Diante da dramática situação financeira dos Estados, agravada nos últimos anos pela queda da arrecadação em razão da crise econômica e pelo crescimento contínuo das despesas – especialmente com pessoal –, é até surpreendente que 60% dos governadores pretendam renovar seus mandatos na eleição de outubro. Estarão dispostos a enfrentar nos próximos quatro anos os graves problemas que não enfrentaram com a coragem necessária durante o mandato que se encerra no dia 31 de dezembro? Infelizmente, o acompanhamento da evolução recente das finanças estaduais sugere que não.
A recessão teve papel decisivo na redução das receitas nos últimos anos. Entre 2015 e 2017, como mostrou reportagem do Estado, a receita dos Estados poderia ter sido R$ 278 bilhões maior do que o valor efetivamente arrecadado caso se mantivessem as condições econômicas anteriores. Como disse o economista Raul Velloso, esse é o dinheiro adicional que teria entrado nos cofres estaduais caso o País não tivesse mergulhado na recessão.
Estados mais industrializados perderam mais receita, proporcionalmente e em valores, porque a crise afetou mais duramente, e por mais tempo, a produção de bens industriais. No Rio de Janeiro, a receita caiu até mesmo em valores nominais.
Os valores impressionam, especialmente se se lembrar que o dinheiro não arrecadado daria para cobrir os custos da construção de mais de mil hospitais do nível da unidade que o Hospital Sírio-Libanês está construindo em Brasília, com 144 leitos. Daria também, como lembrou Velloso, para pagar o aumento das despesas com o sistema previdenciário.
Em boa parte dos casos, porém, à gravidade do impacto da crise sobre a arrecadação não correspondeu a necessária austeridade que se espera de um gestor comprometido com o bom uso do dinheiro do contribuinte.
Em 2017, por exemplo, quase todos os Estados gastaram mais da metade de sua arrecadação líquida no pagamento dos servidores públicos, ativos e inativos, segundo dados informados pelos governos estaduais à Secretaria do Tesouro Nacional, como exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Essa lei (Lei Complementar n.º 101, de 4/5/2000) estabelece em 60% da receita corrente líquida o gasto máximo com pessoal dos Estados. Quando os gastos com pessoal atingirem 95% desse limite (ou 57% da receita líquida), os Estados não poderão conceder vantagens, aumentos ou reajustes aos servidores, nem criar cargos ou funções.
No ano passado, uma parte dos Estados conseguiu reduzir os gastos com pessoal ativo, em razão da não substituição dos servidores que, por alguma razão, saíam da folha do pessoal em atividade. Mas, desde 2015, os gastos com inativos estão crescendo mais depressa e é praticamente nula a competência dos governos estaduais para conter esse crescimento.
A combinação de gastos em crescimento e arrecadação em queda (o aumento da receita real no ano passado não foi suficiente para compensar as perdas dos dois ou três anos anteriores) resultou no crescimento da dívida dos Estados, que no segundo semestre do ano passado somava R$ 781 bilhões. Renegociadas em 1997 com grande ônus para o Tesouro Nacional, mas com regras rigorosas para evitar seu crescimento, as dívidas estaduais voltaram a aumentar a partir de 2009, em razão de financiamentos concedidos por instituições federais e organismos multilaterais.
Cercadas de medidas de prudência no início, as operações com bancos federais tornaram-se mais fáceis para os Estados depois que o governo do PT autorizou empréstimos sem o aval do Tesouro Nacional. O risco da operação, antes bancado pelo Tesouro, passou a ser da própria instituição financiadora. Chegou-se à situação em que a Caixa Econômica Federal tem a receber R$ 21,4 bilhões de empréstimos concedidos a Estados e municípios sem aval do Tesouro, como mostrou o Estado. Foi um estímulo para os gastos estaduais e para a deterioração de sua já combalida situação financeira.
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