- Valor Econômico
Cenário mais provável é o de que o país enfrente seu desafio fiscal sem os contornos de uma crise externa iminente
O que será o amanhã? Como vai ser o meu destino? (Samba enredo O Amanhã, 1978, União da Ilha)
2018 pode vir a ser um ano excelente para a economia brasileira. Mas, ameaçando tal cenário benigno, há grande risco de que a recuperação cíclica ora em curso venha a ser revertida. De que fatores depende tal disjuntiva?
A tabela mostra os cenários mais prováveis para 2018. Cada um dos quatro cenários aventados na tabela representa uma combinação do cenário externo e do cenário interno, para os quais proponho prognósticos bons e ruins.
Para a economia brasileira, os principais fatores de risco no cenário externo são o processo de normalização monetária, ora em curso nos EUA, e o crescimento da China. Claro que outros fatores são também importantes, como o risco geopolítico em áreas como a Coreia do Norte e o Oriente Médio, ou um eventual recrudescimento da crise europeia. Não obstante, a principal fonte de risco para nós seria uma eventual aceleração pelo Fed da alta programada dos juros nos EUA, que teria o potencial de causar fugas de capitais, como em crises passadas. A queda significativa de crescimento da China também causaria grande dano nos preços das exportações de commodities, reduzindo o impulso de demanda e prejudicando nossas contas externas.
Já para o cenário interno, a principal fonte de risco é o quadro fiscal, dado que nossa dívida pública se encontra em trajetória explosiva, sendo imperioso que se façam as reformas requeridas para reverter tal tendência. O bom cenário interno traria a aprovação da reforma da Previdência, no início de 2018, e a viabilização de alguma candidatura comprometida com a agenda reformista. O cenário ruim envolveria a derrota da reforma da Previdência e a continuidade dos candidatos populistas Lula e Bolsonaro na liderança das pesquisas.
A combinação dos dois cenários bons, externo e interno, geraria o cenário 1, no noroeste da tabela. Neste cenário duplamente benigno, observaríamos a retomada do investimento, fomentada por capitais externos, simultaneamente atraídos pela melhor postura fiscal e impulsionados pelas baixas taxas de retorno nos países desenvolvidos. O consumo das famílias continuaria a evoluir favoravelmente, lastreado em expansão de crédito e na retomada do emprego. O câmbio tenderia a se apreciar, mas nossas exportações de commodities continuariam a garantir bons resultados na balança comercial. O crescimento aumentaria e o desemprego cairia mais fortemente. Nesse cenário, seria sentido mais fortemente o impacto positivo da baixa Selic, que tenderia a se estender para as taxas mais longas.
Já a combinação dos dois cenários ruins produziria o cenário 4, no sudeste da tabela. Nessa combinação infeliz, a economia brasileira voltaria a enfrentar o espectro de crises externas, não obstante as condições atuais de altas reservas e estrutura mais robusta do passivo externo. O juro voltaria a subir e a retomada seria interrompida.
Atribuindo probabilidades aos cenários externo e interno e supondo independência dos fatores determinantes de cada um deles, calcula-se a probabilidade de cada cenário resultante. Atribuí 60% de probabilidade ao cenário externo bom e 40% de probabilidade ao cenário interno bom. Daí resultaram as probabilidades de 24% para cada um dos cenários polares 1 e 41.
Nessa configuração de probabilidades, o cenário mais provável seria o cenário 3, a sudoeste da tabela, com 36% de probabilidade, que resulta da combinação do cenário externo favorável com o cenário interno ruim. Nele, a contribuição de uma conjuntura benigna no exterior continuaria a prover condições para a economia brasileira enfrentar seu desafio fiscal sem os contornos de uma crise externa iminente. Não obstante, se, em 2019, quem estiver no Planalto optar por continuar empurrando com a barriga o inexorável ajuste fiscal, a crise vai se tornar inevitável.
Com o otimismo inerente à entrada do novo ano, sinto-me tentado a renegar as probabilidades que eu mesmo propus e eliminar o ponto de interrogação do título deste artigo. Bom 2018!
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Márcio G. P. Garcia, Ph.D. por Stanford, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio,
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