Por Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro | Valor Econômico
BRASÍLIA - A Câmara impôs ontem uma nova derrota ao governo Jair Bolsonaro ao aprovar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em votação simbólica, o relatório do líder da Maioria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), sobre a proposta de emenda constitucional (PEC) do Orçamento Impositivo. O governo não queria aprovar a PEC antes da reforma da Previdência.
A proposta do Orçamento Impositivo obriga o governo a executar todos os investimentos previstos e torna obrigatório o pagamento de emendas parlamentares de bancada. Na prática, a medida engessa as possibilidades do governo de executar a peça orçamentária e diminui a margem para remanejamentos. O texto já havia sido aprovado pela Câmara, mas como foi alterado no Senado, está sendo apreciado novamente pelos deputados. O texto segue agora para análise da comissão especial e precisará ser votada em dois turnos no plenário da Casa antes de ser promulgado. Após a votação, a reunião da CCJ foi encerrada.
A discussão da reforma da Previdência começará hoje e terminará só após o feriado da Páscoa.
A falta de articulação do governo se refletiu também no plenário da Câmara, com um número crescente de parlamentares "independentes" defendendo publicamente a exclusão de pontos da reforma da Previdência já na CCJ - o discurso da maioria dos líderes partidários e dos integrantes da comissão, duas semanas atrás, era de aprovar a proposta completa no colegiado, que só analisa se algum artigo contraria uma das cláusulas pétreas da Constituição. O exame de mérito da reforma será feito na comissão especial.
Líder do bloco da maioria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro afirmou que vê um movimento crescente para suprimir pontos da reforma, como a aplicação automática para os servidores dos Estados e municípios. "Eu advogava a tese de não tirar nada na CCJ, deixar para a comissão especial, mas têm muita gente defendendo isso", afirmou. O relator da reforma, Marcelo Freitas (PSL-MG), que é ligado ao governo, deu parecer pela admissibilidade total.
Coordenador do PR na CCJ, o deputado Marcelo Ramos (AM), apresentará um voto em separado para suprimir esse dispositivo, dizendo que fere o pacto federativo, mas não sabe ainda se votará contra o parecer do relator porque a decisão será tomada junto com os quatro representantes do PR. Fábio Trad (PSD-MS) e Expedito Neto (PSD-RO) também farão um parecer paralelo, pela supressão da reforma para os Estados e das mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC). "Vou votar contra o parecer se o relator não ceder nesses dois pontos", disse Trad.
Seis deputados já protocolaram seus votos em separado na CCJ, mas ontem foi a vez do primeiro que não faz parte da oposição. Wilson Santiago (PTB-PB) se manifestou contra as mudanças no BPC e na aposentadoria rural dizendo que atentam contra "as mais básicas garantias e direitos fundamentais". "O que estamos fazendo é pressionar para que o relator mude o parecer", disse. $
O presidente da comissão, Felipe Francischini (PSL-PR), proibiu emendas ao parecer e só deixou uma alternativa a quem é contra: rejeitar o texto do relator e votar outro com os pontos a serem suprimidos.
Embora parlamentares defendam que ao tirar os pontos mais polêmicos na CCJ o debate ficará mais fácil na comissão especial, o governo tem dois problemas, há um problema ao governo: os assuntos inadmitidos não poderão mais ser discutidos na PEC nem por emendas. Quem discordar dessa supressão terá que recorrer ao plenário da Câmara.
Nem todos os deputados do "Centrão" concordam com a exclusão de artigos na CCJ. Parlamentares do DEM, MDB e PRB discordam dessa estratégia, o que torna incerto o que vai acontecer na votação. Há quem diga, nos bastidores, que as manifestações contrárias são mais uma sinalização para os eleitores, de que votaram com ressalvas, e que a CCJ manterá o texto intacto.
Um deputado que defendia essa tese ressaltou que o grau de desorganização do governo é tão grande que não há coesão na CCJ. "Cada deputado fala uma coisa, os partidos tentam coordenar, mas o processo está muito solto e ninguém se sente governo. Nunca vi tanta falta de articulação", avaliou. O resultado de ontem seria exemplo de que o próprio governo tem se atrapalhado.
Parte do Centrão passou a pressionar para votar antes a PEC do Orçamento impositivo, que torna obrigatória a execução das emendas de bancada e dos investimentos, tornando o processo orçamentário mais engessado. Era um recado ao Executivo de que a maioria decide a pauta. Vitor Hugo (PSL-GO) concordou, desde que apoiassem a votação da Previdência ainda esta semana, mas o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, vetou.
O Centrão anunciou que votaria requerimento para inverter a pauta. Eduardo Girão (PSL-RN), representando o governo, fez requerimento para pular a leitura da ata e seguir direto para a reforma A proposta, rejeitada por 41 a 18, foi debatida por uma hora, mais que o dobro do tempo gasto para a leitura da ata. E isso porque Francischini escolheu a deputada Maria do Rosário (PT-RS), para a leitura, que ela fez de forma lenta.
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