Por Thais Carrança | Valor Econômico
SÃO PAULO - Um dia de paralisação e protestos do setor de educação, marcado para esta quarta-feira (15), deverá ser o primeiro grande teste do governo Jair Bolsonaro nas ruas. Analistas avaliam que a greve marca o fim do período de "lua de mel" do novo governo após as eleições e poderá abrir as portas para mobilizações de outras categorias, em meio à fraqueza da economia e à perda de popularidade do presidente. A paralisação também deverá servir de termômetro para a greve geral contra a reforma da Previdência, convocada para 14 de junho.
"Com a euforia gerada pela eleição do Bolsonaro, depois do mandato bastante desgastado do [Michel] Temer, a expectativa era de que havia uma janela de oportunidade para o ambiente político ser marcado por um período de relativa estabilidade", diz Rafael Cortez, analista político da Tendências Consultoria, lembrando que o momento combinava um presidente com popularidade elevada, em início de mandato e com um Congresso alinhado do ponto de vista ideológico.
Segundo Cortez, isso se rompe com o acúmulo de agendas negativas do governo, reforçado pela ausência de uma coalizão majoritária no Congresso e pela comunicação errática. "Esse movimento agora é a resposta da sociedade a esse conjunto de fatores, até porque o governo não gerou nenhum fato novo positivo - a economia segue devagar e o governo traz agendas que mobilizam uma parte do seu eleitorado, mas faz ele perder parte do apoio conquistado nas eleições do eleitor mais de centro."
O consultor sindical João Guilherme Vargas Netto lembra que a greve foi convocada por duas confederações de trabalhadores da educação, a CNTE e a Contee, antes do corte de 30% da verba discricionária das instituições de ensino federais e da suspensão de bolsas de pós-graduação pela Capes. Originalmente, a paralisação tinha como motes a reforma da Previdência e a campanha salarial dos professores paulistas ligados à Apeoesp. "Os cortes deram um novo impulso ao movimento", avalia Vargas Netto.
A expectativa é que a greve seja forte nas instituições públicas de ensino. No ensino privado, a mobilização tende a ser mais tímida, mas o Valor apurou que professores de ao menos 24 escolas privadas já decidiram pela paralisação, nove delas em São Paulo e dez da linha pedagógica Waldorf em sete estados. A lista deve crescer, pois muitas escolas terão assembleias nesta segunda e novas adesões podem ocorrer até quarta-feira. As centrais sindicais também decidiram prestar apoio ao movimento.
Para Cortez, da Tendências, é improvável, no entanto, que o protesto ultrapasse o campo da esquerda neste momento. Isso porque as políticas do governo encontram eco em parte da sociedade e porque não há uma Lava-Jato forte como em momentos anteriores. "Não me parece que estamos naquele momento, como ocorreu com a Dilma, de derretimento da popularidade."
Ainda assim, o cientista político avalia que, se bem sucedido, o protesto pode incentivar a mobilização de outras categorias e a greve marcada para junho, além de prejudicar a popularidade do governo. "A popularidade mais baixa é um elemento complicador para a agenda reformista, porque se imaginava que a popularidade alta seria um substituto à construção de coalizões formais no legislativo", diz Cortez. "Deve ser um período turbulento para o Planalto, em termos políticos, justamente no momento em que se aprofunda a discussão das reformas no Congresso."
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