- Valor Econômico
Campos Neto está pronto para próximo ciclo dos mercados
O anúncio mais acelerado de integrantes da área econômica livrou o presidente eleito, Jair Bolsonaro, de avaliações pouco construtivas colocadas em gestação entre grandes investidores ao longo de duas semanas de maior exposição pública, após a vitória no 2º turno das eleições. O convite do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, aceito por Roberto Campos Neto para presidir o Banco Central (BC) foi muito bem-recebido. A iniciativa de Carlos Viana de Carvalho de permanecer por "tempo considerável" no comando da diretoria de Política Econômica da instituição também. Repercussão igualmente positiva renderam a manutenção de Mansueto Almeida na Secretaria do Tesouro Nacional e a escolha de Joaquim Levy para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Essa formatação da equipe econômica aponta para continuidade da política econômica ancorada, estruturalmente, no trabalho do Banco Central de Ilan Goldfajn, que renovou o crédito no regime de metas de inflação, reduziu o juro a recorde de baixa e manteve as reservas internacionais intactas.
Esse ambiente conspira a favor de um fluxo mais consistente de recursos para investimentos no país e compensa a decepção inicial de investidores estrangeiros com as manifestações de Jair Bolsonaro no pós-eleição, caso das críticas à China e seu interesse em ampliar a compra de ativos no país, comentários beirando a indiferença quanto à mudança da Embaixada do Brasil em Israel e defesa de uma reforma "possível" da Previdência.
Embora a construção do novo governo inspire confiança, a pouco mais de 40 dias da mudança da guarda no Palácio do Planalto, os investidores estão atentos às decisões do presidente eleito que poderão revelar maior inclinação ao populismo do que a uma agenda ortodoxa e liberal.
Cresce a expectativa em torno da presidência da Petrobras e na manutenção de Ivan Monteiro no cargo. Contudo, pairam dúvidas sobre o resultado da negociação entre a futura administração e o governo Temer a respeito do subsídio ao diesel - decisão que deverá ser anunciada antes da posse de Bolsonaro porque a medida em vigor expira em 31 de dezembro. Esse incentivo foi concedido pelo governo Temer aos caminhoneiros que paralisaram o país em maio.
O posicionamento de Jair Bolsonaro nessa questão ganha relevância. "Essa decisão indicará uma escolha do presidente eleito - se populista ou ortodoxa. Caso a decisão aponte para o populismo, e o custeio seja mantido em 2019, as contas públicas sofrerão um impacto relevante. O subsídio do diesel custará cerca de R$ 12 bilhões, pela atual taxa de câmbio e preço internacional do petróleo", alerta o executivo de banco estrangeiro no Brasil que conversou com a coluna na condição de manter o anonimato.
Os investidores estarão atentos à dicotomia entre o populismo e a agenda ortodoxa e liberal já observada entre o discurso de Bolsonaro e a formação de Paulo Guedes. E a relação entre o presidente eleito e o futuro ministro da Economia será um sensível termômetro para avaliar o futuro próximo do Brasil, entende o interlocutor, para quem as eleições para as mesas diretoras da Câmara e do Senado - previstas para o início de fevereiro - serão mais um desafio imposto ao presidente eleito.
Posições relevantes no Congresso - com poder de influenciar a pauta de votação de projetos e propostas de reformas - não ficarão necessariamente com o PSL, partido de Bolsonaro. Resta saber, portanto, se ele vai impor ou não resistência a alguns parlamentares. Estará em jogo o apoio que ele terá no Parlamento, lembrando sua garantia de que não praticará a política do "toma lá, dá cá" para viabilizar a aprovação de medidas que julgar relevantes para o país.
O Banco Central deverá ter um papel estabilizador nesse contexto. "O 'preço' do BC com Ilan Goldfajn ou Roberto Campos Neto na presidência da instituição não vai mudar. O comportamento dos ativos já mostrou reação positiva ao processo de sucessão no BC, dada a competência técnica de Ilan e de Campos Neto. São economistas com características diferentes, perfis diferentes, e vão desempenhar papéis diferentes", enfatiza Adeodato Netto, estrategista-chefe da Eleven Financial Research.
Na sua visão, Ilan cumpriu um ciclo importante no BC. A atual diretoria manteve o foco na ancoragem de todas as expectativas e na comunicação, sabendo o quanto a credibilidade faz diferença na condução da política monetária. "O BC recuperou credibilidade com o mercado, e a indicação de Campos Neto é aderente com os compromissos assumidos por Jair Bolsonaro desde a vitória nas urnas: interesse em manter o nível técnico da equipe econômica e manter um alinhamento entre as pastas no que cada uma tem de diferente, de específico. Isso vale também para os perfis em questão."
Adeodato Netto avalia que Ilan é um especialista em macroeconomia, em movimentos estruturais, enquanto Campos Netto é um especialista em derivativos, voltado ao mercado, perfil que agregará muito valor ao BC.
"O Brasil está estabilizado na ótica da política monetária e o mercado vem se preparando para um novo ciclo, com o fim da flexibilização monetária, juros em alta no mundo com efeitos no câmbio e agentes dispostos a brigar com o BC em swaps e instrumentos afins. O futuro presidente do BC tende a um jogo mais denso - sua experiência será muito relevante para o controle de volatilidade. E ela acontecerá sobre o modelo estrutural já ancorado pela gestão anterior e dentro do mandato principal da instituição, que é cumprir o regime de metas de inflação", diz o estrategista.
Tony Volpon, economista-chefe do UBS Brasil, avalia que a equipe de Paulo Guedes tem a combinação certa de experiências. E acredita que Mansueto Almeida e Joaquim Levy - ambos com anos de trabalho no setor público e em atribuições diversas - devem colaborar em muito com Guedes e Campos Neto, que não têm experiência de governo. "A partir dessas confirmações esperamos agora que Paulo Guedes nomeie os secretários que irão secundá-lo no Ministério da Economia", diz Volpon.
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