- Folha de S. Paulo
Morte de músico no Rio deveria chocar por si só, mas parte da sociedade silencia
O Estado brasileiro deveria deter o monopólio da violência para proteger a população, mas, muitas vezes, insiste em usar esse recurso contra o seu povo, de forma ilegítima.
Rotineiramente, guarda-chuvas são confundidos com armas, e veículos a passeio, tidos por carros roubados. Situações que acabam em tragédia para muitas famílias —embora devessem ser consideradas como o drama de toda uma nação.
No domingo (7), no Rio de Janeiro, foi a vez de Evaldo Rosa dos Santos. Militares do Exército dispararam 80 tiros contra o carro no qual Santos levava a sua família, matando o músico de 46 anos.
O fato deveria chocar por si só. Parte da sociedade, no entanto, prefere o silêncio —isso sem falar nos que optam, de forma absurda, pela negação. Sabem que é um risco que não correm, pois o músico era negro e não pertencia às classes sociais mais altas.
Talvez o problema tenha mais chances de chamar a atenção se for deslocado do campo da sociologia —considerada pouco útil por alguns— para a área econômica.
Dados mais recentes do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que 64 mil pessoas foram mortas violentamente em 2017. Diariamente, um policial foi morto e outras 14 pessoas foram assassinadas em intervenções policiais.
Segundo especialistas, mortes prematuras em decorrência de homicídios reduzem o valor da produção e diminuem o consumo e a poupança, comprometendo o futuro do país.
Não há dados para 2017. Mas estudo de Daniel Cerqueira, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), mostra que o custo da violência chegou a 6% do PIB (Produto Interno Bruto) apenas em 2016 ou o equivalente a R$ 372 bilhões —valores da época.
A perda econômica é expressiva. A proposta original da reforma da Previdência apresentada pelo governo, por exemplo, prevê uma economia total de R$ 1,1 trilhão. Em dez anos.
Como o cenário de guerra não mudou desde 2016 e as expectativas de que a proposta seja aprovada integralmente se reduziram de forma dramática, é possível que a diferença entre gastos com violência e o montante a ser economizado anualmente com a reforma seja ainda maior.
Assim, a crise fiscal pode ser um ótimo motivo para pensar em políticas qualificadas de segurança e em ações mais efetivas sobre o modo enviesado de atuar dos agentes do Estado.
É óbvio que assassinatos não devem ser avaliados sob perspectiva exclusivamente financeira. Aos que respondem melhor a esse aspecto, porém, vale defender a reforma da Previdência e o fim da letalidade policial com o mesmo ardor.
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