- Folha de S. Paulo
Candidato do PSL à Presidência produziu uma plataforma diferente de tudo o que já se viu
Jair Bolsonaro apresenta ideias sobre relações internacionais que põem em xeque os conceitos de política externa concebidos nos últimos anos pelo condomínio tucano-petista.
O projeto do deputado para a diplomacia brasileira é produto de sua intuição pessoal e de um condicionante estrutural —a ausência de militância, máquina, fundo partidário, tempo de televisão e apoio de grandes conglomerados empresariais.
Tentando energizar a sua base, Bolsonaro produziu uma plataforma de política externa diferente de tudo o que já se viu.
Ele promete aproximar-se para valer do governo de Trump. Ao contrário de Sarney, FHC, Lula e Dilma, que optaram por manter os EUA a distância, Bolsonaro quer alinhamento. Isso significa redobrar a aposta em cooperação com os americanos em temas como narcotráfico e crime organizado.
Bolsonaro também pretende sacudir a relação com a China. Para ele, a ascensão acelerada do gigante asiático é uma ameaça. O fluxo de comércio permanecerá intocado, mas ele promete condicionar o crescimento dos investimentos chineses no Brasil. Nessa visão, nossa dependência de Pequim não é inexorável e tem de ser manipulada em benefício próprio.
O presidenciável quer intervir nas fronteiras para estrangular o comércio ilegal que alimenta a insegurança pública no país. Embora não tenha dito como, tudo aponta para uma aposta redobrada em diplomacia militar junto à tríade composta por Argentina, Bolívia e Paraguai.
O deputado ainda promete fazer campanha permanente contra compromissos internacionais em direitos humanos e mudança do clima. Sua preocupação é manter energizado o eleitor que se identifica com o mote de Lei e Ordem e aquele que vive do agronegócio. O eleitor evangélico será atendido pelo alinhamento com Israel.
Por fim, Bolsonaro tem uma concepção singular sobre o lugar do Brasil na economia global. Na sua visão, derivada do guru da campanha Paulo Guedes, o protecionismo beneficia grandes grupos econômicos em detrimento da maioria do eleitorado, composta por cidadãos de baixa renda.
Segundo essa lógica, uma diplomacia comercial que abrisse a economia à competição internacional logo no primeiro ano de governo traria bem-estar para a população em geral e, de quebra, enviaria um sinal ao mercado de que Bolsonaro está comprometido com a agenda de reformas.
O problema dessa escolha é que o capitão reformado teria de enfrentar lobbies de grupos rentistas que capturaram a política externa, como é o caso da indústria de automóveis.
As dificuldades para implementar tal agenda são enormes, e nada na biografia de Bolsonaro sugere preparo ou diagnóstico preciso para travar essa batalha.
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Matias Spektor é professor de relações internacionais na FGV.
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