segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Minoria no Congresso pode ter ação limitada

Por Malu Delgado | Valor Econômico

SÃO PAULO - Está em curso nos bastidores da Câmara dos Deputados uma discussão para alterar o regimento interno da Casa e dificultar a atuação dos partidos de oposição ao futuro governo de Jair Bolsonaro, criando obstáculos para a obstrução, um instrumento muito usado pelos parlamentares para adiar uma votação.

A ideia é que um projeto de resolução (PRC) seja votado, modificando regras para que os partidos possam atuar no plenário.

Um dos itens que pode ser alterado, por exemplo, é o artigo 177 do regimento. Pelas regras atuais, a discussão de um projeto que tramita em regime de urgência pode ser adiada se "um décimo dos membros da Câmara, ou líderes que representam esse número" fizer tal solicitação por requerimento.

Uma das propostas que está sendo debatida é a elevação da exigência para dois décimos da Casa para que um pedido de interrupção de uma votação seja feito. Além disso, segundo uma fonte, haveria "um arsenal" de outros instrumentos que podem ser alterados para restringir a movimentação da oposição, como o direito de apresentar requerimento pedindo a retirada de projeto de pauta, pedido de quebra de interstício e pedidos de verificação de quórum, que podem derrubar uma votação.

As minorias e a oposição não possuem poder político para barrar uma votação, mas as manobras para adiar o debate acabam surtindo efeito, inclusive para dar mais publicidade e transparência a assuntos polêmicos debatidos no Congresso. A obstrução é um desses instrumentos, mas tem ação limitada, pois não tira o projeto de pauta.

O deputado federal Carlos Manato (PSL-ES), que é suplente de secretário na Mesa Diretora, confirmou ao Valor que mudanças no regimento interno podem ser analisadas em reunião na próxima semana. O regimento interno possui 282 artigos.

Ele apresentou um novo PRC à Mesa na última terça-feira. Manato, que já era autor de outro projeto apresentado em 2016, propondo modificações em alguns ritos e regras de funcionamento do plenário da Câmara, disse que a ideia agora é debater um texto mais enxuto que possa ser aprovado rapidamente. Ele negou que o tema da obstrução esteja incluído nesta proposta.

"Não quero mexer nisso. É muito polêmico. Esse meu [projeto] é uma coisa mais tranquila de passar [no plenário]. Quero que venha pela Mesa, pelo colégio de líderes", explicou Manato.

Questionado se há parlamentares que querem alterar as regras de obstrução, o deputado admitiu que sim, e que se a Mesa considerar plausível poderá incluir o tema à proposta apresentada por ele. "Fiquem à vontade. Mas têm que conseguir quórum para votar", acrescentou Manato.

A proposta apresentada, explicou o deputado, muda regras para que a ordem do dia (quando começam as votações no plenário) fique mais produtiva. "É tudo muito lento e pouco objetivo. Na hora de orientar a bancada, tem que dizer só cinco palavras: sim, não, obstrução, liberação da bancada ou abstenção. Só que hoje para falar cinco palavras é uma eternidade", pontuou, exemplificando que seus colegas aproveitam o microfone para "falar de Deus e todo mundo".

Com a altíssima fragmentação partidária do Congresso, diz o deputado, a alteração é necessária, ou o funcionamento da Casa ficará inviabilizado. A ideia é que o encaminhamento da votação seja feito por 10 segundos por cada líder. Só os líderes do governo e do bloco da minoria teriam um minuto cada. Outra proposta de seu projeto é que o tempo de uma sessão extraordinária seja estendido, o que evitaria verificação de quórum.

Na justificativa apresentada por Manato no primeiro projeto de resolução, há dois anos, o deputado argumentava que "a racionalização da utilização do tempo para orientação de bancadas contribui para a possibilidade de apreciação de maior número de matérias pela Câmara". "Na esteira da proposta de redução do tempo de orientação, propõe-se também condicionar a manifestação em plenário, nas sessões deliberativas, ao registro formal de presença do parlamentar. Em que pese a ser a obstrução legítima, não é razoável que o deputado ou deputada queiram exercer suas prerrogativas regimentais sem o devido registro de presença no painel eletrônico", diz outro trecho da justificativa.

A iminência de mudanças no regimento já deixou partidos oposicionistas em estado de alerta. Se regras restritivas forem de fato apresentadas e aprovadas, isso poderá facilitar a formação de um bloco amplo de esquerda, avaliam deputados do PT.

"Se houver uma discussão para racionalizar o processo legislativo eu aprovo, isso é uma coisa útil. Mas se for uma ação para reduzir os instrumentos de obstrução da oposição, isso é totalmente antidemocrático", criticou o deputado Orlando Silva, líder do PC do B.

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