- O Globo
Todas as eleições democráticas são incertas de alguma maneira, mas a brasileira, deste ano de 2018, é incerta de diversas maneiras
Uma lista do que não sabemos nesta eleição mostra a dimensão da incerteza. Maior do que qualquer outra que tivemos. Navegamos no escuro nos últimos dois meses, sem os dados de pesquisas dos institutos tradicionais de verificação de intenção de votos. Não sabemos se o primeiro das pesquisas é inelegível, nem se prevalecerá a polarização que houve nas últimas seis eleições. O que já sabemos não é encorajador: o mercado político dificilmente entregará a renovação que é pedida pelo eleitor.
A última pesquisa do Ibope foi no dia 28 de junho, a última Datafolha foi 11 de junho. Nesta semana os dois divulgarão suas consultas ao eleitor. Nunca tivemos eleição com tão poucas pesquisas dos dois institutos com metodologias mais conhecidas. O problema é que, de novo, as consultas terão que trazer cenários alternativos, com Lula ou sem Lula.
A cada dia um ingrediente novo entra no rol das dúvidas. Na semana que passou houve até a pergunta sobre se haveria dois relatores ou um, e qual deles, para decidir sobre a inelegiblidade ou não do ex-presidente Lula. A presidente do TSE ajudou a esclarecer. A estratégia do PT de manter o nome de Lula na chapa, contra o espírito da lei que o partido mesmo ajudou a aprovar, será sustentada até quando? Isso é um caminho ruim inclusive para o PT, que tem que tornar conhecida a chapa que concorrerá de fato. Não se sabe ainda se o nome do ex-prefeito Fernando Haddad une o partido. Uma ala ainda duvida e diverge.
Cientistas políticos acham que essa eleição será o maior experimento da força das redes. Os recursos eleitorais tradicionais — tempo no rádio e TV e dinheiro dos fundos públicos — estão distribuídos muito desigualmente entre os candidatos que mais pontuam nas pesquisas. As redes digitais nunca estiveram tão disseminadas. A plataforma para aplicativos de mensagens está nas mãos de todos. Mas que impacto isso terá só ficará claro após as eleições.
Durante seis eleições PT e PSDB se enfrentaram. Em duas delas, o PSDB venceu no primeiro turno. Em quatro o PT venceu no segundo turno. Há estudiosos achando que ao fim acabará prevalecendo a mesma divisão. Mas isso está longe de ser consenso. Os quatro candidatos que estão na frente nas pesquisas, e Fernando Haddad, quando ele estiver de fato concorrendo, têm potencial de estar no segundo turno. A campanha curta dará tempo para que Geraldo Alckmin cresça e Haddad seja identificado com o lulismo? O PSDB de Geraldo Alckmin não está mais sozinho na captura por votos antipetistas. Jair Bolsonaro ocupou o espaço à direita do PSDB. Se a pessoa que vencer a eleição for de qualquer outra opção, que não os partidos da polarização convencional, haverá um realinhamento partidário no país. Mas qual?
Os eleitores pedem renovação por bons motivos. Nos últimos quatro anos foram sendo informados dos detalhes dos esquemas de corrupção que imperam nos principais partidos. O continuísmo agiu concentrando recursos nos maiores partidos e nas velhas direções partidárias. A maioria dos envolvidos na Lava-Jato, em diversos graus, está concorrendo. Além disso, o que houve semana passada na 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal abre uma fenda no processo de combate à corrupção. Se a palavra dos delatores, com as provas que eles produziram, não serve para sequer iniciar uma ação, o que fazer com os inúmeros processos que avançaram com base nisso? Entre as nossas muitas dificuldades está o fato de que o STF, que deveria pacificar entendimentos, abre novas dúvidas com muita frequência e confirma que no Brasil até o passado é incerto.
No pouco que se sabe está que as mulheres são maioria em todas as faixas e que elas têm alta taxa de indecisão e alta rejeição ao candidato Jair Bolsonaro do PSL. Num evento na semana passada ouvi de uma mulher o resumo do sentimento. Ela disse que não está em dúvida entre dois candidatos, mas se algum deles a representa.
Todas as eleições democráticas são incertas de alguma maneira. Mas a nossa de 2018 é incerta de diversas maneiras. Agora, nem mesmo o registro de candidaturas responde completamente à pergunta sobre quem está concorrendo. As próximas semanas serão intensas. O país vai fazer uma escolha expressa num tempo em que, em várias áreas, há problemas agudos.
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