- Valor Econômico
Criado para durar 10 anos, antes de revisto, talvez não passe de 3
Cresce a percepção de que o chamado teto de gastos da União, instituído pela emenda constitucional 95/2016, será alterado pelo próximo governo. Ainda não é possível saber o teor da alteração. A atual equipe econômica, por exemplo, simpatiza com a ideia de retirar do teto as despesas da Previdência, mas apenas após a reforma dos atuais regimes previdenciários.
Alguns candidatos à Presidência da República, bem colocados nas pesquisas eleitorais, querem simplesmente acabar com o teto. Outros anunciam que vão mudá-lo, mas não dizem exatamente o que pretendem fazer. Uns acham que ele é inexequível, outros, que impede o aumento dos gastos na área social. Em síntese, o teto, que deveria durar dez anos antes de ser alterado, talvez não passe de três.
O teto de gastos foi criado com o objetivo de frear o crescimento contínuo das despesas da União, que não param de aumentar. Em 1991, o gasto primário da União (não considera o pagamento dos juros das dívidas) correspondia a 10,8% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com o Ministério da Fazenda. Em 2016, o gasto atingiu 20% do PIB. No ano passado, caiu um pouco, para 19,5% do PIB.
Alguns consideram que o teto foi um instrumento inadequado para enfrentar o problema, pois ele não corta despesas. De acordo com esse raciocínio, o governo Michel Temer deveria ter concentrado esforços para aprovar a reforma da Previdência Social, que efetivamente reduziria o ritmo de crescimento dos gastos. Agora, essas questões são águas passadas.
Aqueles que querem acabar com o teto precisam, no entanto, ficar atentos a dois aspectos da questão. Em primeiro lugar, a Constituição permite que os deputados e os senadores corrijam "erros ou omissões" da proposta orçamentária anual, encaminhada pelo governo.
E, todo ano, eles encontravam "erros" na previsão da receita anual feita pela área econômica. Na prática, os parlamentares aumentavam as projeções de receita para acomodar os gastos com suas emendas ao Orçamento. O Orçamento ficava irrealista, pois as receitas terminavam não se concretizando, o que obrigava o governo a contingenciar as dotações orçamentárias ao longo do ano.
O teto de gastos acabou com essa prática. Como a proposta orçamentária preparada pelo governo já vem com as despesas no limite permitido pela emenda constitucional 95, não adianta aumentar a receita, pois isso só resultará em melhoria do resultado primário.
A nova realidade força os parlamentares a discutir o gasto proposto pelo governo. Se quiserem incluir novas despesas no Orçamento ou aumentar algumas delas, precisam cortar outras. A lógica do teto é que, como não podem aumentar despesas, deputados e senadores passarão a discutir as prioridades orçamentárias, como ocorre em qualquer lugar do mundo civilizado.
Outro aspecto importante a ser considerado está relacionado com a autonomia dos Poderes da República. O Judiciário e o Legislativo elaboram as suas próprias propostas orçamentárias, cabendo ao Ministério do Planejamento apenas incluí-las no projeto de lei a ser enviado ao Congresso. Isto significa que o Executivo não pode interferir de maneira alguma nas propostas orçamentárias dos demais Poderes.
A emenda 95 alterou essa realidade ao prever limites individualizados para as despesas primárias do Executivo, do Senado, da Câmara, do Ministério Público da União, da Defensoria Pública e de cada órgão do Judiciário. As despesas de todos eles serão as mesmas executadas em 2016, corrigidas pela inflação.
Dizendo de uma forma direta: os gastos do Judiciário e do Legislativo estão, agora, sob controle, submetidos a normas constitucionais e independem da vontade dos seus dirigentes ou do poder de pressão das corporações, como aconteceu em passado recente.
Isso não é pouco. Basta ver a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que propôs um aumento 16,38% nos subsídios de seus ministros, que é o teto salarial do funcionalismo. Com o aumento, a remuneração de toda a magistratura também seria reajustada.
O aumento concedido pelo STF não será incluído na proposta orçamentária pelo Ministério do Planejamento porque a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2019, recentemente sancionada pelo presidente Temer, não autoriza gasto com reajuste salarial aos funcionários públicos. Além disso, como a Justiça Federal só cumpre o teto de gastos com a ajuda do Executivo, ela está impedida, pela própria LDO, de conceder reajuste salarial aos magistrados.
A proposta orçamentária do próximo ano só será fechada com a compressão, ainda maior, das chamadas despesas discricionárias (investimentos e custeio administrativo), que já foram reduzidas ao nível de 2009. Isto porque os gastos obrigatórios subirão cerca de R$ 81 bilhões em 2019, na comparação com o previsto para este ano, de acordo com estimativa do Tesouro.
Com novos cortes nessas despesas, nos próximos anos, a prestação de serviços públicos à população ficará cada vez mais deteriorada. Isso acontecerá mesmo que o próximo governo consiga aprovar a reforma dos regimes previdenciários. A razão disso é que há um crescimento vegetativo de 3% na quantidade de benefícios previdenciários concedidos anualmente pela Previdência. Além disso, o efeito da reforma sobre as despesas previdenciárias é gradual, pois ele dependerá do prazo de carência para a plena entrada em vigor das novas regras. O aumento dos gastos previdenciários comprime as demais despesas.
Por isso, uma alternativa discutida na área econômica é manter o teto de gastos, excluindo-se dele as despesas previdenciárias. Mas isso somente seria feito após a aprovação da reforma dos regimes previdenciários pelo Congresso. A manutenção de um controle sobre os demais gastos é considerada indispensável, pela área técnica, para reduzir a despesa primária da União, em proporção do PIB, e obter superávits primários nas contas que permitam a sustentabilidade da dívida pública.
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