Por Ricardo Mendonça | Valor Econômico
SÃO PAULO - A entrevista de Jair Bolsonaro ao Jornal Nacional promoveu o presidenciável ao posto de campeão isolado de engajamentos nas redes sociais (compartilhamentos, comentários e curtidas), mostram levantamentos das agências.MAP e Atlas Político. As medições constataram, porém, que isso não serviu para ampliar expressivamente a base de seguidores do candidato.
O Atlas detectou 345 mil engajamentos no Facebook (Lula, o segundo, conseguiu 260 mil) e 628 mil no Twitter (ante 93 mil do petista). No mesmo período, ele conseguiu 8.869 novas adesões no FB, quase o mesmo que Guilherme Boulos (Psol), 6.060. Ciro Gomes (PDT) atraiu 7.327. E João Amoêdo (Novo), que ganha destaque na rede, 48,5 mil. Ou seja, houve grande intensidade na atuação de seus adeptos, mas a base não ampliou.
"Quem gosta do Bolsonaro continua muito engajado. Mas esse público não cresce como antes", avaliou Andrei Roman, diretor da empresa. "Está estagnado". Gestos de Bolsonaro talvez ajudem a explicar esses dados. Depois do JN, ele foi recebido na GloboNews. O jornalista Merval Pereira perguntou sobre os escritos em sua mão, uma colinha claramente feita para ser notada. " Deus, família, Brasil", respondeu. "Tô fazendo uma propaganda. Você mordeu a isca, Merval. Obrigado aí".
O episódio que ilustra bem um padrão que tem sido repetido. Na internet, adeptos do deputado já vibravam desde a primeira aparição da colinha, durante o debate presidencial na Rede TV!.. "Gênio", "mito", "rei do marketing", "kkkkkkk" foram algumas das manifestações.
Confrontar a imprensa pareceu mais importante em sua estratégia do que chegar ao eleitorado que não está na mesma frequência. Ao optar por esse caminho, Bolsonaro deixou claro que sua orientação é jogar para a própria plateia, disse um analista. "Se o objetivo era esse, seu desempenho no JN foi magistral."
Outras passagens reforçam essa percepção. Como o alarmismo contra um inexistente "seminário LGBT infantil", o alinhamento com a ditadura ou a defesa de condecoração para policial que "matar 10, 15 ou 20".
No meio político, a opção de Bolsonaro de falar para os seus não é vista como algo desprovido de lógica. Ele tem até 22% nas pesquisas. Numa disputa com mais nomes competitivos que o tradicional, parece suficiente para colocá-lo no segundo turno. Na avaliação de muitos, segurar essa turma tornou-se a grande aposta do ex-capitão.
A desigualdade de forças na propaganda de rádio e TV é outro dado que justificaria essa opção. Na comparação com Geraldo Alckmin - o rival que mais precisa desidratá-lo -, o tempo de TV de Bolsonaro é residual. Sabendo que pode vir chumbo grosso do tucano e que não terá meio equivalente para se defender, é natural que busque desde já consolidar o que já tem. Cimentar a própria base.
O caminho pode parecer apropriado para atravessar o primeiro turno, mas tende a mostrar seus limites na etapa final. Os cerca de 20% de hoje não são suficientes para eleger presidente. Ao optar por falar só para os já convertidos, Bolsonaro não avança para outros públicos. Não amplia. Tende, ao contrário, a agregar ainda mais rejeição no ranking que já lidera.
No mesmo JN em que adeptos de Bolsonaro viram o ídolo "lacrar", os não-adeptos viram o candidato tomar uma admoestação da apresentadora na questão da discriminação de mulheres no trabalho, descobriram que ele foi contra a norma de direitos mínimos para domésticas, puderam perceber que não demonstra ter preocupação com vítimas inocentes de balas perdidas.
Para vencer em 1994, lembram analistas, FHC sabia que talvez não bastasse o Real. Teve que se aliar ao PFL. Da mesma forma, Lula, em 2002, sabia que seria arriscado contar só com a militância do PT e a impopularidade do governo. Colocou um empresário de vice, assinou carta ao mercado e moldou a imagem "paz e amor". Bolsonaro não parece convencido de que precisa sair de sua zona de conforto.
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