Inquérito é para apurar se houve participação de patrões em bloqueios
Jailton Carvalho, Eliane de Oliveira, Roberta Scrivano e Elisa Martins | O Globo
-BRASÍLIA E SÃO PAULO- O governo vai investigar irregularidades durante a paralisação dos caminhoneiros, que provocou grave crise de desabastecimento em todo o país. Ontem, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, determinou a abertura de inquérito, pela Polícia Federal, para apurar se houve prática ilegal de locaute — quando as empresas impedem os empregados de trabalhar para atender a interesses próprios. Segundo Jungmann, uma das preocupações é que as empresas responsáveis pelas paralisações tenham mantido ou ampliado suas margens de lucro. O ministro disse que cerca de 20 empresários serão chamados para depor.
Caso as investigações comprovem o locaute, há penas de reclusão e multas. Pode ser comprovado o atentado contra a segurança do serviço de utilidade pública, que prevê de um a cinco anos de prisão, e o atentado contra a liberdade do trabalho, que pode dar até um ano de prisão.
— Enquanto a greve é um direito constitucional do trabalhador, para buscar melhores condições, o locaute é uma ilegalidade — disse Jungmann.
CADE TAMBÉM VAI APURAR
Ao mesmo tempo, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) informou que vai apurar se empresas e pessoas responsáveis pelo movimento agiram para prejudicar a concorrência. Em nota, o Cade destaca que vai apurar se houve infrações contra a ordem econômica. Isso inclui atos para “limitar, falsear ou, de qualquer forma, prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa”, além de “exercer de forma abusiva posição dominante”. Também são apontadas como práticas ilegais “destruir, inutilizar ou açambarcar matériasprimas, produtos intermediários ou acabados, assim como destruir, inutilizar ou dificultar a operação de equipamentos destinados a produzi-los, distribuílos ou transportá-los”.
Se condenadas pelo Cade, as empresas podem ser multadas entre 1% e 20% do faturamento do ano anterior à abertura do processo. Pessoas físicas estão sujeitas a sanção de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões.
A lei prevê ainda proibição de obter empréstimos em bancos oficiais e participar de licitação; a recomendação para que não se parcelem tributos federais, se concedam incentivos fiscais ou subsídios públicos; a cisão de sociedade, transferência de controle societário, venda de ativos ou cessação parcial de atividade; e a proibição de exercer o comércio.
Embora as principais entidades patronais que representam as transportadoras neguem o apoio de companhias do setor à greve, alguns empresários do ramo de transportes de carga usaram as redes sociais para alardear que estavam alinhados e incentivar o movimento.
Vittorio Medioli, prefeito de Betim (MG) e dono da Sada Transportes e Armazenagem, uma das maiores transportadoras dos veículos produzidos na fábrica da Fiat na cidade, divulgou em sua página numa rede social um vídeo no qual parabeniza os caminhoneiros pelo movimento. “Continuem, estamos juntos”, diz o empresário e prefeito que é filiado ao Podemos.
Outro empresário do ramo, Emílio Dalçoquio, de Itajaí (SC), foi filmado sobre um carro de som de onde dizia que, se houvesse algum veículo de sua empresa, a Transportes Dalçoquio, circulando pela cidade, “podem parar os caminhões e pôr fogo”.
No vídeo, Medioli diz prestar “solidariedade aos movimentos que pararam o Brasil”. E afirma que a Petrobras está “nas mãos de pessoas incompetentes”:
— Substituíram os corruptos pelos incompetentes. E dá isso o que está ocorrendo aí.
Os próprios caminhoneiros à frente das manifestações reconheciam o suporte de empresários do setor de transporte. Num dos bloqueios da rodovia Regis Bittencourt (BR-116), na região metropolitana de São Paulo, ao menos três empresas estão ajudando informalmente os caminhoneiros à frente da interdição.
CAMINHONEIROS SE REVEZAM
Segundo os manifestantes, essas empresas se organizam para levar quentinhas, lanches, água e café nos pontos de parada.
— Normalmente o pessoal vem sem estar caracterizado como sendo da empresa. Sem uniforme nem nada. Os patrões não estão nos obrigando a furar bloqueio nem seguir viagem — diz o caminhoneiro Rodrigo Marques.
Uma empresa está revezando os motoristas que estão no bloqueio — o caminhão fica parado, mas o caminhoneiro muda. Os responsáveis das empresas não foram localizados
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