- Valor Econômico
Se a economia não se mover, adeus viola
É possível estranhar que o presidente Jair Bolsonaro tenha um índice alto de apoio popular, até hoje, depois de cem dias de dolce far niente. Mas é o que mostram as pesquisas de opinião da semana passada, embora seja evidente para o eleitorado a ausência de governo nesses primeiros três meses do seu mandato.
Um resumo sobre o que aconteceu sob nossos olhos aponta que o presidente ficou quase um mês em recuperação de cirurgia abdominal ainda em consequência da agressão sofrida na campanha, fez quatro viagens internacionais (Davos, Estados Unidos, Chile e Israel), demitiu dois ministros ambos em meio a crise política e briga de poder entre aliados e filhos, e mandou uma proposta de reforma da Previdência ao Congresso Nacional, medida objetiva para o crescimento do país. Suas escolhas políticas, de líderes do governo e do partido que o abrigou, bastante controvertidos, até o momento foram inócuas. O presidente termina essa primeira fase queixando-se e insinuando que pode deixar o PSL. Houve muito barulho, confusão, balbúrdia, falta de comando e de liderança.
No entanto, ainda estão com ele a totalidade do seu eleitorado original e boa parte do eleitorado que o acompanhou porque não estaria na caravana do PT em nenhuma hipótese, fosse quem fosse o candidato. Embora a seara petista tenha vaticinado que este 2019 será o ano do arrependimento, nem o principal partido de oposição imaginava que isso poderia ser constatado tão cedo. O sentimento não incide ainda sobre a totalidade, mas apenas sobre parte do voto antipetista em Bolsonaro, e mantém-se longe de seu eleitorado original.
Esses últimos levantamentos mostram, também, que a sociedade está fazendo uma avaliação menos rigorosa do presidente e seu governo nesses primeiros três meses do que os analistas, experts e a mídia.
Segundo a interpretação corrente entre especialistas na leitura dessas manifestações do eleitorado, não está havendo ainda perda substancial de capital político, a popularidade não está se esvaindo como faziam crer as crises sucessivas deste início de governo, a maioria delas provocada pelo choque entre as forças de poder que se digladiam pelo domínio da orientação ao presidente: o professor Olavo de Carvalho, militares da reserva e da ativa, filhos, Paulo Guedes, para ficarmos com os eixos mais importantes.
Seis em cada dez brasileiros, segundo os últimos levantamentos, alimentam ainda a esperança de que Bolsonaro fará um ótimo governo. Não é pouco, o índice de expectativa continua elevado. A grande maioria ainda acha o governo bom ou regular.
Evitando a comparação com o PT pela atipicidade, estudos demonstram que nos cem primeiros dias de Fernando Henrique Cardoso as expectativas positivas eram maiores que as relacionadas ao governo Bolsonaro, mas menores se a avaliação fosse buscar a perspectiva do governo até o fim, e é a promessa de futuro o que mais conta.
As pesquisas apontam uns traços nada simpáticos para o governo Bolsonaro: mais de 50% o acham autoritário, e 57% acham que ele respeita mais o direito dos ricos.
Isso não foi suficiente para derrubar a aposta. Bolsonaro desconectado da imagem de pai dos pobres tem tudo a ver, mas ser o titular de um governo sem rumo desnorteia os ricos, os investidores, o mundo da economia. Até dois salários mínimos, ele tem só 6% de avaliação positiva. A partir de cinco salários mínimos tem 43% de aplauso, ótimo e bom.
Ainda há margem de apoio que supera seu eleitorado do peito: são 59% os que têm expectativa positiva com o governo Bolsonaro, e 39% são os que votaram nele no segundo turno. Está sobrando.
Isso é o que leva especialistas a considerar as avaliações mais rigorosas que a realidade.
A falta de governo ainda não foi determinante, embora as pesquisas mostrem que Bolsonaro fez muito menos do que as pessoas esperavam dele: São 61% os que dizem que faltou governo.
O que faltou mais nesse primeiro momento para que fosse possível identificar um novo governo? Faltou a roda da economia se mover, resumem analistas das pesquisas.
Bolsonaro pode viajar, ir à China três vezes e voltar, receber afagos de Donald Trump. pode dar declarações mais felizes, pode frequentar menos o Twitter, pode pedir aos filhos para agirem com equilíbrio, evitando derrubá-lo precocemente, pode errar menos. A mudança, porém, está atrelada à economia e esta, neste início de mandato, à reforma da Previdência. Por isso estão todos concentrados no Congresso onde se inicia o debate sobre a reforma. A questão é saber se a economia se movimentará com o presidente Bolsonaro ou não. Resta esperar. A maioria dos analistas ainda crê na aprovação da reforma. Talvez não aquela do Paulo Guedes, com economia de R$ 1 trilhão, mas o mercado se satisfará com a do Michel Temer, com economia de R$ 750 milhões.
Novo velho imposto
A falta de sensibilidade política e social da equipe econômica do governo Bolsonaro ainda pode dar inúmeras rasteiras nos planos do ministro Paulo Guedes. Se há um imposto odiado, cuja extinção reuniu todos os partidos em marcha de campanha, liderada pelo DEM, à época presidido por Rodrigo Maia, hoje presidente da Câmara, é a CPMF, o imposto do cheque. O PT quis recriá-lo com todas as suas forças para dar R$ 40 bilhões ao orçamento do ex-presidente Lula, sem sucesso, apesar das chantagens e ameaças de cortes generalizados de programas sociais que beneficiam a população mais pobre. A opinião pública era e é ainda contra.
Também, se há uma ideia fixa no governo é a de Marcos Cintra com a unificação de todos os federais e recriação desse imposto. Para empurrar a CPMF goela abaixo, agora, o governo está dizendo que o imposto que propõe é outra coisa: uma CPMF maior, mais abrangente, que atinge ricos e pobres. Piorou.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tem prometido transformar-se em barreira intransponível à tramitação do velho imposto. Sua justificativa: Não vai trair o partido e o povo.
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