Parece haver um consenso entre os investidores estrangeiros de que a equipe econômica montada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, é da melhor qualidade e que suas propostas estão alinhadas com as melhores expectativas do mercado. No entanto, começam a surgir dúvidas sobre a capacidade de o presidente Jair Bolsonaro articular no Congresso o apoio necessário para que essas propostas sejam aprovadas e implementadas.
Reportagem do Estado com participantes do Fórum Econômico Mundial, em Davos, mostrou que já há quem acredite que a reforma da Previdência, por exemplo, “pode não passar pelo Congresso”, como disse o diretor adjunto do Departamento de Pesquisa do Fundo Monetário Internacional (FMI), Gian Maria Milesi-Ferretti.
A mesma opinião foi manifestada por um executivo de um banco suíço, para quem as mudanças no Congresso, operadas na eleição passada, não foram tão profundas a ponto de alterar a indisposição dos parlamentares em relação à reforma da Previdência e a qualquer outra medida que imponha sacrifícios ao eleitorado.
Esses investidores e especialistas concordam que o governo de Bolsonaro, a despeito de sua sólida vitória na disputa presidencial, se apresenta vulnerável em dois importantes aspectos. O primeiro, e mais evidente, é a aparente falta de coordenação e de experiência na sua relação com partidos e com o Congresso.
Um exemplo disso foi a designação do deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO) para ser o líder do governo na Câmara. Responsável por negociar os votos de seus pares para aprovar a reforma da Previdência, Major Vitor Hugo está em seu primeiro mandato e não tem nenhuma vivência na articulação política. O deputado – que já se declarou contrário ao estabelecimento de uma idade mínima para a aposentadoria – acredita que tenha sido escolhido como líder do governo porque é o único, entre os parlamentares novatos do PSL, que tem alguma experiência na Câmara – onde trabalhou como consultor legislativo na área de segurança nos últimos três anos. É muito pouco para quem terá o imenso desafio de convencer centenas de deputados a aceitar as impopulares mudanças no sistema previdenciário.
A segunda fragilidade do governo Bolsonaro, também destacada pelos investidores, são os enroscos familiares do presidente. Os próprios aliados de Bolsonaro no Congresso já admitem que a dificuldade de seu filho Flávio Bolsonaro de dar explicações ao menos razoáveis para as suspeitas que surgiram nas últimas semanas, sobre estranhas movimentações bancárias de um assessor e dele mesmo quando era deputado estadual no Rio, tendem a prejudicar o governo. Tanto é assim que o vice-presidente Hamilton Mourão tratou de dizer que “o caso de Flávio Bolsonaro não tem nada a ver com o governo”. O próprio presidente tem evitado dar declarações. Mas o problema é que, a cada dia, surgem novidades que agravam a situação do filho de Bolsonaro, e a fatura política costuma ser salgada em situações assim.
Para um governo que se elegeu prometendo acabar com a relação fisiológica no Congresso, será especialmente desafiador enfrentar logo de saída um ambiente potencialmente inamistoso entre os parlamentares, muitos dos quais certamente interessados em explorar as agruras do clã Bolsonaro para encarecer seus votos. Nem mesmo o presidente demonstra ter o necessário traquejo para encarar um cenário desses, a despeito de suas três décadas como deputado, pois durante todo esse tempo atuou apenas como representante do baixo clero – destacando-se mais pelos discursos virulentos que pronunciou do que pelos raríssimos projetos de lei que apresentou.
São sinais como esses que colocam em dúvida a capacidade do governo de viabilizar, no Congresso, os planos de sua equipe econômica até agora tão bem recebidos pelo mercado. À medida que vai se aproximando o momento da reabertura dos trabalhos legislativos, o otimismo dos investidores com as promessas de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes começa a ceder lugar a interrogações sobre os verdadeiros limites de um governo que, segundo discursou Bolsonaro em Davos, promete nada menos que construir “um novo Brasil”.
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