Presidente do instituto de pesquisas do Itamaraty reproduziu em blog textos de Ricupero e FH, que foram rebatidos por ministro
Carolina Brígido e André Duchiade / O Globo
O embaixador Paulo Roberto de Almeida foi demitido ontem do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), órgão ligado ao Ministério das Relações Exteriores, que ocupava desde agosto de 2016. Nos dias anteriores, Almeida publicara em seu blog pessoal textos críticos ao chanceler Ernesto Araújo de autoria do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e do e x-ministro e embaixador aposentado Rubens Ricupero.
A assessoria de imprensa do Itamaraty confirmou a demissão. Disse que a troca no comando do órgão já tinha sido acertada anteriormente, e não teve qualquer ligação com as publicações no blog. “A troca da presidência do Ipri, no contexto da troca da grande maioria das chefias do MRE, já estava decidida e foi comunicada ao atual titular”, diz nota do ministério.
Desde 2006, Paulo Roberto de Almeida mantém um blog sobre política interna e externa. Crítico ferrenho dos governos do PT, Almeida, que se identifica como um liberal, tem criticado setores do governo Bolsonaro ideologicamente próximos a Olavo de Carvalho, que chamou de “personalidade bizarra totalmente inepta em matéria de relações internacionais”.
“Aparentemente, esse mesmo blog que me serviu como quilombo de resistência durante os anos do lulopetismo diplomático abriu a justificativa, agora, para a minha exoneração”, escreveu Almeida em nota sobre a demissão. No texto, ele lembra que, “convidando a um debate sobre a diplomacia corrente”, também reproduziu em seu blog o artigo que o chanceler Araújo publicou na noite de domingo respondendo às críticas de FH e Ricupero. Na sua resposta a Ricupero e FH, publicada em seu blog pessoal, Araújo qualificou os dois de representantes de uma “tradição inútil” que orientou apolítica externado Brasil nos últimos 25 anos. Ele comparou o consenso sobre a diplomacia anterior ao governo Bolso na roa o consenso que havia no sistema político e que “ameaçou sufocara nação brasileira coma corrupção e a estagnação econômica, a crise moral e o enfraquecimento militar, o apequenamento internacional, o descaso pelos sentimentos do povo brasileiro”.
Em seu artigo, publicado no domingo no jornal O Estado de São Paulo, FH atacara um “componente marcadamente ideológico” no atual governo, “de raiz metafísica, exemplar no chanceler Ernesto Araújo, que desafia abertamente as tradições da política externa brasileira em suas concepções de soberania”. Já Ricupero, em palestra na semana passada no instituto de política seco nô micas liberais Casa das Garças, dissera que no Itamaraty de Araújo o manda men toé a subordinação a Washington, num apolítica que desconhece os limites “da decência, da soberania e do patriotismo”.
Ricupero criticou várias iniciativas diplomáticas do atual governo, como o anúncio da mudança da embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém e ai deia, cogitada por Bolson aro e Araújo, de instalação de uma base militar dos EUA no Brasil. Em sua réplica, porém, Araújo se concentrou na Venezuela. Disse, citando “uma grande liderança democrática venezuelana”, que foram as iniciativas do Brasil, e não dos EUA, que mudaram o jogo elevaram Washington a “romper a inércia” em relação ao país vizinho, jogando “seu peso político em favor da transição democrática”
“O ‘consenso’ na política externa, com sua ‘maturidade’ e ‘equilíbrio’, permitiu ao longo desse período a subida de (Hugo) Chávez na Venezuela, o predomínio crescente do bolivarianismo na América do Sul concebida como um bloco socialista, a consolidação de Chávez e Maduro no poder”, atacou Araújo.
Na quinta-feira, FH publicara em uma rede social que havia conversado com o líder opositor venezuelano Juan Guaidó. “Novas eleições livres são o caminho para o futuro democrático na Venezuela. Intervenções militares não conduzem à democracia. Pressão internacional ajuda. A luta é do povo venezuelano, só ele pode escolher seu destino político”, disse.
Araújo também criticou esta postagem de FH, acusando-o de usar uma “falsa dicotomia”, na qual as opções seriam “o prosseguimento do ‘consenso’ ou a intervenção armada” na Venezuela. “Não, não são as únicas”, disse o chanceler, acrescentando acreditar “no povo brasileiro, esse povo dos ‘grotões’ que FHC abertamente desprezava”.
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