presidente da República e os ministros ficam fragilizados em suas competências.
No parecer, o relator disse ainda que o Ministério da Justiça ficou dependente da Polícia Federal, órgão vinculado à Pasta. "Se a polícia tem missão de ordem pública, não pode representar campo teatral para a população", afirmou. Ele disse esperar que "essa concepção policialesca se traduza em posicionamento social e pedagógico".
O relator criticou o que chamou de "criminalização da política" por parte do MP. "É inadmissível que um partido político constitua uma organização para fins criminais. Nota-se, dessa forma, pretensa intenção da Procuradoria de fazer um ataque generalizado aos homens públicos do País, sem distinção", disse.
Em seu parecer, o relator afirmou ainda não encontrar "qualquer espécie de comprovação" de acusações contra os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, ambos do PT, bem como a outras lideranças do PMDB, PP e PT mencionadas pela PGR na denúncia.
RITO. O parecer tem entre cerca de 40 páginas, de acordo com o relator. O tucano disse ter ido dormir às 3 horas da manhã desta terça-feira para conseguir concluir o documento com sua equipe, motivo que o levou a pedir para adiar a leitura do relatório para o período da tarde.
Após a conclusão da leitura do parecer, será a vez dos três advogados de defesa se pronunciarem. Eles terão direito ao mesmo tempo usado pelo relator. O primeiro a falar deve ser o advogado de Temer, seguido pelas defesas de Padilha e Moreira.
A votação do parecer, porém, só começará a partir da próxima terça-feira (17). Isso porque, antes mesmo da leitura do documento pelo relator, parlamentares da oposição pediram vistas (mais tempo para análise) do relatório por duas sessões.
VOTO EM SEPARADO. Como mostrou mais cedo o Estado/Broadcast Político, antes mesmo da apresentação do parecer de Bonifácio, o deputado Major Olímpio (SD-SP) protocolou na CCJ voto em separado sugerindo a admissibilidade da denúncia contra Temer e os ministros.
Sérgio Zveiter (Podemos-RJ) também promete apresentar voto em separado em breve, pela admissibilidade da denúncia. O deputado foi relator da primeira denúncia contra Temer na CCJ. Seu parecer, porém, foi rejeitado pelo colegiado, que aprovou relatório alternativo, do deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), pela rejeição.
Voto em separado é um direito que o parlamentar tem de manifestar por escrito sua posição. Eventualmente o voto individualizado pode ser escolhido para ser colocado em votação, caso o parecer do relator seja derrotado, desde que expresse uma posição contrária.
PLANALTO. Temer e os ministros evitaram fazer qualquer comentário sobre o parecer. Não houve surpresa no Palácio do Planalto em relação ao relatório do deputado tucano, que foi considerado pelo governo justo e correto. Mas a decisão de não comentar segue o ritual adotado na primeira denúncia, mesmo quando o texto de Zveiter foi contrário ao presidente. Temer só se pronunciou, via porta-voz, quando houve a votação do parecer alternativo, favorável a ele. A ideia é repetir o gesto e só comentar depois da aprovação do relatório do tucano pela CCJ.
O presidente não acompanhou a leitura do texto pois estava em audiência em seu gabinete no Planalto. O governo também evitou polemizar com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que voltou a fazer ataques ao Planalto.
No Palácio, a avaliação é de que, nestes momentos, Maia tem tentado se preservar e mostrar sua independência. Auxiliares do presidente comentaram que não havia motivo para o novo estresse causado na tarde desta terça-feira por Maia. Para estes auxiliares, o presidente da Câmara queria votar a MP da leniência, mas toda a mobilização que existia era para a leitura do relatório do parecer da denúncia.
Neste momento, não há previsão de conversas entre Temer e Maia, apesar do estresse. Nestas ocasiões, relembram auxiliares do presidente, a postura de Maia é sempre arredia ao governo.
Durante o dia, mais uma vez, Temer atendeu vários parlamentares, na maratona para derrubar a acusação. Além deles, o presidente teve um encontro com o governador do Acre, Tião Viana (PT), que o convidou para um seminário de combate ao narcotráfico e segurança pública, em Rio Branco, no dia 27 de outubro, lembrando que representantes de todos os demais Poderes já haviam confirmado, assim como os governadores das províncias dos países vizinhos. Temer respondeu que gostaria de estar presente ao encontro, e esta poderá ser sua primeira viagem após a possível derrubada da denúncia, conforme preveem os governistas.
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