As expectativas se deterioraram ainda mais com a greve dos caminhoneiros e provocam agora incêndios no mercado de câmbio. Ele é alimentado também pela valorização do dólar em relação às moedas emergentes e pela crise fiscal, que, embora grave, não seria um motivo imediato para a forte depreciação do real, nem para a aposta dos investidores em juros mais altos já - explosiva para as contas públicas.
O cenário externo deixou de ser benigno e a perspectiva tranquila de meses atrás de que os juros permaneceriam aonde estão até o final de 2019 desapareceu. O aumento imediato dos juros, porém, não deveria estar no horizonte, pois a retomada da economia é de uma lentidão exasperante e a inflação segue domesticada. É possível um repique pontual devido aos efeitos da paralisação dos caminhoneiros, e alguma influência, ainda desconhecida, do repasse da escalada do dólar em alguns preços. Ainda assim, todas as previsões de inflação do mercado estão abaixo do centro da meta para 2019.
Uma disputa eleitoral sem qualquer previsibilidade ocorrerá desta vez sem constrangimentos externos. O déficit em conta corrente está perto do zero, as reservas se mantêm na casa dos US$ 380 bilhões e a balança comercial exibe superávits vigorosos. O fluxo cambial continuou positivo em maio e no ano - US$ 1,7 bilhão e US$ 20,08 bilhões, respectivamente, mesmo com a pressão por saída de recursos, expresso no déficit de US$ 5,1 bilhões na conta financeira no mês passado, mais da metade dele reflexo da debandada dos investidores da bolsa de valores.
O Banco Central ampliou a oferta de swaps cambiais e na terça-feira dobrou a oferta, colocando algo como US$ 2 bilhões em contratos para suavizar a alta das cotações. Após baixa inicial, o real continuou se desvalorizando, movimento que prosseguiu ontem. Ainda assim, os juros futuros foram subindo - contratos para 2027 registraram taxa superior a 13%. Pior que isso, os contratos mais curtos, os de janeiro de 2019, foram contaminados pela onda, de modo que passaram a indicar a aposta de que a taxa Selic deveria ser elevada já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária.
Entre a primeira vaga da desvalorização cambial e a segunda, separadas pela greve dos caminhoneiros, as perspectivas para a economia não pioraram muito - já se sabia que a retomada seria bem lenta -, mas se deterioraram significativamente no cenário político. O governo Temer foi negligente no trato das reivindicações dos caminhoneiros e cedeu a todas elas sob a ameaça de um abastecimento a caminho do colapso. O encurralamento do governo demonstrou sua enorme fragilidade e tornou possível um interregno tumultuado até as eleições.
Ao olhar para além do governo Temer, os investidores começam a se exasperar diante das perspectivas dos candidatos apontados como reformistas, como o tucano Geraldo Alckmin ou Henrique Meirelles, do PMDB, com baixo grau de preferência. As pesquisas apontam Jair Bolsonaro (PSL) Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT) à frente e a chance nada desprezível de um segundo turno entre a direita de Bolsonaro e a esquerda unida em torno de Ciro. Nenhum dos dois têm compromissos firmes com reformas.
A desvalorização do real, além de razões econômicas dadas, parece ter agora como impulsionador o fato de que os investidores entraram em modo eleitoral. O fator eleições era considerado lateral para investimentos de curto prazo e ao que tudo indica isso pode não mais ser assim.
Se isso for verdadeiro, o trabalho do BC se complica bastante, porque terá de agir sob fatores fora de seu controle. É possível fazer mais para retirar ímpeto do dólar. Parte dos investidores indica a necessidade de o BC passar a oferecer também linhas em dólar com recompra, que aliviariam uma suposta falta de liquidez no mercado à vista.
Pelo sistema de metas, o BC não deveria ceder aos apelos por juros maiores já - e já sinalizou que não o fará. O aumento das taxas só pioraria as coisas, em um ambiente carregado, e traria ainda mais desconfianças quanto à capacidade do governo de honrar seus compromissos. Sem estrangulamento externo é mais plausível combater o "overshooting" cambial. A autoridade monetária tem um bom arsenal para reduzir as oscilações do dólar e é preciso usá-las com mais vigor e amplitude.
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