- O Estado de S.Paulo
Um presidente convicto é essencial para que haja chance de a proposta prosperar
A publicação do vídeo com conteúdo obsceno gravado durante o carnaval acabou tirando o presidente Jair Bolsonaro da inércia em que estava na defesa da reforma da Previdência.
A falta de ativismo do presidente na busca de apoio para aprovar a reforma estava incomodando muito os defensores aguerridos da proposta. Afinal, das 515 mensagens publicadas por Bolsonaro desde 1.º de janeiro até terça-feira passada, dia em que publicou o vídeo, apenas cinco delas traziam a Previdência como assunto, o equivalente a menos de 1% de suas postagens em redes sociais.
A esperança era de que, depois do envio do projeto de lei da reforma dos militares, o problema seria resolvido.
Mas há, de fato, uma preocupação de que Bolsonaro não se engaje para explicar e defender os pontos mais polêmicos da PEC, enviada no mês passado ao Congresso. Essas propostas já estão sendo rifadas por deputados aliados antes mesmo do início formal de tramitação – posição que ganhou força depois que o próprio presidente acenou com flexibilizações no texto, como a redução de 62 anos para 60 anos na idade mínima das mulheres.
Cobrado por aliados no Congresso e apoiadores de primeira hora nas redes sociais, o presidente finalmente saiu da toca e lançou uma ofensiva de tuítes pró-reforma, movimento acompanhado por seus filhos e também por parlamentares da base. Foi um alívio geral.
A ofensiva tuiteira tem servido para reduzir o desconforto gerado pela postagem do vídeo, que dividiu os seguidores do presidente e disparou uma onda de críticas de que ele não estava “focado” naquela que é a principal aposta de seu governo para melhorar a economia – ainda em marcha lenta, como mostrou a divulgação do PIB de 2018 pelo IBGE na semana passada. O crescimento foi de apenas 1,1%, e o resultado foi seguido por uma onda de revisões pessimistas de economistas em relação ao desempenho esperado para este ano.
Uma corrente dentro do núcleo político do governo tem a convicção de que Bolsonaro precisa assumir o protagonismo na defesa da reforma da Previdência, sob pena de ficar ainda mais dependente da articulação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Aliado da reforma da Previdência, Maia é hoje a peça central na condução do ritmo de sua tramitação. Em meio a desencontros na articulação política, ele tem ganhado cada vez mais protagonismo. Maia já chegou, inclusive, a reclamar publicamente da comunicação do governo em defesa dessa proposta.
Integrantes do governo reconhecem que é preciso agir rápido para melhorar a comunicação, ainda muito errática e desconectada. A ideia, agora, é que Bolsonaro use mais as redes para explicar os pontos principais da reforma, com mais detalhes.
O presidente está em uma situação difícil, pois o governo ainda não enviou o projeto de lei com as mudanças nas regras para aposentadoria dos militares, nem com a solução para o impasse em torno do aumento salarial das carreiras das Forças Armadas.
O governo tenta emplacar a ideia de que se trata de uma reestruturação de carreiras, com a incorporação de gratificações à medida que o militar avance nas novas patentes a serem criadas, de forma a permitir o alongamento do tempo de serviço exigido pela reforma. Mas vai ser difícil fazer essa ideia colar sem que ela seja interpretada como um meio para elevar os salários da categoria.
Após a indignação da população com os reajustes para juízes aprovados pelo Congresso, em meio à defesa do ajuste fiscal pela equipe econômica, essa reestruturação tem tudo para ser um desafio a mais para a comunicação do governo. Ela pode acabar virando munição para o grupo contrário à reforma da Previdência, que pretende tumultuar o debate, numa tentativa de protelar qualquer discussão sobre a proposta.
É por isso que o ativismo de Bolsonaro em defesa da reforma da Previdência nas redes sociais – que o elegeram para a Presidência da República – não pode ser apenas uma onda, que perde força com o passar dos dias. Tem de ser para valer e, até mesmo, extrapolar o mundo virtual, para se tornar um verdadeiro mantra em conversas, discursos e outras manifestações públicas. Um presidente que demonstre sua convicção sobre a necessidade de aprovar a proposta é essencial para que haja chance de que ela prospere.
Nenhum comentário:
Postar um comentário