segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Agora, o desafio fiscal de 2018: Editorial/O Estado de S. Paulo

Os primeiros obstáculos importantes à gestão eficiente das contas públicas em 2018 estão localizados no Legislativo e no Judiciário

Com receitas extraordinárias, aperto nos gastos e alguma recuperação do consumo e da produção industrial, o governo deve fechar o balanço fiscal de 2017 dentro dos conformes. O maior desafio – respeitar o limite de R$ 159 bilhões para o déficit primário do poder central – parece ter sido superado até com alguma folga, a julgar pelo resultado de janeiro a novembro, um saldo negativo de R$ 102,70 bilhões pelo critério da Fazenda, ou de R$ 96,27 bilhões pelos cálculos do Banco Central (BC). Mas o tempo para relaxar, se isso for possível, será muito curto. Para alcançar a meta de 2018, novamente um déficit primário de no máximo R$ 159 bilhões, será preciso um corte de uns R$ 26 bilhões em despesas discricionárias, adiantou a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi. A economia adicional será necessária porque providências para reforço das finanças federais estão travadas.

Sem essas medidas, o Executivo terá de recorrer a soluções como redução de verbas para bolsas de estudos, programas de assistência social e investimentos em manutenção de estradas. Entre as providências emperradas estão o aumento de Imposto de Renda sobre fundos exclusivos e a reoneração das folhas de pagamento das empresas. Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, por liminar, o aumento da contribuição previdenciária dos servidores de 11% para 14% e o adiamento do reajuste salarial do funcionalismo para 2019.

Os primeiros obstáculos importantes à gestão eficiente das contas públicas em 2018 estão localizados, portanto, no Legislativo e no Judiciário, instituições com poder para afetar despesas e receitas do setor público e nenhum compromisso, pelo menos aparente, com a gestão eficiente e equitativa das finanças públicas.

Também travado continua o projeto de reforma da Previdência, fundamental para o reequilíbrio das finanças oficiais nos próximos anos. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, adiou a votação para fevereiro. Sem escolha, a equipe de governo engoliu a decisão e preparou-se para continuar negociando o apoio da base parlamentar. A importância da reforma foi mais uma vez confirmada pelos novos dados das contas públicas.

De janeiro a novembro o Tesouro e o BC acumularam superávit de R$ 71,52 bilhões, mas esse resultado desapareceu, no balanço geral, por causa do déficit da Previdência, de R$ 174,54 bilhões. Isso explica o buraco de R$ 102,70 bilhões, a preços de novembro, anunciado pelo governo central. Pelo critério do BC, aquele superávit chegou a R$ 77,20 bilhões e o déficit da Previdência alcançou R$ 172,76 bilhões.

Nas contas publicadas pelo Tesouro, o resultado primário é a diferença entre receitas e despesas sem entradas e saídas de juros. Pelo padrão do BC, o saldo primário corresponde à necessidade de financiamento. Isso explica as diferenças, em geral pequenas.

O relatório mensal do BC inclui o desempenho fiscal de governos subnacionais e de empresas controladas pelo setor público, excetuadas Petrobrás e Eletrobrás. Inclui também a conta de juros e o resultado nominal, obtido com a soma dos saldos primários e os juros.

Segundo esse relatório, o resultado nominal do setor público, em 12 meses, foi um déficit de R$ 551 bilhões, ou 8,45% do Produto Interno Bruto (PIB). Foi uma proporção pouco menor que a registrada no período até outubro, de 9,25%, mas assustadoramente alta, ainda, pelos padrões internacionais. Ainda será necessário muito trabalho para consertar as finanças públicas. Quando ressurgir o superávit primário, lá pela metade do próximo governo, será possível cobrir os juros e domar a dívida pública. A dívida bruta do governo geral, de R$ 4,85 trilhões em novembro, correspondeu a 74,4% do PIB, cerca de 25 pontos porcentuais acima da média observada nas economias emergentes.

Essa proporção, acompanhada com atenção nos mercados, deve crescer enquanto o saldo primário for insuficiente para o pagamento dos juros. Poucos, em Brasília, demonstram alguma atenção a detalhes como esse, ao contrário de investidores e financiadores. A desatenção dificulta o ajuste e torna o percurso mais perigoso.

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