Inadmissível que a política de preços dos combustíveis não seja transparente e bem fundamentada
O desastrado telefonema dado pelo presidente Bolsonaro para a Petrobras, com a determinação de suspender um aumento já anunciado para o diesel, apanhou o ministro da Economia, Paulo Guedes, em viagem aos Estados Unidos, e surpreendeu os mercados. Efeito inevitável, o valor de Bolsa da Petrobras, calculado pela cotação de suas ações, caiu em um dia R$ 32 bilhões.
A gravidade da intervenção do presidente, em sentido oposto à linha liberal da política econômica do seu ministro da Economia, Paulo Guedes, e referendada por ele mesmo, degradou as expectativas dos agentes econômicos. Isso no momento em que analistas do mercado financeiro, segundo sondagem semanal do BC (Relatório Focus), reduzem pela sétima vez consecutiva as estimativas de crescimento da economia para este ano — de 1,97% para 1,95%. Enquanto esperam que a inflação (IPCA) suba de 3,90%, estimativa de uma semana atrás, para 4,06%, mais próxima do centro da meta para este ano, de 4,25%.
As implicações da iniciativa justificaram o agendamento da reunião, para ontem, do ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco. O encontro antecedeu a um outro, marcado para hoje, com o presidente Bolsonaro, estando presente o ministro Paulo Guedes.
Espera-se que o presidente não apenas compreenda a gravidade do que aconteceu, bem como concorde que não há alternativa a não ser o estabelecimento de uma política de preços — não apenas para o diesel, mas para todos os combustíveis —, com fundamentação técnica e transparente.
É compreensível que um setor durante muito tempo condicionado pelos interesses de uma empresa monopolista, a Petrobras, carregue distorções e ainda zonas obscuras nos mecanismos de formação dos preços. Afinal, se a exploração e a produção de petróleo já há tempos têm a participação de empresas privadas, estrangeiras e nacionais, o refino é virtualmente dominado pela Petrobras, e na distribuição existe um oligopólio.
Outro aspecto a ficar claro para o Planalto é que este curto-circuito está sendo acompanhado com atenção por investidores internos e externos, para calibrarem o grau de confiança nas promessas liberais do governo, das quais dependerão decisões de investimentos pesados. Que poderão ser feitos ou não.
Para começar, no próprio refino — se não há regra clara para os preços, ninguém entrará na atividade. E sem isso não haverá concorrência. Em entrevista publicada ontem no “Valor Econômico”, o presidente da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Décio Oddone, afirma que até mesmo a forma com que a estatal divulga seus preços é incompleta. No entender de Oddone, se a iniciativa privada entrar no refino e houver clareza na formação dos preços, “damos um passo gigantesco”. Muita coisa está em jogo nas reuniões de ontem e de hoje.
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